A inteligência artificial (IA) voltou a ser o centro das atenções em Brasília (DF). Na última terça-feira (21), parlamentares e especialistas participaram de um seminário e defenderam que o Brasil e os outros países que integram o Mercado Comum do Sul (Mercosul) desenvolvam uma legislação específica para regular o uso da tecnologia e de dados pessoais. 

Proposto pelo senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da Comissão Temporária sobre Inteligência Artificial (CTIA) do Senado Federal, o seminário “Dados Pessoais e Inteligência Artificial no Mercosul” foi promovido pela Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, presidida pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS), conforme noticiou a Agência Senado.

Na ocasião, Trad observou que “apesar das inúmeras facilidades propiciadas por essas novas ferramentas, deparamos com um grande dilema: como preservar a privacidade dos usuários e seus dados pessoais?”

“Essa preocupação surge quando percebemos que a inteligência artificial necessita de um grande volume de informações para sua otimização. Por isso, existe um crescente interesse dos estados nacionais em harmonizar não apenas a proteção de dados, mas também o uso da inteligência artificial. Isso não tem mais volta”, completou.

Relator do Projeto de Lei (PL) 2.338/2023, de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que regula o uso da IA no país, Viana argumentou que “uma regulamentação muito restritiva poderia nos condenar à dependência tecnológica em uma área estratégica em termos de competitividade global. Uma regulação ineficaz tornaria a sociedade prisioneira das big techs”.

Na interpretação do vice-presidente da CTIA, senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP), a regulamentação da inteligência artificial traz um desafio. Por conta da velocidade das mudanças tecnológicas na área, a legislação vai precisar de atualização constante para permanecer eficaz.

“Trata-se de uma tecnologia disruptiva, que traz enormes benefícios para a sociedade. Mas, como toda tecnologia disruptiva, é preciso ter os cuidados necessários. Uma legislação sobre inteligência artificial tem um risco de se tornar obsoleta muito rapidamente. Os riscos vão ser variáveis no tempo: o que hoje a gente considera como baixo risco em inteligência artificial, daqui a pouco vai ser alto risco. Essa parte da legislação precisa ser constantemente reavaliada e modificada”, justificou.

O evento contou com a participação de Marcelo Salomão Martinez, chefe da Divisão de Temas Digitais do Itamaraty. Segundo o diplomata, a discussão sobre o tema “avançou muito” durante a presidência pro tempore do Brasil no Mercosul, ocorrida no segundo semestre de 2023.

“Do ponto de vista da proteção de dados, avançamos muito por iniciativa da Autoridade Nacional de Proteção de Dados. A ANPD propôs que a gente levasse à pauta a criação de um mecanismo de cooperação interagências no Mercosul, com autoridades que tratam do tema da proteção de dados. Encerrada a presidência brasileira, o tema foi retomado neste ano com a presidência do Paraguai”, afirmou.

Por sua vez, o presidente da ANPD, Waldemar Gonçalvez Ortunho Junior, defendeu que o órgão fique responsável por “responsável por zelar, implementar e fiscalizar” o uso da inteligência artificial no Brasil, normatização infralegal prevista no PL 2.338.

“Esse tema é prioritário e tem sido tratado pela ANPD. É uma experiência nova e estamos à frente de diversas autoridades mundiais. O Brasil não está parado no tema. Em temas de inteligência artificial, não podemos deixar passar. Temos que assumir esta liderança, temos que tomar esse conhecimento e evitar riscos”, considerou.

O seminário contou ainda com a presença de Estela Aranha, membro do Conselho Consultivo de Alto Nível das Nações Unidas para a Inteligência Artificial. Ela defendeu a aprovação, “com pequenos ajustes”, apresentado por Pacheco. E alertou: o Brasil e os países do Mercosul têm o desafio de desenvolver ferramentas de inteligência artificial como forma de assegurar as soberanias nacionais.

“Hoje, a gente tem a concentração (de tecnologias) somente em dois países: Estados Unidos e China. Alguns países estão investindo muito para tentar alcançá-los. Mas o Sul Global está absolutamente atrás e precisa de condições melhores. Se a gente não conseguir alcançá-los e somente usar os modelos deles, vamos apenas contratar serviços de softwares. A gente fica absolutamente dependente técnica, científica e economicamente dessas empresas”, advertiu Estela Aranha.

Em um evento promovido essa semana pelo Iasp, Rodrigo Pacheco disse que a IA é preocupante e que ‘omissões legislativas’ podem levar decisões para o Judiciário, conforme noticiou o Cointelegraph Brasil.