A inflação tornou-se o principal vetor da política monetária dos bancos centrais das economias mais fortes do planeta, ditando os rumos do mercado ao longo de 2022 e além. Persistente, ela tem se mantido inabalável, em parte em função da disrupção da cadeia de suprimentos causada pelo COVID-19, mas também por causa das tensões geopolíticas entre as potências ocidentais em oposição à Rússia e à China por conta da guerra na Ucrânia e da soberania de Taiwan.

O tradicional aperto monetário, com aumento das taxas de juros e redução do balanço patrimonial do Banco Central dos EUA (Fed), vem reduzindo a liquidez nos mercados globais, provocando a desvalorização tanto dos ativos de risco, como as criptomoedas e as ações, quanto dos ativos clássicos de proteção como o ouro e os imóveis. Nenhum deles têm sido capaz de bater a inflação em 2022, considerando-se os mercados norte-americanos.

Em um momento em que o patrimônio individual da grande maioria da população global está se desvalorizando, um estudo publicado pela Ecoinometrics utilizando os dados históricos disponíveis traça uma comparação entre as quatro diferentes classes de ativos citadas acima para revelar quais delas têm se mostrado mais eficazes como reserva de valor ao longo do tempo.

Entendendo a inflação

Não apenas a inflação dos EUA alcançou níveis que não eram vistos há 40 anos, como ela tem se mantido em alta na maior parte do período para o qual se tem dados disponíveis, destaca a Ecoinometrics. E acrescenta:

"Isso é ruim, especialmente considerando que a inflação é uma taxa de mudança. Quando a inflação cai, isso significa apenas que os preços vão subir mais devagar – e não que os preços vão cair. Uma redução no custo de produtos e serviços só acontece quando a inflação fica negativa."

Desde a década de 1940 nos EUA – e também no Brasil – a inflação ficou negativa apenas por breves momentos. Porém, nunca o suficiente para compensar os aumentos de preços prévios.

Inflação dos EUA (CPI) desde o final dos anos 1940. Fonte: Ecoinometrics

Assim, um ativo de proteção realmente eficaz deve oferecer rendimentos superiores à inflação para conferir ganhos reais aos seus proprietários.

Ações

Ativo de risco clássico dos mercados financeiros tradicionais, desde 1950, as ações, consideradas a partir do índice S&P 500, que engloba as 500 principais empresas norte-americanas listadas em bolsa, ficaram abaixo da inflação em dois períodos específicos, além, é claro, do momento atual.

O primeiro se estendeu de meados dos anos 1960 até o início dos anos 1980. Trata-se de um período de grande turbulência interna e externa nos EUA. No front internacional, o país enfrentou a Guerra do Vietnã, a crise do petróleo e os capítulos derradeiros da Guerra Fria contra a antiga União Soviética, enquanto no ambiente doméstico houve a crise da dívida, que obrigou o presidente Richard Nixon a acabar com o lastro em ouro do dólar, seguida pelo caso Watergate e a guinada neoliberal na economia a partir dos anos 1980, que promoveu um rearranjo na economia doméstica do país.

Depois, entre 2000 e 2014, período que compreendeu duas grandes crises financeiras: o estouro da bolha das empresas ponto com na virada do século e a crise do subprime em 2008.

Em quaisquer outros momentos, os rendimentos reais ficaram substancialmente acima da inflação. Deve-se considerar também que um investidor que tenha comprado ações durante os períodos de baixa e as manteve com foco no longo prazo,e as vendeu já fora dos períodos de depressão, obteve os melhores lucros, naturalmente. Confirmando o sucesso do clássico mandamento de comprar na baixa e vender na alta.

Como exemplo a Ecoinometrics propõem um cenário hipotético que toma o ano de 1998 como ponto de partida, um período de euforia nas bolsas impulsionados pelo advento da internet e dos primórdios da economia digital:

"Se você comprou o S&P 500 em 1998, seus retornos reais foram irregulares no início por culpa da bolha ponto com seguida pela Grande Recessão. Mas desde então o mercado de ações vem vencendo a inflação com larga vantagem."

Os ganhos máximos do índice S&P 500 no período quase chegaram a 400%, como se pode ver no gráfico abaixo.

Índice S&P 500 contra inflação dos EUA (CPI) desde 1998. Fonte: Ecoinometrics

Como conclusão, o estudo da Ecoinometrics afirma que "no curto prazo, não há garantia de que o mercado de ações possa ajudá-lo a bater a inflação." No entanto, tem se provado eficiente para investidores focados em ganhos de longo prazo.

Ouro

Logo que o governo dos EUA revogou o lastro do dólar em relação às reservas de ouro do país, o metal precioso se valorizou sensivelmente em relação à moeda norte-americana. A década de 1970 foi marcada por uma forte expansão inflacionária na economia dos EUA. Ao menos em números absolutos, embora não necessariamente em termos estruturais, trata-se de um momento similar ao que vivemos agora.

Justamente nessa época o ouro se consagrou como um ativo de proteção. No entanto, já a partir dos anos 1980, o ouro perde em rentabilidade e deixa de oferecer rendimentos reais contra a inflação.

O ouro viveu uma renascença justamente entre 2000 e 2014, no período das duas grandes crises financeiras do século 21, as quais corresponderam declínios nos mercados acionários.

O gráfico abaixo apresenta dois eixos temporais, sendo que o diagonal deve ser tomado quando o momento de compra do ativo, e o horizontal sinaliza os retornos reais. 

Retornos do ouro contra a inflação dos EUA (CPI) desde 1970. Fonte: Ecoinometrics

Na recente crise inflacionária, no entanto, o ouro não vem confirmando seu status de ativo de proteção e tem sido batido pela inflação. Na comparação com o S&P 500, mostra-se em desvantagem, de acordo com a Ecoinometrics:

"Como se pode ver, o ouro não está se saindo muito melhor do que o mercado de ações nos últimos dois anos. Talvez o ouro seja acometido por um atraso, mas até agora não tem se mostrado um grande hedge de inflação."

Bitcoin

Criado como uma resposta à Grande Recessão, a história do Bitcoin (BTC) tem início mais ou menos um ano depois da crise do subprime. Alguns anos se passaram até que a adoção foi além de um nicho de cypherpunks e anarco-capitalistas.

Desde 2013, quando teve seu primeiro grande ciclo de alta e despertou a atenção de um público mais amplo, a ação de preço do BTC tem sido marcada por períodos de crescimentos exponenciais seguidos de grandes correções.

O fato é que todos aqueles que não entraram em desespero com quedas de mais de 80% em relação às máximas históricas acabaram recompensados numa janela de tempo estendida, como destaca a Ecoinometrics a partir de um gráfico similar ao utilizado para avaliar o comportamento do preço do ouro:

"A observação interessante no caso do Bitcoin é que todos os períodos em que a inflação supera o Bitcoin estão concentrados perto da diagonal do mapa de calor. Isso significa que, até agora, quem investiu em Bitcoin por um período de mais de quatro anos, conseguiu ficar à frente da inflação."

Retornos do Bitcoin contra a inflação dos EUA (CPI) desde 2011. Fonte: Ecoinometrics

A pergunta de US$ 100 mil é se a história irá se repetir após o atual mercado de baixa. "Porém, dado o potencial positivo do Bitcoin a longo prazo, nós acreditamos nessa probabilidade", conclui o estudo da Ecoinometrics.

Para um ativo que saiu literalmente do zero e chegou a valer US$ 68.789 em sua máxima histórica, o custo atual em torno de US$ 19.000 ainda parece oferecer boas oportunidades aos investidores.

Conforme noticiou o Cointelegraph Brasil recentemente, analistas estimam que o Bitcoin possa estar valendo algo entre US$ 100 mil e US$ 2 milhões até 2025.

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