O governo brasileiro planeja mobilizar R$ 5 bilhões em recursos para o desenvolvimento de iniciativas em computação quântica, segundo reportagem da Folha de São Paulo.
A proposta está sendo elaborada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e prevê a alocação de recursos públicos e privados para investimento no setor nos próximos dez anos.
O projeto deve ser oficializado ainda no primeiro semestre por meio de uma portaria que projeta o investimento de R$ 3 bilhões até 2029, com R$ 1,7 bilhão destinado a soluções de infraestrutura, R$ 300 milhões em capacitação profissional, R$ 500 milhões em sensoriamento e R$ 500 milhões em capacidade de processamento computacional, conforme detalhou Ulisses Martins Rosa, coordenador de fomento à inovação do MCTI. Outros R$ 2 bilhões estão destinados para a continuidade do projeto entre 2030 e 2034.
Rosa afirmou que o projeto é inspirado no Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). Anunciado pelo MCTI em 2024, o plano foi subordinado ao Comitê Interministerial para a Transformação Digital (CITDigital), com orçamento previsto de R$ 23 bilhões para execução nos próximos cinco anos.
A computação quântica é um campo multidisciplinar que combina ciência da computação, física e matemática, utilizando os princípios da mecânica quântica para resolver problemas complexos de forma muito mais rápida do que os computadores tradicionais.
Diferentemente da computação clássica, que usa bits representando 0 ou 1, a computação quântica usa qubits, que podem estar em superposição — ou seja, representar 0 e 1 simultaneamente — e podem estar entrelaçados (emaranhamento), o que amplia enormemente a capacidade de processamento paralelo e a eficiência na resolução de problemas complexos.
Atualmente, o Brasil possui apenas dois computadores quânticos em funcionamento – um na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e outro no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), em São Paulo. Ambos têm propósitos exclusivamente educacionais.
O Laboratório de Física de Dispositivos Quânticos é a única instituição no Brasil que mantém um grupo de trabalho para desenvolvimento de chips para computadores quânticos.
Waldemir Cambiucci, diretor da Microsoft Brasil, afirma que mais de 40 países possuem programas de desenvolvimento de computação quântica, com investimentos de R$ 244 bilhões, segundo estimativas do Fórum Econômico Mundial.
O professor de computação da Unesp Felipe Fernandes Fanchini ressaltou que o investimento em computação quântica é uma questão de soberania, pois os países e empresas que lideram as pesquisas no setor impõem barreiras para impedir o acesso à tecnologia de ponta. "Não teremos o retorno que essas tecnologias podem trazer", afirmou.
Repercussão na comunidade científica brasileira
Apesar de reconhecerem a importância do desenvolvimento do setor, especialistas receberam com ressalvas o anúncio do governo.
Carlos Speglich, fundador da Dobslit, startup brasileira especializada em computação quântica, acredita que o plano precisa equilibrar melhor os investimentos em infraestrutura e recursos humanos:
“O risco é não existir gente para usar esses laboratórios, fazer manutenção adequada; não adianta apresentar equipamentos de ponta sem ter um ecossistema.”
O professor de ciência da computação da Unicamp, Marcelo Terra Cunha, defende a criação de um laboratório de referência no país, nos moldes do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, que abriga o acelerador de partículas Sirius:
“Precisamos colocar todas as pessoas com expertises diferentes em um mesmo lugar e o mesmo objetivo para avançar.”
Mateus Silva Pierre, gestor de software e inovação do Instituto Eldorado, questiona a capacidade do governo de atrair investidores privados, pois há poucas empresas no Brasil dispostas a correr riscos investindo na tecnologia.
No campo das criptomoedas, a computação quântica representa um dos maiores riscos para o futuro do Bitcoin (BTC). Segundo Paolo Ardoino, CEO da emissora de stablecoins Tether, a tecnologia será capaz de quebrar a criptografia de carteiras antigas para trazer Bitcoins perdidos de volta à circulação.
Isso inclui os mais de 1 milhão de Bitcoins minerados por Satoshi Nakamoto. Jamais movimentados, os Bitcoins de Nakamoto equivalem a aproximadamente US$ 100 bilhões atualmente. A volta desse montante à circulação tem potencial para desestabilizar o mercado, conforme noticiado pelo Cointelegraph Brasil.