A organização não governamental (ONG) Conservação Internacional (CI) anunciou no final de março a Ciera (sigla em inglês para Assistente de Restauração de Ecossistemas da Conservação Internacional), uma plataforma que utiliza inteligência artificial (IA) para identificar áreas prioritárias para restauração de vegetação nativa em todo o país. 

A Ciera venceu o Hack4Good 3.0, um hackathon global promovido pela Microsoft for Nonprofits com intuito de desenvolver soluções tecnológicas para problemas reais utilizando IA. 

De acordo com a ONG, o evento compôs a programação do Global Nonprofit Leaders Summit e reuniu organizações não governamentais, parceiros tecnológicos, estudantes e desenvolvedores da Microsoft para pensar em ferramentas que gerem impacto positivo para o mundo.

A equipe de desenvolvimento da Ciera é composta por colaboradores da Conservação Internacional dos Estados Unidos e do Brasil em parceria com Microsoft, Esri, Universidade de Maryland, Universidade Estadual de Utah e threshold.world, refletindo a colaboração internacional e o compromisso compartilhado com a inovação tecnológica em prol da conservação e restauração da natureza.

À Agência Brasil, a diretora de Restauração de Paisagens e Florestas da CI Brasil, Ludmila Pugliese, destacou que a plataforma surge para atender a demanda por uma ferramenta capaz de integrar informações sobre o tema, como custo por bioma, incentivos e exigências legais.

“A Ciera tem como objetivo tornar a restauração mais pública, mais compartilhada, para que todo mundo possa se apropriar dessa tomada de decisão do melhor local para restaurar”, explicou.

Segundo a CI, a Ciera interpreta automaticamente diretrizes e critérios relevantes presentes em políticas, planos e instrumentos legais, transformando essas informações em dados espaciais acessíveis para o usuário. Assim, a plataforma centraliza as informações em um mesmo ambiente e coloca tudo em uma mesma linguagem, retornando ao usuário as áreas prioritárias para restauração específicas para o contexto local, tornando o processo mais ágil e eficiente.

O protótipo atual já integra dados do Novo Código Florestal, do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs), de passivos ambientais, carbono e gestão hídrica, entre outros. A proposta é expandir continuamente essa base, incorporando novas políticas e gerando respostas cada vez mais completas — como mapas de priorização já prontos para uso.

Ludmila acrescentou que a Ciera é capaz de buscar entre documentos oficiais e informações qualificadas disponíveis na internet tudo que é necessário para criar uma base de conhecimentos para orientar o usuário, seja um proprietário de área rural ou um gestor público. Ela disse ainda que a ferramenta deve ser disponibilizada em, pelo menos, três meses a “proprietários de terra ou tomadores de decisão, de uma forma geral”.

“Por exemplo, se um governo estadual tem interesse em fazer restauração de áreas onde há maior número de proprietários com déficit de APP [área de preservação permanente], reserva legal e descumprimento do Código Florestal, a Ciera permite que a gente faça essa análise e indique, então, onde estão as bacias ou os territórios mais viáveis para que se tenha o máximo de resultado em restauração”, acrescentou.

Além da Conservação Internacional, também chegaram à final a Elizabeth Glaser Pediatric AIDS Foundation, com uma solução voltada para o segmento da saúde, e a Goodwill Industries International, com uma proposta focada em serviços sociais. No total, foram 13 organizações multinacionais apresentando propostas para problemas de diferentes áreas, como conservação, esportes e tecnologia. 

Potencial da Ciera 

Dados recentes do Observatório da Restauração e Reflorestamento revelam que o Brasil tem atualmente 153,14 mil hectares da cobertura vegetal original recuperada e 8,76 milhões de hectares reflorestados. Conforme estimativa do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), apenas para cumprir o Código Florestal (Lei 12.651/2012), o Brasil tem um passivo ambiental de 25 milhões de hectares de vegetação nativa que precisa ser recuperada. 

No final de março, um levantamento divulgado pela Mapbiomas revelou que a Mata Atlântica é o bioma que mais sofreu alteração na cobertura e uso da terra no Brasil nos anos de 1985 a 2023. Em 39 anos, seu território teve aumento de 91% da área agrícola, mas também registrou alguma recuperação de vegetação nativa em 45% dos municípios após a aplicação do Código Florestal no país.

Segundo informações divulgadas pela Agência Brasil, com apenas 31% de cobertura vegetal preservada e 67% de ocupação e atividades humanas na região, a Mata Atlântica continua perdendo vegetação. Durante o período analisado, a redução foi de 10%, ou seja, 3,7 milhões de hectares.

O estudo mostra que, atualmente, 60% dos municípios onde a Mata Atlântica está presente, mantêm menos de 30% da vegetação nativa e ao longo de todos esses anos, apenas os estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e São Paulo conseguiram recuperar mais do que perder parte do seu bioma.

Conforme noticiou o Cointelegraph Brasil, o Instituto Clima e Sociedade (iCS) também lançou recentemente o edital Desafio IA Natureza & Clima para selecionar até nove projetos relacionados ao uso de tecnologias digitais, entre elas a inteligência artificial (IA), para a redução de emissões de gases de efeito estufa, conservação da biodiversidade e fortalecimento de ecossistemas. As inscrições vão até o dia 22 de abril e os aportes chegam a R$ 1,8 milhão por projeto selecionado.