Resumo da notícia:

  • O Banco Central vai adotar uma nova arquitetura tecnológica para o Drex após abandonar o Hyperledger Besu.

  • A solução focará na “camada base” da rede para resolver questões de privacidade e escalabilidade diretamente na infraestrutura.

  • Roberto Campos Neto explicou que o Drex é uma CBDC projetada para evitar a desintermediação bancária e acelerar a tokenização das finanças.

O ex-presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, revelou detalhes sobre a revisão estrutural e tecnológica do Drex, a moeda digital brasileira, que está passando por ajustes para superar as limitações técnicas de privacidade e escalabilidade identificadas durante a fase de testes.

Campos Neto afirmou em entrevista ao podcast Perspectivas que o novo modelo a ser desenvolvido pelo BC busca resolver limitações que não puderam ser solucionadas no nível de contratos inteligentes, adotando soluções que atuem na camada base do protocolo (a “chain base”).

Essa abordagem, segundo o ex-presidente do BC, é “muito mais promissora” e similar à que foi adotada pelos bancos centrais de Singapura e Hong Kong:

“Hoje, está sendo desenvolvida uma tecnologia que, ao invés de resolver [os problemas] no nível do smart contract, resolve no nível do que a gente chama de ‘chain base’, na [camada] base do blockchain.”

A “base chain” a que Campos Neto se refere diz respeito a uma abordagem arquitetural que desloca para a camada base da rede — e não para os contratos inteligentes — a responsabilidade por solucionar questões de privacidade, permissionamento e escalabilidade.

Esse modelo busca incorporar esses controles diretamente na infraestrutura da rede por meio de recursos como transações privadas, criptografia baseada em provas de conhecimento zero (ZK-Proof) e diferentes formas de segregação de dados, aproximando-se mais de um sistema modular de registro digital do que de uma blockchain tradicional.

Esse modelo oferece maior controle de privacidade, velocidade nas transações e mecanismos nativos de certificação e liquidação, reduzindo a complexidade de execução nos contratos inteligentes.

Campos Neto reconheceu que a tecnologia adotada para o desenvolvimento do Drex durante sua gestão na presidência do BC mostrou-se incapaz de conciliar privacidade, escalabilidade e programabilidade, inviabilizando a continuidade do projeto nos moldes originais.

No entanto, ressaltou que isso não implica no abandono do projeto, mas sim a readequação de seu escopo e infraestrutura. A prioridade é viabilizar casos de uso práticos, como a digitalização de garantias e a ampliação do acesso ao crédito, integrados com sistemas já existentes, como o Pix e o Open Finance.

Drex foi projetado para evitar desintermediação bancária

Campos Neto afirmou que o Drex é um projeto originalmente concebido para resolver problemas estruturais no sistema financeiro, como a desintermediação bancária e a fricção em transações de grandes valores e larga escala.

O ex-presidente do BC alertou que a migração de recursos de depósitos bancários para carteiras digitais reduz a oferta monetária, resultando na contração do crédito:

“Se eu tiro o dinheiro dos bancos para comprar stablecoins ou criptomoedas com uma carteira digital e essa carteira não usa aquele lastro para gerar crédito, o que acontece é que eu diminuí a minha capacidade de fazer crédito.”

Segundo Campos Neto, isso pode gerar efeitos macroeconômicos imprevisíveis. Como grande parte do sistema financeiro depende do crédito bancário para sustentar a atividade econômica, a contração da oferta pode restringir o crescimento, diminuir o multiplicador bancário e comprometer instrumentos tradicionais de política monetária.

Sem que os bancos centrais tenham a capacidade de ajustar o volume de crédito em momentos de expansão ou desaceleração, os ciclos econômicos tendem a se tornar mais voláteis, com picos de crescimento seguidos de quedas mais acentuadas — um cenário que, segundo o ex-presidente do BC, já começa a ser observado em economias onde o dinheiro está migrando do setor bancário para carteiras digitais.

Campos Neto destacou que o Drex foi concebido para evitar esse tipo de problema. Como uma CBDC (moeda digital de banco central de atacado), o Drex baseia-se na tokenização de depósitos, mantendo o dinheiro dentro do sistema bancário e preservando o efeito multiplicador do crédito.

O ex-presidente do BC reforçou que o Drex nunca foi pensado como uma versão digital do real para transações cotidianas:

“O Drex, só para deixar claro para as pessoas de novo, não é aquele dinheiro, um real digital, que vai comprar o pãozinho. É uma coisa para movimentos maiores, por exemplo, compra de um carro, uma casa. Ele tem casos de uso que são mais propícios para negócios onde você tem fricção.”

Como exemplo prático, Campos Neto citou operações de compra e venda de veículos, nas quais a moeda digital programável poderia eliminar a necessidade de intermediários de confiança e cartórios, garantindo a liquidação simultânea do ativo contra o pagamento.

A reestruturação do Drex sinaliza um amadurecimento do projeto, priorizando a viabilidade técnica e jurídica sobre a rapidez de lançamento. Apesar dos contratempos, o Brasil se mantém na vanguarda da inovação financeira.

Segundo o ex-presidente do BC, o país está posicionado para promover uma interseção inédita entre um sistema de Open Finance consolidado, a tokenização de ativos nos balanços bancários e o uso de inteligência artificial (IA) para aumentar a eficiência do sistema financeiro, conforme noticiado anteriormente pelo Cointelegraph Brasil.