Dois meses depois de se tornar a primeira empresa listada na B3 a adicionar Bitcoin (BTC) à sua tesouraria, o Méliuz (CASH3) está presetes a aprovar formalmente sua 'Estratégia Bitcoin' em Assembleia Geral Extraordinária (AGE) nesta terça-feira, 6 de maio.

Com as ações em alta de 122% desde a adição de Bitcoin ao seu tesouro corporativo e de 150% no acumulado do ano, o Méliuz já conta com 59,26% de aprovação dos acionistas para adoção de sua “Estratégia Bitcoin", informou Israel Salmen, presidente do conselho de administração e fundador da empresa, em uma postagem no X:

“Acabamos de arquivar na CVM os votos recebidos via BVD (Boletim de Voto à distância) para a Assembleia de amanhã. Conseguimos uma aprovação de 59,26% do capital total para alteração do objeto social.”

O quórum necessário para instalar a AGE e confirmar a alteração do objeto social que permitirá ao Méliuz implementar uma política empresarial voltada para a aquisição de mais Bitcoin é de ⅔ do capital social e precisa ser alcançado até o dia de hoje.

Caso o quórum não seja atingido, uma nova AGE será convocada para 15 de maio, sem necessidade de quórum mínimo para aprovação.

A formalização da estratégia está virtualmente garantida, já que os votos a favor foram quase unânimes até o momento, como destacou Salmen no X:

“O quórum via BVD foi de 59,68% do capital total, ou seja, daqueles que votaram praticamente todos foram a favor da nossa estratégia de Bitcoin. Foi o maior quórum em uma AGE desde que nos tornamos uma companhia listada. Impressionante!”

Estratégia Bitcoin do Méliuz

Em 6 de março, o Méliuz inovou ao anunciar a compra de 45,72 BTC por US$ 4,1 milhões. Com um preço médio de US$ 90.296 por unidade, o investimento da empresa acumula ganhos de 4,2% em sessenta dias.

Na ocasião, Salmen justificou a alocação de parte do caixa em Bitcoin como uma estratégia para fortalecer a posição financeira da empresa, posicionando-a como “pioneira em uma transformação financeira que já está em curso globalmente.”

Posteriormente, em 14 de abril, a empresa apresentou os detalhes de sua “Estratégia” e convocou a AGE para aprovar a alteração de seu objeto social.

Para implementar a “Estratégia”, a administração da empresa propôs a alteração do Artigo 4º do Estatuto Social, incluindo uma cláusula que permite a “aplicações de recursos e realização de investimentos em Bitcoin e em outros títulos referenciados em Bitcoin.”

Sem essa possibilidade expressa no objeto social, o Méliuz poderia enfrentar questionamentos jurídicos e regulatórios ao realizar tais investimentos.

A administração também propôs alterações no Artigo 16 do Estatuto Social para ajustar as competências do Conselho de Administração com o fim de dar mais flexibilidade à empresa para a realização de operações de captação de recursos, seja no mercado de capitais, seja por meio da realização de outras operações financeiras.

A mudança no objeto social não terá implicações diretas sobre as operações da empresa. O modelo de negócios do Méliuz continuará centrado na prestação de serviços de cashback. “Inclusive, a geração de caixa das operações é fundamental para a estratégia de adquirir mais Bitcoin ao longo do tempo", segundo o memorando encaminhado aos acionistas.

Impacto sobre as operações do Méliuz

Fundado em 2011, o Méliuz é uma empresa brasileira de tecnologia financeira que opera como plataforma de cashback, contando com mais de 30 milhões de usuários cadastrados e parcerias com mais de 1.000 estabelecimentos comerciais.

O Méliuz estreou no mercado acionário em novembro de 2020. Listada na B3 sob o ticker CASH3, a empresa viu suas ações atingirem uma máxima histórica de R$ 54,15 em julho de 2021, mas desde então perdeu mais de 90% de seu valor de mercado.

Segundo uma análise publicada no X por Victor Alfa, Head de Conteúdo do DeFiverso e Diretor de Research da WeSearch, a queda no preço das ações do Méliuz “reflete uma combinação de desempenho financeiro fraco, com prejuízos anuais e quedas drásticas em caixa, ativos e fluxo de caixa livre, além de perda de confiança do mercado devido à subperformance relativa e expectativas não atendidas pós-IPO.”

Ao anunciar o investimento do Méliuz em Bitcoin, Salmen reconheceu que a iniciativa também tinha como objetivo impulsionar a recuperação da CASH3 na B3. Em 3 de maio, o executivo publicou uma postagem no X, destacando o fato de as ações do Méliuz terem fechado a semana acima do valor atingido no dia do IPO.

“No nosso primeiro dia de negociação na bolsa em Novembro de 2020, nossa ação fechou cotada a R$ 6,58. Encerramos essa semana em R$ 6,99", escreveu Salmen. “A última vez que fechamos acima do patamar do IPO foi há 3 anos atrás, 9 de junho de 2022”, acrescentou.

Desde que o investimento em BTC foi anunciado em março, a CASH3 valorizou 122%, enquanto o preço do Bitcoin subiu apenas 3,8%. No acumulado do ano, as ações do Méliuz acumulam ganhos de 150%, de acordo com dados do Google Finance.

Valorização da CASH3 em 2025. Fonte: Google Finanças

Apesar do sucesso inicial, a “Estratégia Bitcoin” do Méliuz gerou reações mistas no mercado. Logo após o anúncio, a XP Investimentos avaliou que a política “parece desconectada dos objetivos operacionais da companhia, gerando incertezas sobre sua eficácia e levantando questionamentos sobre a capacidade da empresa de reinvestir sua geração de caixa em suas atividades principais.”

Em sua análise, Victor Alpha conclui que o Méliuz apresenta um mix de oportunidades e riscos. Embora a reversão de um prejuízo de R$20,7 milhões no 4T23 para um lucro de R$21,5 milhões no 4T24, o crescimento da base de usuários e a estratégia de Bitcoin sejam promissores, o histórico de prejuízos, o valuation alto e a subperformance da CASH3 tornam o investimento arriscado no momento.

Em contraponto, a gestora de ativos digitais QR Asset Management apontou que a diversificação cambial pode beneficiar o Méliuz em momentos de turbulência macroeconômica.

A análise também ressalta que o Méliuz utilizará testes periódicos de impairment para mitigar a volatilidade inerente ao Bitcoin: se o preço cair muito, a empresa avaliará se o valor de compra ainda justifica ser mantido no balanço. Caso contrário, reconhecerá uma perda (impairment), que pode ser revertida se o preço subir novamente.

A análise da QR Asset Management ainda destaca que a valorização das ações desde o anúncio da compra de Bitcoin reflete os ganhos em marketing estratégico:

“Ser pioneira em criptoativos entre as listadas brasileiras dá a Méliuz uma narrativa diferenciada e reforça a proposta de marca inovadora.”

A iniciativa também pode abrir novas oportunidades de negócios, segundo a análise, como “parcerias com exchanges e carteiras digitais, ampliando o ecossistema de cashback pago em Bitcoin e estimulando novas fontes de receita via serviços de custódia ou intermediação". 

Por fim a QR Asset destaca o "prêmio de adoção institucional": 

“Caso o Bitcoin entre em novo ciclo de alta, a valorização patrimonial da posição [do Méluz] pode turbinar o retorno sobre o capital próprio sem necessidade de alavancagem, como foi visto com a Strategy (antiga MicroStrategy).”

Investimento corporativo em Bitcoin é uma tendência global

A aprovação do novo objeto social permitirá que o Méliuz seja pioneiro no Brasil em uma tendência global de investimentos corporativos em Bitcoin, liderada pela Strategy de Michael Saylor.

Após o anúncio da aprovação dos acionistas à alteração do objeto social da empresa, Salmen postou no X fotos ao lado de Saylor para celebrar a aprovação da “Estratégia” do Méliuz e agradecendo ao executivo americano por ter “preparado o caminho.”

Michael Saylor e Israel Salmen. Fonte: X (Israel Salmen)

Anteriormente conhecida como MicroStrategy, a Strategy mudou sua natureza jurídica e identidade corporativa para refletir seu foco estratégico no investimento em Bitcoin. 
A mudança no modelo de negócios e na estrutura financeira da Strategy está em curso desde 2020, quando Saylor anunciou publicamente a primeira aquisição de Bitcoin para o tesouro da empresa.

Atualmente, a empresa detém mais de 555.450 BTC, o que equivale a cerca de US$ 52,36 bilhões, de acordo com dados do portal Saylor Tracker, que rastreia os investimentos da Strategy em Bitcoin.

Para financiar suas aquisições, a Strategy utiliza mecanismos sofisticados, como emissão de títulos de dívida conversíveis e ofertas de ações, criando um ciclo de financiamento contínuo – estratégias que o Méliuz poderá adotar após a aprovação de seu novo objeto social.

Na segunda-feira, 5 de maio, a Strategy anunciou a compra de 1.895 BTC entre os dias 28 de abril e 4 de maio, a um preço médio de US$ 95.167 por BTC, conforme noticiado recentemente pelo Cointelegraph Brasil.