A dívida do governo dos EUA atingiu patamares recordes em 2024, e já chega a US$ 34,8 trilhões, um crescimento de 25% desde 2020. Este alto nível de endividamento ameaça não apenas a economia americana, mas também a estabilidade do sistema financeiro global, uma vez que o dólar é a moeda de reserva internacional.

Muitos economistas e adeptos do ouro e do Bitcoin (BTC) defendem um retorno a moedas lastreadas por ativos fortes (hard money). A edição de 2024 do relatório "In Gold We Trust" propõe a adoção de um "Padrão Ouro-Bitcoin" para solucionar o problema das dívidas governamentais crescentes e a crise de confiança nas moedas fiduciárias.

A proposta se baseia em um conceito intitulado Freegold, segundo o qual o ouro atuaria como uma ferramenta para recapitalizar o sistema fiduciário, fortalecendo os balanços dos bancos centrais

O retorno a reservas baseadas em ouro, em vez do dólar, é justificado pela tendência do ouro de valorizar em tempos de crise e incerteza econômica. Essa valorização permitiria a amortização de dívidas governamentais sem aumentar a emissão de moedas fiduciárias, evitando pressões inflacionárias.

Padrão Ouro-Bitcoin

O relatório destaca dois eventos ocorridos na primeira metade de 2024 que reforçam a tese do Bitcoin como ouro digital. A aprovação dos ETFs de BTC à vista nos Estados Unidos em janeiro revalidou as criptomoedas como uma nova classe de ativos financeiros ao facilitar o acesso de investidores institucionais e fundos soberanos ao Bitcoin

Por sua vez, em abril, o halving tornou o Bitcoin mais escasso que o ouro com a redução pela metade da emissão de novas moedas por bloco minerado de 6,25 BTC para 3,125 BTC, conforme destaca o relatório com base em análises do modelo Stock-to-flow (S2F) de ambos os ativos:

"O ouro tem um índice S2F relativamente estável no longo prazo, pois sua produção anual permanece relativamente constante em relação à quantidade disponível no mercado. A razão S2F do Bitcoin, por outro lado, agora é maior do que a do ouro (após o halving de 2024), tornando o Bitcoin o ativo monetário mais raro do mundo, pelo menos de acordo com essa métrica específica."

"À medida que a emissão de novos Bitcoins cai pela metade e o estoque cresce mais lentamente, teoricamente, há uma tendência de elevação do preço do ativo, desde que a demanda aumente ou permaneça estável", afirma o relatório.

Relação Stock-to-flow (S2F) do ouro e do Bitcoin ao longo do tempo. Fonte: In Gold We Trust 2024 (Incrementum)

Assim, defende o relatório, o Bitcoin oferece uma alternativa adicional às reservas governamentais em moedas fiduciárias. A adoção de ouro e Bitcoin por bancos centrais promoveria a combinação de duas qualidades fundamentais de ativos de reserva de valor, segundo o relatório: a estabilidade do metal precioso e a eficiência digital da criptomoeda.

Um "Padrão Ouro-Bitcoin" poderia "extinguir as dívidas governamentais de forma definitiva" por serem ativos puros, sem riscos de contrapartes, e que tendem a se valorizar em momentos de crise econômicas e geopolíticas. Assim, argumenta o relatório, são ideais para a liquidação de dívidas e proteção contra altos níveis de endividamento governamental:

"Nesse modelo, o ouro e o Bitcoin se complementam para atingir as metas de redução de dívidas, reserva de valor e recapitalização dos sistemas financeiros globais. Uma moeda de reserva que se valoriza rapidamente, como o Bitcoin, pode contribuir para uma recapitalização mais rápida de um sistema superendividado."

Valorização do Bitcoin em relação às principais moedas fiduciárias do mundo, de 2011 a 2024. Fonte: In Gold We Trust (Incrementum)

Desafios regulatórios

O relatório conclui que a adoção de um Padrão Ouro-Bitcoin ainda é algo distante, apesar da crescente adoção institucional e dos primeiros movimentos de aceitação do Bitcoin em nível governamental em diferentes partes do mundo.

Os principais desafios dizem respeito à regulação, pois demandaria a criação de um marco legal internacional através da cooperação de bancos, governos e instituições financeiras. Além disso, atualmente é inconcebível que o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o BIS (Banco de Compensações Internacionais), instituições que regem o sistema financeiro global, apoiem uma iniciativa nesse sentido.

Por exemplo, um aspecto fundamental do Padrão Ouro-Bitcoin proposto pelo relatório é de que o valor de mercado de ambos os ativos deve ser livremente determinado pelo mercado. Ou seja, sem cotações fixas ou limites de preço que em algumas ocasiões no passado foram impostas ao ouro pelo governo dos Estados Unidos.

Embora improvável no curto prazo, "essa síntese de ouro e Bitcoin poderia revolucionar a maneira como lidamos com reservas de valor e segurança monetária", conclui o relatório.

Conforme noticiado pelo Cointelegraph Brasil, as reservas de ouro de bancos centrais tem crescido constantemente desde 2015, revertendo uma tendência de baixa que teve início durante a década de 1980.