Um estudo divulgado este mês pela empresa global de consultoria e auditoria KPMG apontou que 86% dos entrevistados já usam inteligência artificial (IA) em suas empresas. Esse percentual é o mesmo daqueles que aprovam ou aceitam a utilização da tecnologia, segundo o levantamento realizado em parceria com a Universidade de Melbourne, na Austrália.

Intitulada “Confiança, Atitudes e Uso de Inteligência Artificial: um estudo global 2025”, a pesquisa mostra um cenário no qual a IA está profundamente enraizada na prática profissional, embora seu uso ainda esteja cercado por incertezas e dilemas éticos que merecem atenção estratégica dos líderes corporativos.

A crescente presença da IA no ambiente de trabalho brasileiro contrasta com os 55% dos entrevistados no país que se dizem dispostos a confiar nas decisões tomadas por IA, bem abaixo dos 86% que aprovam ou aceitam seu uso.

A pesquisa mostrou que 47% dos entrevistados brasileiros afirmaram que conhecem e sabem usar ferramentas de IA, percentual bem acima de países como Alemanha (20%), Japão (21%), França (24%), Reino Unido (27%) e Estados Unidos (28%).

Segundo a KPMG, esse hiato entre aceitação prática e confiança simbólica reforça um ponto crucial: a IA está sendo usada porque é necessária; porém, a tecnologia está longe de ser plenamente compreendida ou de ser percebida como “certeira” ou “infalível” por quem a utiliza.

Impactos positivos e negativos

Os dados coletados apontam que a IA já está gerando valor. No ambiente corporativo, 71% dos entrevistados afirmam que a tecnologia aumentou a eficiência, melhorou a qualidade do trabalho e impulsionou a inovação.

Por outro lado, junto aos ganhos, surgem os efeitos colaterais. Um percentual de 27% relatou aumento da carga de trabalho, do estresse e da pressão, o que sugere que a automação de tarefas não está necessariamente promovendo um ambiente mais saudável. A IA também expandiu os riscos relacionados à conformidade e privacidade, afetando diretamente as áreas de governança e compliance das organizações.

Outro dado relevante elencado pela pesquisa é sobre dependência tecnológica: 47% dos entrevistados declararam que não conseguiriam realizar suas tarefas sem o apoio da IA, enquanto 46% têm medo de se tornarem obsoletos caso não adotem a tecnologia rapidamente. Esse tipo de relação sugere que a IA possa estar promovendo uma lógica de trabalho acelerada, automatizada e, paradoxalmente, insegura, de acordo com a KPMG.

Erros, uso indevido e dilemas

A sondagem mostra comportamentos que colocam em xeque a maturidade do uso da IA nas empresas. Um percentual de 49% dos entrevistados admitiu ter cometido erros em suas tarefas por confiar em resultados fornecidos por IA e 44% relataram ter usado a tecnologia inapropriadamente. 51% disseram já ter apresentado conteúdos gerados por IA como se fossem de sua própria autoria.

Para a KPMG e a Universidade de Melbourne, esses dados expõem vulnerabilidades operacionais e levantam questões éticas. Por exemplo: a quem pertence o conteúdo gerado por IA? Quais são os limites da autoria e da responsabilidade em um ambiente automatizado? E, sobretudo, será que os líderes empresariais estão realmente preparados para orientar suas equipes em um uso ético e seguro da inteligência artificial?

É positivo que 67% das empresas ofereçam treinamentos sobre uso responsável da IA e que 68% afirmem ter políticas claras para orientar os colaboradores. Porém, esses mesmos dados revelam que, mesmo com um uso generalizado da tecnologia, mais de 30% das organizações ainda operam no escuro quando o tema é governança da IA, sustenta a KPMG.

Confiança e regulação

Extrapolando o ambiente corporativo, a pesquisa também se debruça sobre a percepção da sociedade em relação à IA. As respostas indicam que quase 80% dos brasileiros demonstram preocupação com os riscos associados à tecnologia, sendo que 25% acreditam que esses riscos superam os benefícios.

O principal temor desses respondentes é com a desinformação – tanto que 67% dos entrevistados não confiam em conteúdo gerado por IA e 70% receiam que as eleições possam ser manipuladas por bots.

Esses números ajudam a entender por que 84% pedem medidas legais para combater a desinformação gerada por IA — um pleito justo, que deveria efetivamente instigar governos e instituições reguladoras a atuarem. Inclusive, 66% dos brasileiros consideram que a regulamentação da IA é urgente.

Também chama atenção que mais de 80% da população não tenha qualquer conhecimento sobre leis ou políticas relacionadas à IA no Brasil, o que reforça a importância de campanhas de educação digital, voltadas não apenas para especialistas, mas para a sociedade como um todo.

Mas, afinal: o que o futuro nos reserva? Ainda não é possível dar uma resposta definitiva a essa questão. O que se pode afirmar é que o avanço da IA é irreversível. É preciso ir além do fascínio pela inovação e assumir a responsabilidade de garantir que o uso da tecnologia ocorra de maneira ética, transparente e inclusiva.

Para os líderes empresariais, isso significa:

1. Estabelecer políticas claras de governança da IA.

2. Promover treinamentos formais e recorrentes sobre uso responsável da tecnologia.

3. Investir em processos de auditoria e validação dos outputs gerados por IA.

4. Estabelecer limites e protocolos para a autoria de conteúdo.

5. Colaborar com órgãos reguladores e associações para construir marcos legais robustos.

De acordo com o insight da KPMG apoiado na pesquisa, a IA pode ser uma aliada para as empresas e a sociedade. Mas os resultados positivos dependem de atenção, ética, vigilância e, sobretudo, liderança consciente. Em vez de simplesmente “usar porque é útil”, devemos mudar nossa abordagem para “usar com propósito e responsabilidade”.

Para a empresa de consultoria, como todo salto tecnológico, a IA exige que as decisões de hoje sejam tomadas com foco no amanhã. A tecnologia que deve sempre servir aos propósitos da humanidade, de modo a proporcionar benefícios a todos e encurtando o caminho para um futuro mais justo e sustentável.

Esse mês o governo brasileiro também ampliou a utilização dos serviços de IA da chinesa Huawei, conforme noticiou o Cointelegraph Brasil.