O Projeto de Lei 4401/2021, que propõe um marco regulatório para as criptomoedas no Brasil, deverá ser votado na Câmara dos Deputados apenas após as eleições de outubro, informou reportagem do Valor Econômico publicada na quarta-feira, 13.

O PL de autoria do deputado Áureo Ribeiro (SD-RJ) recebeu dez destaques na Câmara dos Deputados após a aprovação do texto no Senado, quebrando o acordo informal que garantia o consenso sobre o tema entre as lideranças da casa legislativa. Cada destaque precisa ser votado em separado, e com isso a matéria deixou de ser prioridade na pauta da Câmara.

O relator do PL na Câmara, deputado Expedito Netto (PSD-RO), rejeitou as principais modificações à proposta aprovadas pelo Senado. Em parecer apresentado no último dia 5, Netto propôs a revogação da obrigação de empresas estrangeiras em operação no Brasil de fazerem registro imediato de CNPJ e de estarem conectadas ao Siscoaf para serem autorizadas a manter suas atividades no país.

Outra modificação polêmica apresentada pelo relator foi a rejeição da obrigação de que empresas prestadoras de serviços de criptomoedas mantenham segregação patrimonial, separando os seus recursos financeiros e ativos digitais do patrimônio dos clientes.

Netto entende que tal disposição pode impedir que as exchanges de criptomoedas ofereçam instrumentos de investimento mais sofisticados aos clientes, como algumas modalidades de produtos estruturados, que permitem operações alavancadas, por exemplo. A medida era defendida por entidades do setor como uma forma de proteger o patrimônio dos investidores diante de eventuais riscos de ordem administrativa e judicial que possam envolver as empresas.

A deliberação final sobre esses temas ficaria a cargo do órgão regulador a ser designado pelo Poder Executivo. A função muito provavelmente caberá ao Banco Central.

Netto ainda sugeriu a retirada dos incentivos fiscais para mineração de criptomoedas com energia renovável, por julgar que já existem leis que tratam do tema e não seria correto oferecer vantagens para uma categoria específica.

Repercussão

O parecer de Netto não foi bem recebido por empresas brasileiras e entidades do setor. A  ABCripto (Associação Brasileira de Criptoeconomia) defendeu o resgate de dois importantes dispositivos excluídos do texto final do projeto de lei pelo relator.

O primeiro é a regra de transição para que entrem imediatamente em vigor os dispositivos que visam garantir a segurança dos cidadãos e o bom ambiente de negócios para os empreendedores, definindo os critérios da territorialidade e da responsabilidade local para a atuação de empresas de criptomoedas no território nacional.

O segundo é a segregação patrimonial para evitar confusões, misturas ou imprecisões sobre os legítimos detentores dos bens, direitos e obrigações de empresas e clientes, como explicitado em nota publicada após a divulgação do parecer:

""Entendemos tratar-se de medida salutar e preventiva, de larga utilização em outros tipos de mercado, como o financeiro e o imobiliário, e que faria muito bem à Criptoeconomia, ampliando a higidez do setor para todos os seus participantes. Por esses motivos, a ABCripto estranha e discorda da supressão dessas proteções no relatório recém apresentado, clamando pela retomada do texto e a aprovação de tão importantes medidas para a segurança da criptoeconomia brasileira e sua evolução tempestiva, oportuna e adequada".

Sem previsão de data para votação

Apesar das alterações propostas por Netto terem quebrado o consenso em torno da proposta, a retirada do PL da pauta da Câmara teria sido motivada pelo calendário do legislativo às vésperas do recesso parlamentar.

A votação da 'PEC Kamikaze', que decreta estado de emergência no país, permitindo o desrespeito à lei eleitoral que veda a distribuição e a ampliação de benefícios sociais em ano de eleição, esteve no centro dos debates na Câmara na terça-feira, 13. Aprovada em votação de 1º turno em uma sessão tumultuada, que acabou suspensa devido a problemas no sistema de votação da Câmara, ela voltará à pauta nesta quarta-feira, 13.

Assim, os deputados teriam no máximo o restante da quarta-feira e a quinta-feira, 14 para votar o marco regulatório das Criptomoedas e outras matérias pendentes, o que é pouco provável de acontecer.

Julien Dutra, diretor de assuntos regulatórios da holding 2TM, controladora da MB, a maior exchange de criptomoedas do país, defende que a proposta seja votada imediatamente, a despeito de suas eventuais imperfeições:

"O mercado inteiro está a favor. Mesmo sem a segregação e a regra de transição, pelo menos o debate foi posto. O mais importante é termos a proteção necessária ao consumidor que a proposta garante".

Segundo Dutra, não há problema em deixar que temas como a exigência do CNPJ e de segregação patrimonial sejam deixados para regulamentação infralegal posterior pelo órgão competente designado pelo Executivo, desde que o marco regulatório seja finalmente aprovado.

Conforme noticiou o Cointelegraph Brasil no final do ano passado, ainda há um longo caminho a ser percorrido até que o Brasil possa estabelecer regras claras para o funcionamento do mercado de criptomoedas no país.

LEIA MAIS

  •