O Brasil largou atrás das grandes potências globais na corrida pelo desenvolvimento de infraestrutura e tecnologias de inteligência artificial (IA), mas o investimento de US$ 23 bilhões do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), apresentado pelo governo Lula, tem potencial para posicionar o país entre os líderes do setor, afirmou a ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, em uma entrevista concedida ao podcast "Deu Tilt", do UOL.
O PBIA foi apresentado mais de um ano e meio depois que o Modelo Grande de Linguagem (LLM) ChatGPT, da OpenAI, chegou ao mercado, abrindo caminho para a revolução da inteligência artificial. Em dois meses, o ChatGPT atingiu 100 milhões de usuários, tornando-se o primeiro aplicativo a atingir essa marca em tão pouco tempo. A título de comparação, as redes sociais TikTok e Instagram levaram 9 meses e 2 anos e meio, respectivamente, para atingir a mesma marca.
De acordo com dados da plataforma AppMagic compilados pelo portal Mobile Time, o Brasil é o terceiro país com maior número de downloads do ChatGPT no mundo todo, atrás apenas de Estados Unidos e Índia.
Santos ressalta que o valor empenhado no PBIA coloca o Brasil atrás apenas dos Estados Unidos e da China no que diz respeito a investimentos em IA, posicionando o Brasil para competir de igual para igual com países europeus que largaram na frente em pesquisa e desenvolvimento de infraestrutura e soluções para o setor:
"Temos um investimento que mostra que estamos chegando, é verdade, um pouco atrás. Mas eu já fui atleta e, no atletismo, às vezes a gente começa uma corrida atrás e, daqui a pouco, está disputando o pódio."
Segundo estimativas do governo brasileiro, empresas privadas dos Estados Unidos, como a própria OpenAI, o Google e a Microsoft, entre outras, investiram US$ 380 bilhões no setor em 2023, enquanto o governo chinês destinou US$ 306 bilhões para a construção de data centers este ano.
Embora modestos em comparação com as duas maiores economias do mundo, os investimentos do governo brasileiro são superiores ao apoio estatal ao setor na França e na Inglaterra. "O Brasil não entra no jogo para sermos meros consumidores ou fornecedores de dados para os gigantes tecnológicos globais', afirmou a ministra, acrescentando:
"Estamos apostando em ter uma infraestrutura robusta que permita criar programas próprios de IA, soberania na produção, armazenamento e produção de dados. Vamos garantir um investimento de R$ 23 bilhões para os próximos cinco anos, mostrando que a gente chegou chegando. Para você ter ideia, no Reino Unido, essa cifra chega a R$ 18 bilhões em 10 anos. Na França, R$ 14 bilhões até 2030. Ou seja, nossos investimentos se comparam com os investimentos que a União Europeia está fazendo. A gente só não se compara com EUA e China."
Entre os projetos de maior destaque a serem desenvolvidos no âmbito do PBIA estão um supercomputador com capacidade de processamento de 5,1 petaflops/s (5,1 quatrilhões de operações matemáticas por segundo) e um sistema de computação em nuvem abastecido por dados públicos.
"Nuvem soberana" e governança de dados públicos
A chamada "nuvem soberana" é uma demanda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para quem o manejo e a gestão de dados são questões sensíveis.
Em participação na abertura da Semana de Governança de Dados, que ocorre de 12 a 16 de agosto em Brasília, a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, enfatizou que o Brasil possui uma vasta produção de dados, que oferecem um amplo panorama da realidade nacional. No entanto, muitas vezes, esses dados não se comunicam adequadamente.
Um dos objetivos do PBIA é garantir que esses dados se comuniquem entre si, criando um ecossistema integrado que possa ser utilizado de forma mais eficaz pelo governo para melhorar os serviços e as políticas públicas, afirmou a ministra
A terceira iniciativa que mais chamou atenção da comunidade científica e tecnológica foi a promessa de criação de um chatbot de IA generativa treinado com dados nacionais, tendo o português como língua nativa.
Santos afirmou que o projeto está aberto à colaboração de empresas estrangeiras, desde que elas transfiram sua tecnologia para o Brasil:
"No processo de montagem do plano, as grandes empresas participaram e eu fui muito clara: queremos uma troca, um aprendizado mútuo. E queremos, claro, ter o domínio tecnológico. (...) A nossa vontade política é essa, e percebo que não há resistência por parte dessas grandes empresas, também pelo interesse objetivo que elas têm em partilhar esse novo momento que estamos vivendo nessa revolução tecnológica."
Conforme noticiado pelo Cointelegraph Brasil, o Brasil já possui pelo menos um "chatbot nacional" operante disponível no mercado. Lançado em dezembro do ano passado, o MariTalk foi desenvolvido com o apoio do Google sob a forma de equipamentos e poder de processamento computacional, e fundamentou-se em uma curadoria de dados baseada em fontes e documentos em português.