O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, voltou a rechaçar o mau uso da inteligência artificial (IA), o que pode “anabolizar” as fake news e mudar resultados de eleições. Ameaça à democracia potencializada pela omissão das big techs, “terra de ninguém”, na avaliação do representante da corte.
Os pronunciamentos de Moraes aconteceram na abertura do “Seminário Internacional – Inteligência Artificial, Democracia e Eleições”, evento promovido terça (21) e quarta-feira (22) pelo TSE e pela Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas (FGV Comunicação), na sede da corte, em Brasília (DF).
“A inteligência artificial, principalmente anabolizando as fake news, pode mudar o resultado de uma eleição. Porque até que aquilo seja desmentido, até que chegue a versão verdadeira a todo o eleitorado, isso pode mudar milhares de votos. Consequentemente, isso pode fraudar o resultado popular”, disse.
Moraes acrescentou que as plataformas de mídias social precisam ser responsabilizadas pela proliferação de notícias falsas e que “não podemos permitir que essas big techs que atuam no mundo todo continuem sendo terra de ninguém.”
“Não podemos permitir que essas empresas sejam consideradas empresas de tecnologia. São empresas de publicidade, de mídia, de informação, e, como tal, devem ser responsabilizadas como as demais", completou.
Segundo ele, “a desinformação tem um destinatário certo, que é o eleitor”.
“Ela [a desinformação] busca direcionar o voto com mentiras, e as mentiras pretendem polarizar o processo eleitoral de tal maneira que retira do eleitorado a liberdade na hora do voto, o que, por consequência, contribui para corroer a confiança na democracia”, explicou.
Os debates, focados em diretrizes de uso da IA nas eleições e estratégias para o enfrentamento do fenômeno da desinformação e das fake news no campo eleitoral, contaram com a presença de especialistas nacionais e internacionais, autoridades e representantes, no Brasil, das plataformas digitais WhatsApp, TikTok e Google.
Mais posicionamentos
Além do presidente do TSE, compuseram a mesa de abertura do seminário a vice-presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia; o diretor da EJE/TSE, ministro Floriano de Azevedo Marques; o advogado-geral da União, Jorge Messias; o ex-corregedor-geral eleitoral e ministro do STJ Benedito Gonçalves; a embaixadora da União Europeia no Brasil, Marian Schuegraf; e a embaixadora da Alemanha no Brasil, Bettina Cadenbach.
Floriano de Azevedo Marques chamou a atenção para o fato de que a inteligência artificial tem o poder de direcionar os indivíduos a universos onde a própria democracia é posta em desconfiança.
“Sair desse grande desafio envolve a troca de experiências, a articulação de esforços conjuntos e, principalmente, temos que lidar com a inteligência artificial não como um ludismo, na tentativa de negar a sua existência, mas de modo a transformá-la em um instrumento, uma ferramenta para o fortalecimento da democracia”, declarou.
Por sua vez, Jorge Messias avaliou que a Justiça Eleitoral no Brasil tem adotado a direção correta no que diz respeito ao uso da inteligência artificial no país. Ele observou que, em 2024, teremos a primeira eleição com o uso massivo de ferramentas de inteligência artificial generativa, como o ChatGPT.
“Desde 2018 há a difusão de desinformação sistêmica, as chamadas fake news, mas agora temos um elemento novo para nos preocupar. Neste ano teremos um processo eleitoral desafiador pela frente e entendo que o caminho adotado pelo TSE é o mais correto. Apostar na ciência, na academia e no debate informado para que a sociedade possa aprofundar a reflexão acerca de um tema da maior importância é essencial para todos nós”, pontuou.
Marian Schuegraf afirmou que o uso da inteligência artificial nas eleições é um dos temas mais relevantes do nosso tempo. De acordo com ela, em 2024 serão realizadas ao menos 64 eleições nacionais em todo o mundo, com envolvimento de 4,2 bilhões de pessoas.
“Nos últimos anos, enfrentamos a propagação de desinformação destinada a perturbar os processos eleitorais. A inteligência artificial apresenta riscos, com a manipulação da informação e a ingerência nesses processos. A União Europeia está pronta para compartilhar nossos aprendizados e nossas experiências com o Brasil e aqui agradecemos ao TSE pela cooperação conosco nos últimos anos com vistas a promover a democracia e a confiança nos sistemas eleitorais”, destacou.
Bettina Cadenbach se mostrou preocupada com a manipulação de processos democráticos ao redor do mundo. Segundo ela, essa é uma ameaça global que perturba a resiliência das sociedades.
“O uso incorreto da inteligência artificial, com o propósito de desinformar, vem com aqueles que não têm apreço pelos valores democráticos. Nós estamos comprometidos com todos os esforços para controlarmos isso e, assim, termos o uso livre de tecnologias baseadas nos direitos humanos, princípios comuns compartilhados por uma aliança de países em todo o mundo”, ressaltou.
Também nessa semana, parlamentares e especialistas presentes no Seminário ‘Dados Pessoais e Inteligência Artificial no Mercosul’ defendem regulamentação específica da IA na região do Mercosul, conforme noticiou o Cointelegraph Brasil.