O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a defender a criação de uma moeda comum do BRICS como alternativa ao dólar em reunião do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) durante a cúpula que reuniu os países do bloco no Rio de Janeiro no fim de semana, apesar da falta de consenso sobre o tema.

Em crítica direta aos Estados Unidos e Israel, Lula afirmou que a criação de novos sistemas globais de governança política e econômica é necessária diante do esvaziamento da Organização das Nações Unidas (ONU) e do acirramento de conflitos militares em diversas regiões do mundo:

“Essas lideranças políticas têm que tomar as decisões sobre as questões econômicas. Por isso que a discussão de vocês [representantes do banco] sobre uma nova moeda de comércio é extremamente importante. É complicado? Eu sei. Tem problemas políticos? Eu sei. Mas se a gente não encontrar uma nova fórmula, a gente vai terminar o século 21 igual a gente começou o século 20. E isso não será benéfico para a humanidade.”

Apesar do apoio de Lula e do presidente russo Vladimir Putin, a declaração final da cúpula faz apenas uma referência vaga a um sistema de pagamentos digitais alternativo, sem compromissos explícitos ou metas objetivas para o avanço do projeto, devido à falta de consenso entre os países-membros.

O documento menciona progressos “na identificação de possíveis caminhos para apoiar a continuação das discussões sobre a busca por maior interoperabilidade dos sistemas de pagamentos.”

As iniciativas “refletem as preferências reveladas pelos membros e devem desempenhar um papel fundamental em nossos esforços para viabilizar pagamentos transfronteiriços rápidos, de baixo custo, mais acessíveis, eficientes, transparentes e seguros entre os países do BRICS.”

Lula diverge de negociadores brasileiros e alinha-se à Rússia na batalha pela desdolarização

A Rússia tem se posicionado firmemente a favor da criação de um sistema de pagamentos alternativo ao SWIFT para contornar as sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos e a União Europeia após o início da guerra na Ucrânia em fevereiro de 2022.

Na ausência do presidente Vladimir Putin no encontro no Rio de Janeiro, o ministro das Finanças da Rússia Anton Siluanov voltou a defender a proposta, mesmo sem consenso de todos os países membros, conforme noticiado pela Agência Brasil.

Siluanov afirmou que a Rússia avançará com os planos de criar um sistema de pagamento alternativo ao dólar para transações internacionais. Segundo o ministro, a Rússia pretende firmar acordos multilaterais entre países interessados, independentemente de haver consenso absoluto entre todos os países do bloco:

“Está em discussão a criação de uma nova plataforma de investimentos. Até o momento, os membros do BRICS não chegaram a um acordo completo sobre isso. É uma discussão em andamento. Vamos seguir esse caminho com os países interessados. Não é necessário que alcancemos um consenso na tomada de certas decisões financeiras.”

A busca de ativos de reserva de valor alternativos ao dólar está entre as prioridades do governo russo, acrescentou Siluanov:

“Existe a possibilidade de que as compras de títulos entre dois ou três países possam ser resolvidas sem um consenso. Esses mecanismos seriam lançados e novos membros se juntariam a eles. É um processo em andamento. Algumas questões avançam mais rápido, outras são um pouco mais lentas.”

Ameaças de Trump travam avanço de moeda e sistema de pagamento comuns

Apesar da pressão exercida pela Rússia e pelo Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), liderado pela ex-presidente Dilma Rousseff, pela adoção de sistemas de pagamento digitais para buscar maior independência da moeda norte-americana, a proposta teria sofrido resistência do próprio Brasil e da Índia. A China também não teria dado apoio decisivo à proposta.

Membros do governo afirmaram às vésperas da cúpula no Rio de Janeiro que a criação de uma moeda do BRICS ou de um sistema de pagamentos digitais alternativos ao SWIFT — que permitiria transações comerciais com moedas dos países do bloco — não deve estar entre as prioridades do bloco neste momento.

Essa postura visa evitar um confronto direto com os Estados Unidos, algo que não parece estar entre as preocupações pessoais do presidente da República.

Em janeiro, logo após assumir a presidência dos Estados Unidos, Donald Trump advertiu os países do bloco que haveria retaliações significativas caso o BRICS avançasse com projetos visando a substituição do dólar como moeda de reserva global.

A ameaça envolvia a imposição de "tarifas de 100%" se o grupo avançasse na criação de uma nova moeda do BRICS ou apoiasse qualquer outro meio de pagamento que pudesse rivalizar com a moeda norte-americana.

Enquanto a cúpula do BRICS ocorria no Rio de Janeiro, Trump reafirmou sua disposição para impor tarifas sobre os membros do grupo, afirmando em uma postagem na Truth Social que “qualquer país que se aliar às políticas antiamericanas do BRICS pagará uma tarifa ADICIONAL de 10%.” “Não haverá exceções a esta política", acrescentou o presidente dos EUA.

Os formuladores de políticas comerciais de países como Brasil e Índia estariam priorizando sua relação com os Estados Unidos neste momento, cientes de que as consequências de sanções ou de isolamento político e econômico seriam potencialmente negativas, conforme noticiado recentemente pelo Cointelegraph Brasil.