O Ministro da Economia do Brasil revelou em audiência virtual da comissão mista do Congresso nesta quinta-feira que tem o sonho de "despolitizar" a moeda brasileira, o real.

Guedes defendeu a autonomia do Banco Central, dizendo que as moedas brasileiras não podem ser "manipuladas" pelos governos "como aconteceu no passado", sem citar - obviamente - as interferências políticas do governo Bolsonaro na economia:

"Isso é um sonho de mais de 30, 40 anos. O objetivo é despolitizar a moeda. O Banco Central não pode mais ser manipulado pelo ministro da Fazenda, querendo colocar juros artificialmente baixo, como já aconteceu no passado."

Mais uma vez ao seu estilo, Guedes defendeu que "todos os países avançados têm" um Banco Central autônomo, sem citar quais nem em quais termos, e completou dizendo que este será "um capítulo histórico da história brasileira".

De fato, o Banco Central brasileiro atuou na história do país ao perfil dos governos vigentes, inclusive no bolsonarismo, com perfil econômico mais neoliberal.

Desde o fim da ditadura, nas crises dos governos Sarney e Collor, o Banco Central adotava postura de maior intervenção na economia, para tentar conter a fuga de investidores e a inflação galopante. No pior ponto das crises, o governo Collor confiscou a poupança de milhões de brasileiros de um dia para o outro.

Depois, com a renúncia do presidente, Itamar Franco lançou o Plano Real, e seu Ministro da Fazenda e sucessor, Fernando Henrique Cardoso, foi quem mais lucrou politicamente com o sucesso econômico da nova moeda.

Os governos FHC foram marcados por inflação relativamente baixa (especialmente em comparação com os antecessores), uma política de controle cambial rígida, privatizações e aumento das dívidas interna e externa, além de manter os juros elevados.

A crise global de 1998 acabou levando o Brasil a mais uma crise, e o país teve de pedir ajuda econômica ao Fundo Monetário Internacional mais de uma vez. Em 1999, o controle cambial foi afrouxado e a moeda desvalorizou, aprofundando a crise até a transição, em 2002.

Nos governos petistas (2003-2016), sob o temor dos mercados em um primeiro momento, com alta da inflação e temor de calote, depois o desempenho econômico foi visto com bons olhos: a dívida externa foi paga e o país passou a acumular reservas, os juros foram mantidos "ao gosto do mercado", mas foram gratativamente aumentando.

As crises nesta década foram, então, principalmente políticas, com denúncias de corrupção, forte oposição da mídia, ministros demitidos e até traições, como a que terminou no impeachment de Dilma Houssef em 2016.

A presidente deposta herdou um país com economia estável e capacidade de investimentos, mas as denúncias de corrupção se intensificaram, o ex-presidente Lula foi impedido de integrar o governo e preso, a economia piorou substancialmente e um grande acordo entre classe política, judiciária e empresarial - para além da falta de capacidade política da presidente - acabou por selar seu destino.

Depois, nos governos Temer e Bolsonaro, o Brasil voltou ao neoliberalismo e as crises políticas e econômicas continuaram - e até tenham se aprofundado, obviamente impactando nas políticas do Banco Central e na popularidade dos governos: os juros baixos não foram capazes de atrair investidores, que tomaram a direção contrária, e o BC têm intervido constantemente para que o real não derreta ainda mais rápido.

O "sonho" de Guedes, mesmo com o desenvolvimento de uma moeda digital de banco central, não seria possível nos moldes da sociedade brasileira de hoje, já que o Banco Central sempre estará ligado a alguma forma de poder centralizado - por ser da natureza da própria entidade. 

Como despolitizar uma entidade central através da política?

Os planos do Ministro da Economia de criar um sistema financeiro autonômo  já existe no mundo, há mais de 10 anos: o Bitcoin. A moeda descentralizada criada em 2009 não é controlada por ninguém, tem um suprimento limitado e uma política de cortes de recompensa e de produção imutável, até que a última moeda seja produzida.

Além disso, a rede do Bitcoin é segura a tal ponto que já sobreviveu a 11 anos sem fraudes ou hacks.

Os pares de preço do Bitcoin flutuam principalmente através da equação oferta/demanda, com os outros mercados variando em relação a ela: a desvalorização do dólar em 2020 e a demanda por uma moeda descentralizada de todos os mercados e bancos centrais durante a crise econômica global da pandemia acabaram por tornar o Bitcoin mais útil às populações de economias em crise, e também por isso ele se tornou mais valioso.

No Brasil, com a maior desvalorização da história do real, o Bitcoin está em seu maior preço histórico, e quem investiu em Bitcoin antes ou no começo da crise se protegeu da série de escândalos políticos e do enorme buraco econômico dos últimos meses, com o dólar também em recorde máximo e perspectiva de piorar. 

O mercado da principal criptomoeda do mundo, portanto, funciona como o sonho de Paulo Guedes: está livre dos rompantes políticos de qualquer banco central ou ministério da fazenda no mundo.

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