Desde a noite de sábado, 31 de agosto, a plataforma da rede social X (ex-Twitter) está bloqueada para usuários brasileiros, devido à determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, em mais um capítulo da batalha travada entre a Justiça brasileira e o bilionário Elon Musk.

O X permanece acessível a usuários brasileiros somente mediante o uso de VPNs (Redes Virtuais Privadas), aplicativos que criam conexões seguras e criptografadas para proteger a privacidade online, ocultando a localização de acesso à internet dos usuários.

No entanto, na mesma decisão, Moraes proibiu o acesso ao X por meio de VPN para acessar o aplicativo. Além da proibição, o ministro do STF determinou a aplicação de uma multa diária de R$ 50 mil, caso qualquer pessoa física ou jurídica use aplicativos de VPN para acessar o X.

VPNs dificultam localização de usuários

Especialistas foram unânimes em apontar que a identificação dos usuários e a consequente aplicação da multa é uma "missão impossível" para o judiciário brasileiro, devido às propriedades técnicas de VPNs.

João Victor Archegas, professor de Direito e coordenador do Instituto de Tecnologia e Sociedade, afirmou em reportagem do portal Terra que é inviável monitorar o acesso a sites específicos por meio de VPNs, uma vez que a ferramenta tem como objetivo justamente ocultar a localização dos usuários.

Marcelo Crespo, coordenador do curso de Direito da ESPM, concordou e acrescentou que não existem ferramentas capazes de cumprir a determinação de Moraes:

"Determinar que as empresas criem ferramentas que proíbam o uso do X, mesmo com VPN, é pedir para inventar um produto que não existe porque a VPN não tem como fazer essa limitação."

Crespo pondera que o STF poderia identificar usuários que estão usando VPNs em território brasileiro mediante o cruzamento de informações, como o monitoramento de postagens publicadas na plataforma e a confirmação de que eles não estão em viagem ao exterior por meio de dados da Polícia Federal.

Especialistas questionam decisão de Alexandre de Moraes

Embora exequível, esse tipo de monitoramento faria sentido para personalidades públicas, como políticos ou influencers, mas não deve ter implicações práticas para a grande maioria dos usuários. Crespo também questionou o escopo da decisão de Moraes:

"Eu consigo admitir que se é uma pessoa que está sendo investigada no inquérito e está praticando ilícitos, ela seja proibida de usar a plataforma. Faz sentido dentro desse contexto. Mas eu, que não tenho nada a ver com essa história, vou ser proibido de usar a plataforma com base em que? Com base no que a plataforma simplesmente saiu do ar? Neste ponto é um exagero."

Archegas foi além da crítica à proibição e disse que a multa de R$ 50.000 por dia é desproporcional:

"Uma coisa é você bloquear a plataforma por ela não respeitar as ordens do Poder Judiciário. Outra coisa é você falar que o usuário não pode acessá-la usando VPN. O usuário não tem nada a ver com as ações ilegais da plataforma."

Inicialmente, Moraes havia determinado que as lojas de aplicativos da Apple (Appstore) e do Google (Play Store) retirassem o acesso a VPNs a usuários brasileiros, e ordenava que os provedores de internet implementassem "obstáculos tecnológicos" para o uso de VPNs e o acesso ao X. Poucas horas depois, o ministro recuou e revogou ambas as determinações.

Beto Simonetti, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), admitiu que o bloqueio ao X no Brasil é plausível, uma vez que a empresa agiu em desacordo com as leis brasileiras. No entanto, advertiu que as sanções determinadas pelo STF a quem acessar a plataforma só podem ser aplicadas mediante processo, permitindo que os usuários possam apresentar sua defesa perante a Justiça:

"Nenhum empresário ou empresa está acima da lei no Brasil. Por isso, defendemos a independência e a autonomia do Judiciário para proferir as decisões e adotar as medidas necessárias para coibir qualquer excesso. É preciso, no entanto, que as medidas ocorram dentro dos limites constitucionais e legais, asseguradas as liberdades individuais."

O embate entre Elon Musk e Alexandre de Moraes não é recente. Desde que Musk assumiu o controle do X, ele tem criticado duramente as decisões judiciais brasileiras que, segundo ele, ferem a liberdade de expressão.

Em abril, Musk usou sua própria rede social para acusar Moraes de "traição" à Constituição brasileira e pediu sua renúncia ou impeachment. A situação se intensificou em agosto, quando a empresa fechou seu escritório no Brasil, citando a perseguição judicial como motivo, conforme noticiou o Cointelegraph Brasil na ocasião.