O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou uma Medida Provisória de regulamentação de meios de pagamentos que equipara o Pix ao dinheiro em espécie, obrigando que comerciantes e empresas aceitem pagamentos feitos por meio do sistema de transferências digitais do Banco Central (BC) sem a cobrança de taxas ou impostos adicionais.

A MP 1.288/2025 também determina que a cobrança de valores ou encargos adicionais sobre pagamentos feitos por Pix seja proibida e punida, de acordo com as “penalidades previstas na legislação de direito do consumidor":

“Constitui prática abusiva, para os efeitos do art. 39 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a exigência, pelo fornecedor de produtos ou serviços, em estabelecimentos físicos ou virtuais, de preço superior, valor ou encargo adicional em razão da realização de pagamentos por meio de Pix à vista.”

A MP foi editada após a queda de 15,4% no volume de transferências realizadas por Pix no período entre 1º e 14 de janeiro em comparação com o mesmo período no mês anterior.

Segundo dados do Banco Central, nas duas primeiras semanas de janeiro foram realizadas 2,29 bilhões de transações, movimentando aproximadamente R$ 920 bilhões, enquanto na primeira metade de dezembro o total foi de R$ 1,12 trilhão e 2,7 bilhões de transações.

A queda no volume das operações e no total de transações foi atribuída à implementação da Instrução Normativa RFB 2.219/24, que ampliou o escopo da fiscalização da  Receita Federal sobre movimentações financeiras dos cidadãos, e à subsequente campanha contra as novas regras liderada pela oposição ao governo.

O governo, por sua vez, alega que a redução no uso do Pix se trata de um movimento “sazonal.”

“Em janeiro, caem as movimentações do Pix na comparação com dezembro", afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “Quando você considera a sazonalidade não tem havido problemas”, acrescentou.

Governo recua diante de campanha de “desinformação”

A IN RFB 2.219/24 entrou em vigor em 1º de janeiro, tornando obrigatório que todas as transações superiores a R$ 5.000 para pessoas físicas e R$ 15.000 para pessoas jurídicas fossem reportadas à Receita Federal, inclusive aquelas realizadas via Pix.

Anteriormente, apenas instituições financeiras tradicionais como bancos e cooperativas de crédito eram obrigadas a reportar as movimentações financeiras realizadas por seus clientes, incluindo saldos e transferências em conta corrente e depósitos e resgates em produtos de investimento.

Com a atualização das regras, instituições de pagamento, bancos digitais e fintechs também deveriam repassar essas informações à Receita Federal por meio de uma nova plataforma, denominada e-financeira.

A Medida Provisória foi publicada um dia depois que a IN foi revogada pela Receita Federal, por determinação do presidente Lula. O governo justificou o recuo admitindo que houve falhas de comunicação no anúncio e na implementação da proposta, causando confusão e equívocos entre a população.

Haddad foi explícito em atribuir os mal-entendidos à campanha de “desinformação” de membros da oposição:

“Essa MP reforça tanto os princípios de não oneração do Pix quanto as cláusulas de sigilo bancário do sistema, que foram objeto de exploração por criminosos.”

Respeito à privacidade e ao sigilo bancário

Segundo o governo da Receita Federal, as novas regras tinham como foco o combate a crimes que envolvem ocultação de divisas e sonegação fiscal e, ao mesmo tempo, contribuíriam para a regularização fiscal de pequenas empresas e pessoas físicas.

Um dia antes da revogação da IN, o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, afirmara que as novas diretrizes de controle fiscal não violavam a lei de sigilo bancário e a privacidade das transações financeiras.

O secretário também negou que o governo teria interesse em criar um sistema de vigilância sobre as operações de pequenas empresas, trabalhadores informais e cidadãos comuns, rebatendo acusações feitas por membros da oposição.

Segundo o economista Fernando Ulrich, embora as normas não representassem riscos imediatos de sobretaxa e controle de capitais, elas abriam precedentes para restrição da liberdade e da privacidade financeira dos brasileiros.

“Na prática, as regras foram estendidas a outras instituições, abrangendo mais empresas, mais entidades e mais modalidades de pagamento, incluindo o Pix, reforçando uma tendência crescente de monitoramento de tudo que qualquer brasileiro esteja transacionando", afirmou Ulrich em um vídeo publicado em seu canal no YouTube.