As ações do Méliuz caíram 17,6% em agosto, em seu pior desempenho mensal desde que a empresa de cashback se tornou a primeira Bitcoin Treasury Company do Brasil. A CASH3 abriu o mês cotada a R$ 5,68 e recuou para R$ 4,72 no fechamento do pregão em 29 de agosto, de acordo com dados do Google Finance.

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Preço da CASH3 em agosto. Fonte: Google Finance

As ações do Méliuz já apresentavam tendência de queda desde o topo de R$ 10,55 registrado em maio. O impulso positivo motivado pelo lucro operacional recorde de R$ 7,6 milhões no segundo trimestre de 2025 e o lançamento das ações no mercado norte-americano foram insuficientes para estancar as perdas.

Em tendência oposta, o índice Ibovespa, principal índice de ações da B3, atingiu uma nova máxima histórica de 141.422 pontos justamente no fechamento mensal. A alta de 6,28% em agosto garantiu o melhor resultado mensal do Ibovespa em um ano.

Além de o Bitcoin (BTC) ter fechado o mês em baixa de 6,5%, a queda da CASH3 coincidiu com o esfriamento da narrativa das 'Bitcoin Treasury Companies'.

Antonio Carlos Visentini, analista da Wesearch, afirma que a estratégia das 'Bitcoin Treasury Companies' de emitir dívida para adquirir a criptomoeda deixou de ser uma novidade e começa a dar sinais de saturação, dificultando o posicionamento de novos players como o Méliuz:

“A sustentabilidade do modelo de gerar ‘yield’ em Bitcoin tende a diminuir ao longo do tempo devido à oferta limitada de 21 milhões de moedas. Com 156 empresas adotando a estratégia, é impossível que todas sejam bem-sucedidas.”

Até mesmo a Strategy, de Michael Saylor, pioneira e líder do setor, apresenta métricas declinantes no momento.

Em agosto, a CASH3 replicou o desempenho das ações da Strategy, que possui a maior tesouraria corporativa de Bitcoin, com 636.505 BTC (aproximadamente US$ 71 bilhões). A MSTR caiu 16,7%, à medida que as compras sucessivas de Bitcoin, patrocinadas por Michael Saylor, diretor-presidente da companhia, pressionaram negativamente o mNAV.

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Dinâmica do preço da MSTR em relação ao Bitcoin e mNAV. Fonte: Bitcoin Treasuries

Calculado pela razão entre a capitalização de mercado da empresa e a capitalização de mercado de suas participações em Bitcoin, o mNAV é a principal métrica utilizada para analisar a saúde de 'Bitcoin Treasury Companies'.

Quando as ações dessas empresas são negociadas com um prêmio em relação ao valor de seus ativos em Bitcoin (mNAV > 1), a emissão de novas ações aumenta o valor do Bitcoin por ação para os investidores. Quando o mNAV cai abaixo de 1, o efeito é contrário: a emissão de novas ações dilui a exposição dos investidores ao Bitcoin.

O mNAV da Strategy chegou a 3,14 em novembro de 2024, mas agora é de 1,31. Já o Méliuz tem um mNAV de 1,4, de acordo com dados da Bitcoin Treasuries.

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Dinâmica do preço da CASH3 em relação ao Bitcoin e mNAV. Fonte: Bitcoin Treasuries

“Um terço das empresas do setor já opera com múltiplos mNAV abaixo de 1, ou seja, tem valor de mercado menor do que seus tesouros em Bitcoin, contrariando suas propostas de valor”, afirma Visentini. “Essa dinâmica abre espaço para uma possível espiral negativa, na qual as companhias são forçadas a vender seus Bitcoins para honrar dívidas e custos operacionais, o que reduz ainda mais seu valor e o do mercado como um todo.”

A política de transformar a aquisição de Bitcoin no principal negócio de uma empresa, por si só, não é garantia de sucesso, segundo o analista. Casos como o da GameStop, da Empery Digital (ex-Volcon) e Sequans evidenciam isso: suas ações atingiram um pico após o anúncio da estratégia, mas recuaram 27%, 67% e 83%, respectivamente.

A Estratégia Bitcoin do Méliuz

O Méliuz tornou-se a primeira 'Bitcoin Treasury Company' do Brasil em maio, após aprovar uma alteração em seu objeto social, incluindo uma cláusula que permite “aplicações de recursos e realização de investimentos em Bitcoin e em outros títulos referenciados em Bitcoin.”

Na ocasião, Israel Salmen, fundador do Méliuz, declarou que o principal propósito da empresa passou a ser a acumulação de Bitcoin. O primeiro ato da 'Estratégia Bitcoin' consistiu na compra de 274,52 BTC por US$ 28,4 milhões, que se somaram ao investimento inicial de 45,72 BTC realizado em março, ao custo de US$ 4,1 milhões.

Em junho, a empresa captou R$ 180 milhões em uma oferta subsequente de ações, que viabilizou a aquisição de 275 BTC adicionais.

Na quarta-feira, 3 de setembro, o Méliuz informou ao mercado a compra de 9,01 BTC ao custo de US$ 1 milhão. O investimento foi feito com recursos próprios gerados pelo negócio operacional da empresa.

O Méliuz é o maior detentor corporativo de Bitcoin na América Latina, com um total de 604,69 BTC (aproximadamente US$ 66,7 milhões). Com os Bitcoins adquiridos a um preço médio de US$ 103.323 a unidade, o tesouro do Méliuz acumula ganhos de 7,3%.

CASH3 está em alta desde o anúncio da ‘Estratégia Bitcoin’

Desde 15 de abril, quando anunciou oficialmente a intenção de se tornar uma 'Bitcoin Treasury Company', as ações do Méliuz valorizaram aproximadamente 20%. Inicialmente, a alta foi acompanhada por um crescimento expressivo no volume diário de negociação, que chegou a atingir R$ 37,6 milhões. Na última semana de agosto, no entanto, o volume médio ficou em torno de R$ 1,6 milhão.

Apesar do desempenho negativo nos últimos quatro meses, CASH3 acumula ganhos de 70% em 2025.

Os analistas de duas das principais gestoras brasileiras estão divididos quanto ao potencial de alta das ações da CASH3. O BTG Pactual, que é sócio da empresa, mantém a recomendação de compra, com preço-alvo de R$ 9, valor 97,3% superior à cotação atual de R$ 4,56.

Sem mencionar a ‘Estratégia Bitcoin’ do Méliuz, os analistas do BTG argumentam que, com o valuation atual, “a empresa não precisa crescer muito para gerar valor.”

Por outro lado, a Genial Investimentos retirou a CASH3 de sua carteira recomendada “MicroCaps 5+”, que reúne cinco ações de empresas de pequeno porte.

Visentini acrescenta que, além do potencial esgotamento da narrativa das 'Bitcoin Treasury Companies', a queda das ações do Méliuz é um reflexo do momento de incerteza que o mercado de criptomoedas atravessa.

O preço médio alto do tesouro de Bitcoin do Méliuz também representa uma vantagem competitiva frente a concorrentes globais, segundo o analista:

“A entrada tardia da empresa na corrida pelo Bitcoin como reserva de valor, adquirindo o ativo a preços superiores aos de outros players, gerou uma dependência perigosa dessa estratégia. Isso significa que qualquer revés pode não apenas comprometer suas operações, mas também levar a um colapso e à perda de confiança do mercado.”

Durante o volátil mês de agosto, a empresa deu um passo significativo para atrair investidores estrangeiros e consolidar seu posicionamento como uma ‘Bitcoin Treasury Company' de alcance global. Conforme noticiado pelo Cointelegraph Brasil, a empresa anunciou uma parceria com o JP Morgan para oferecer suas ações nos Estados Unidos.