Após um período de 40 dias em que o preço do Bitcoin (BTC) ficou preso em uma faixa estreita, deixando de lado a típica volatilidade das criptomoedas, bastaram duas altas subsequentes acima de 3% na terça e na quarta-feira para que o otimismo voltasse a dar as caras no mercado.
Rali de alívio típico de mercado de baixa ou sinalização de que o longo inverno de 2022 pode estar chegando ao fim? Quando se trata de afirmar que o preço do BTC já encontrou seu fundo no atual ciclo de baixa, as opiniões continuam majoritariamente divergentes.
O inverno cripto de 2022 vem quebrando alguns padrões clássicos de mercados de baixa anteriores. Então, mais do que nunca, desempenhos passados têm pouca valia para uma avaliação do futuro – a análise de gráficos e métricas oferecem argumentos tanto para os otimistas quanto para os pessimistas. Portanto, não passam de especulação.
Especialmente porque o cenário macroeconômico apresenta condições únicas na história do Bitcoin: inflação em alta, aperto monetário do Banco Central dos EUA, queda nas bolsas norte-americanas e uma grande probabilidade de recessão.
Fixando-se naquilo que é possível analisar, vale observar o desempenho das 10 principais criptomoedas em capitalização de mercado desde as mínimas de junho. Se não para tentar prever o futuro, para tentar identificar outras diferenças na dinâmica atual do mercado em relação a ciclos anteriores.
Bitcoin (BTC)
Após o rompimento da forte resistência em US$ 20.500 na quarta-feira, o Bitcoin adicionou quase 8% de valorização em relação à mínima de US$ 17.622, registrada em 18 de junho. Não chega a ser uma recuperação propriamente substantiva, ainda mais quando comparada a outras criptomoedas do top 10.
Desempenho das 10 principais criptomoedas do mercado de 18 de junho a 27 de outubro. Fonte: TradingView
Em uma análise para o Cointelegraph Brasil, Felipe Medeiros, analista da Quantzed Criptos, afirma que a valorização recente do Bitcoin veio na esteira de uma equiparação com os principais índices de ações dos EUA, o S&P 500 e o Nasdaq:
"Quando você traça um paralelo entre o Bitcoin e o S&P 500, a gente vê que o Bitcoin tinha ficado para trás. O preço do Bitcoin ainda estava corrigindo bastante no começo de outubro, enquanto tanto o S&P 500 quanto o Nasdaq estavam apresentando ganhos. Ambos estavam performando bem melhor que cripto. Havia um atraso injustificado."
O atual rali retomou em parte a correlação entre o Bitcoin e os mercados de ações dos EUA que tem sido uma das tônicas do ciclo de baixa de 2022, segundo Medeiros e não há sinais de que possa haver uma alta sustentada do preço do BTC no momento:
"Não há um volume financeiro grande para sustentar esse rali. Há uma grande dificuldade nos mercados norte-americanos. Os resultados das big techs estão muito ruins, especialmente no caso do Facebook. Mesmo que os dados do PIB hoje tenham vindo acima do esperado, eu não vejo a inflação cedendo e os EUA escapando de uma recessão. Talvez o Bitcoin alcance a casa dos US$ 22.000, quem sabe até US$ 24.000, para depois retornar para essa faixa atual de preço entre US$ 19.000 e US$ 21.000."
Ecossistema Ethereum ganha força
As duas criptomoedas que registraram o melhor desempenho de mercado desde as mínimas de junho fazem parte do ecossistema da Ethereum (ETH): são elas o próprio Ether e o MATIC, token nativo da Polygon.
Originalmente uma solução de camada 2 da Ethereum, a Polygon vem gradualmente construindo um ecossistema autônomo, com soluções para tokens não fungíveis NFTs e Web3 diversificadas, e que tem sido capaz de estabelecer parcerias de peso com grandes empresas e marcas.
Tomando como parâmetro o fundo de preço do Bitcoin – ativo que é o benchmark do mercado cripto – em 18 de junho, desde então o MATIC valorizou 164,6% e o ETH, 55,7%, de acordo com dados do CoinMarketCap.
O saldo de MATIC disponível para negociações em exchange atingiu os níveis mais baixos desde janeiro em paralelo ao mais recente impulso positivo do preço. Outros fatos otimistas observados recentemente e que podem ter influenciado na valorização do token, incluem o crescente volume de negociação e do número de vendas de avatares em NFT do Reddit e o anúncio da parceria com o Nubank para o lançamento da criptomoeda oficial do maior banco digital brasileiro.
Além de ETH e MATIC, outros tokens do ecossistema Ethereum que não estão entre os top 10 mercado apresentaram valorização significativa no período, incluindo o OP, da rede de camada 2 Optimism, o UNI e o CRV, das exchange descentralizadas (DEX) Uniswap e Curve, o AAVE, da plataforma de empréstimos descentralizada de mesmo nome, e o LDO, do protocolo de staking líquido Lido Finance.
Segundo Medeiros, há duas justificativas para a alta do ETH e dos tokens correlacionados ao ecossistema. A primeira, que diz respeito exclusivamente ao Ether, foram as liquidações de posições vendidas (shorts) do ativo nos últimos dois dias, ainda por conta de antecipações de cenários pós-Merge que acabaram não se concretizando, diz o analista:
"Esses shorts que foram fechados são de investidores que estavam esperando por um cenário macro deteriorado e uma correção mais forte do ETH após o The Merge. Isso acabou não acontecendo, apesar de uma queda de 10% a 15% no início de outubro. Esses investidores apostavam que o The Merge poderia ter algum tipo de efeito negativo, mas isso não aconteceu."
Mesmo as incertezas em relação ao status do Ether perante os reguladores e o suposto comprometimento da descentralização da rede não desempenharam um papel determinante sobre o preço do ativo.
Debates sobre os riscos de censura de transações por parte de validadores e ameaça de que a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) possa vir a classificar o ETH como título após a transição da rede para um modelo de consenso baseado em Prova-de-Participação (PoS) e no mecanismo de staking, mobilizaram a comunidade após a atualização. Pelo menos por enquanto, contudo, não têm afetado o preço do ativo.
Pelo lado positivo, houve um aumento do interesse do mercado pelo Ether à medida que a taxa de inflação do ETH se aproximou de zero e até se tornou negativa nos últimos dias, confirmando que a nova política monetária do token é eficiente e funciona, mesmo em um mercado de baixa, destacou Medeiros.
O analista ressalta ainda que com o aumento da atividade da rede diante de um futuro reaquecimento do mercado, há grandes possibilidades de o ETH se provar deflacionário.
Outros destaques
O XRP também acumulou uma forte valorização de 52% após as mínimas de junho do BTC, de acordo com dados do CoinMarketCap, devido à possibilidade de que a Ripple saia vencedora da batalha judicial travada contra a SEC que se arrasta desde o final de 2020.
De acordo com o CEO da Ripple Labs, Brad Gralinghouse, é possível que o julgamento seja concluído até o final deste ano, com grandes chances de que o tribunal não acate a acusação da SEC de que a empresa promoveu uma venda irregular de valores mobiliários com a oferta pública do XRP.
O Dogecoin (DOGE), que vinha apresentando um desempenho similar ao BTC no período até o início desta semana, disparou nos últimos dias e alcançou uma valorização de 45,5% desde meados de junho.
Mais uma vez, o DOGE se beneficou do efeito Elon Musk. No caso, a iminência da conclusão da compra do Twitter pelo empresário e o rumor de que a plataforma de rede social poderá lançar sua própria carteira digital de criptomoedas. Em tese, com Musk à frente da empresa, o novo recurso poderá contribuir para a aceleração da adoção do DOGE.
"Ethereum Killers" em baixa
Os destaques negativos entre as 10 principais criptomoedas do mercado desde as mínimas de junho cabe a três plataformas alternativas de contratos inteligentes que se apresentam como soluções mais eficientes do que a líder Ethereum.
Teoricamente, Solana (SOL), Polkadot (DOT) e Cardano (ADA) estariam aptas para resolver os problemas de escalabilidade e dos altos custos de transação da Ethereum. No entanto, no atual mercado de baixa, as três parecem estar ficando para trás, à medida que a narrativa de protocolos de camada 1 capazes de superar a Ethereum vem perdendo força.
Segundo Medeiros, o interesse do mercado no momento está, de fato, voltado para o ecossistema Ethereum e os seus protocolos de camada 2, fator que contribui para o fraco desempenho recente das "Ethereum Killers".
No caso da Solana, o período foi marcado por notícias negativas, com mais uma interrupção inesperada da rede e o recente hack da Mango Markets. Como resultado, o SOL acumulou perdas de 2,4%.
A Polkadot ganhou as manchetes no período única e exclusivamente porque o seu fundador, Gavin Wood, anunicou estar deixando o cargo de CEO da Parity Technologies, empresa responsável pelo ecossistema da rede, para assumir o posto de arquiteto-chefe do protocolo.
Em agosto, a Acala (ACA), uma das principais parachains da Polkadot, sofreu um forte abalo em agosto, quando a sua stablecoin algorítmica aUSD perdeu a paridade com o dólar e desde então não conseguiu mais restaurá-la. Atualmente, a stablecoin é negociada a US$ 0,76, de acordo com dados do CoinMarketCap –um deconto de 24% em relação ao seu preço alvo.
Embora a falha não tenha tido impacto relevante sobre o preço do do DOT no período, o token nativo da Polkadot caiu 8,9% desde 18 de junho.
Por sua vez, em tese, o ADA poderia estar em melhores condições, visto que a Cardano realizou com sucesso, embora com atraso, uma das atualizações mais relevantes de sua história – o hard fork Vasil. No entanto, o ADA registrou o pior desempenho entre os tokens do top 10 no período, acumulando perdas de 12,3%.
Nova dinâmica do mercado
Além de evidenciar as narrativas que têm ganhado maior tração no atual ciclo de baixa do mercado, o desempenho das dez principais criptomoedas do mercado sugerem uma nova dinâmica de mercado, segundo o mais recente boletim do fundo de capital de risco Pantera Capital.
Na publicação divulgada na terça-feira, 25, portanto antes do mais recente rali de alta, o veterano CEO da Pantera, Dan Morehead, ressalta que o ecossistema está evoluindo e traça um paralelo com o desenvolvimento da internet em seus primórdios.
O surgimento de novos protocolos e novas soluções torna o espaço cripto mais complexo e diversificado, tornando a diligência e a assertividade uma qualidade fundamental para que os investidores obtenham os melhores retornos daqui por diante:
"O Bitcoin não se movimentou muito nos últimos quatro meses, enquanto outros protocolos estão realmente voando. É importante enfatizar para os investidores que houve um tempo em que o Bitcoin era único e tudo o que você precisava fazer era colocar seu dinheiro no Bitcoin e pronto. Então houve um momento em que você passou a colocar metade em Bitcoin, metade em Ethereum, e você estava bem. Agora, uma enorme quantidade de criação de valor está surgindo em outros projetos. Não deveria ser surpreendente. Não houve uma empresa que se tornou a internet, houve muitas empresas importantes que moldaram a internet. Haverá um grande número de protocolos importantes no futuro."
Aviso: Esta não é uma recomendação de investimento e as opiniões e informações contidas neste texto não necessariamente refletem as posições do Cointelegraph Brasil. Cada investimento deve ser acompanhado de uma pesquisa e o investidor deve se informar antes de tomar uma decisão.
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