O governo do presidente Donald Trump está ‘incomodado’ com o avanço do PIX no Brasil, dizendo que ele prejudica a receita de empresas americanas.

Uma investigação foi aberta pelos EUA e será conduzida pelo USTR (Representante de Comércio dos EUA), sob a Seção 301 da legislação norte-americana, mecanismo que autoriza medidas de retaliação econômica sempre que práticas estrangeiras sejam consideradas prejudiciais aos interesses comerciais dos EUA.

"Sob o comando do presidente Donald Trump, eu abri a investigação sobre os ataques do Brasil às empresas de rede social americanas e outras práticas comerciais injustas", disse Jamieson Greer, representante dos EUA para o comércio, em nota.

No documento preliminar que abre o processo investigativo, o relatório questiona o modelo do PIX, sistema de pagamentos criado pelo Banco Central. Sem mencionar o nome diretamente, o texto insinua que o PIX representa concorrência desleal por ser uma infraestrutura gratuita e gerida pelo Estado.

O documento também critica as restrições à transferência de dados pessoais do Brasil para os EUA, que segundo a USTR, atrapalham a prestação de serviços digitais e o funcionamento de empresas americanas.

"O Brasil também parece se envolver em uma série de práticas desleais com relação a serviços de pagamento eletrônico, incluindo, entre outras, a promoção de seus serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo", destaca o documento.

Desse modo, caso a investigação conclua que o Pix prejudica empresas e interesses americanos, o USTR pode exigir que o sistema seja encerrado pelo Brasil sob a pena de sanções, com a aplicadas em países como Irã e Rússia.

“A declaração de Trump revela uma contradição difícil de ignorar: ao mesmo tempo em que se posiciona como pró-cripto e defensor da liberdade econômica, ele ataca justamente o PIX, ferramenta essencial para a democratização do acesso aos criptoativos no Brasil. O PIX se tornou a principal ponte entre o real e o universo cripto, sendo responsável por mais de 90% dos depósitos em corretoras nacionais. Atacar o PIX é, na prática, fragilizar a infraestrutura que viabilizou a entrada de milhões de brasileiros no mercado de ativos digitais. Além disso, trata-se de um sistema que promoveu inclusão financeira, reduziu custos, eliminou intermediários e aumentou a eficiência do sistema bancário. É curioso ver um governo que se diz a favor da inovação ameaçar justamente um dos modelos mais bem-sucedidos de integração entre finanças tradicionais e criptoeconomia”, disse Sarah Uska, analista de criptoativos do Bitybank

EUA x Brasil

O documento do governo norte-americano cita o Supremo Tribunal Federal (STF) como um dos principais focos de preocupação. O texto critica decisões da Corte que teriam obrigado empresas de tecnologia americanas a remover postagens ou suspender contas nas redes sociais, o que o relatório chama de “censura”.

A análise, no entanto, ignora o contexto legal e territorial dessas ordens, que envolvem conteúdos ilegais ou relacionados a crimes previstos no Código Penal Brasileiro.

Outro ponto levantado pela USTR envolve o julgamento do STF sobre o Artigo 19 do Marco Civil da Internet, que trata da responsabilidade das plataformas digitais sobre o conteúdo publicado por usuários. O governo norte-americano alega que a decisão do STF torna as redes sociais responsáveis por remover conteúdo ilegal, mesmo sem ordem judicial. Embora o relatório use linguagem vaga, ele aponta essa mudança como um fator de risco para as empresas de tecnologia dos EUA que atuam no Brasil.

Além disso, o governo norte-americano acusa o Brasil de leniência no combate à pirataria, mesmo diante de ações coordenadas entre Anatel e Ancine para bloquear sites ilegais e apreender equipamentos clandestinos. O texto não reconhece os esforços públicos já realizados e, em contrapartida, omite o fato de que empresas americanas que controlam marketplaces digitais têm resistido a colaborar com essas ações, mesmo com liminares obtidas no Judiciário brasileiro para se isentarem de responsabilidades.

A investigação também cita outros elementos fora do setor digital, como acordos comerciais com o México, subsídios ao etanol e questões ambientais.

Segundo o calendário divulgado pelo USTR, a investigação deve se estender até pelo menos setembro, com a possibilidade de sanções tarifárias de até 50% sobre produtos brasileiros exportados aos EUA.

Trump já havia ameaçado adotar esse tipo de retaliação em uma carta enviada ao governo brasileiro, onde classificou as decisões do STF como uma "caça às bruxas" contra Bolsonaro e um risco direto aos interesses norte-americanos na internet.