Perfis bolsonaristas, sites de fake news e até o maior guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho, já foram alvo da campanha de desmonetização comandada pelo perfil Sleeping Giants Brasil, que chegou ao Brasil há só três meses e pressiona empresas a não financiarem páginas de ódio e de mentiras na internet, como revela o El País.

O sucesso das campanhas do Sleeping Giants incomodou o governo, chegando ao extremo da Polícia Federal abrir uma investigação para descobrir quem está por trás do perfil anônimo, mas o inquérito foi arquivado pela Justiça.

O Sleeping Giants não é o primeiro alvo da politização das polícias sob comando bolsonarista: o Ministério da Justiça de André Mendonça chegou a encomendar dossiês de opositores denominados antifascistas do governo e agora tem tido de se explicar ao Supremo Tribunal Federal.

O próprio filho do Presidente da República, o deputado Eduardo Bolsonaro, admitiu que entregou o dossiê - ainda desconhecido dos demais poderes do país - a autoridades dos Estados Unidos, sem explicar o propósito de tal ação.

O objetivo do Sleeping Giants, que também está em outros países do mundo, é pressionar grandes empresas para desmontar a rede de monetização que financia campanhas de ódio contra adversários políticos e propagam notícias falsas com objetivos igualmente políticos.

Curiosamente, Estados Unidos e Brasil são dois dos países em que a extrema-direita tem tido mais sucesso na monetização de influenciadores de discursos de ódio, como é o caso de Olavo de Carvalho, o "intelectual" do bolsonarismo. Em março, Olavo dizia que não havia nenhum morto por coronavírus no Brasil e que a pandemia não existia. Seis meses depois, 110.000 brasileiros morreram do que o presidente Bolsonaro chamou de "resfriadinho".

Olavo é agora o principal alvo do Sleeping Giants no Brasil. O perfil já conseguiu desmontar o financiamento dos sites Conexão Política, Brasil Sem Medo e Jornal da Cidade Online, dois dos principais motores da rede de fake news de extrema-direita na internet.

Além de cobrar empresas que anunciavam nos sites pelo Google Ads, eles também pressionaram um dos fornecedores de tecnologia dos sites, a Hotmart, que vendia as assinaturas online. O CEO da empresa, João Pedro Resende, hesitou ao desmonetizar os sites e respondeu que a empresa não é "julgadora de fake news na internet".

Em julho, porém, a Hotmart informou a decisão de descontinuar seu produto tecnológico para produtos jornalísticos e periódicos "de cunho político, independentemente da ideologia". O Brasil Sem Medo, porém - informa o El País -, ainda usava o sistema até a semana passada.

Os sites e Olavo também usavam PayPal e PagSeguro, plataformas de pagamento online que também foram pressionadas a desmonetizar o financiamento.

O PayPal bloqueou a conta de Olavo, que chamou o ato de "censura do comunismo, mas o PagSeguro ainda resiste, apesar de seus termos de segurança do usuário sinalizarem uma violação ao "propagar mensagem ou material que incite à violência ou ao ódio". O site argumenta que há impedimentos legais para o bloqueio, mas especialistas divergem.

As redes sociais também se mostram tímidas ao bloquear os propagadores de ódio. Apesar de Twitter e Facebook chegarem a bloquearem posts de fake news de autoridades como Donald Trump e Bolsonaro, as redes sociais foram cúmplices da extremista Sara Giromini, que usou o Twitter, o Youtube, o Instagram e o Facebook para revelar nome e endereço da criança de 10 anos que abortou legalmente no último domingo e foi alvo de pressão fundamentalistas religiosos e até da ministra Damares Alves.

O post de Giromini, que usa o codinome nazista Winter, demorou quase dois dias para ser tirado do ar. Só depois as contas dela no Twitter e no YouTube foram suspensas.

Com a campanha de desmonetização fazendo efeito, bolsonaristas, sites de fake news e "influenciadores" como Olavo de Carvalho recorrem a outras formas de arrecadação. O Jornal da Cidade Online chegou a apelar ao programa de afiliados do site de apostas Bet 365, mas a maioria deles agora buscam a doação em Bitcoin e plataformas de monetização de conteúdo de extrema-direita, como a Thinkspot.

A debandada de anunciantes provocou reação no governo Bolsonaro, que atuou para pregar um boicote às empresas que aceitaram desmonetizar conteúdos falsos e de ódio. Como é de praxe no chamado gabinete do ódio bolsonarista, 30% dos perfis que atuaram contra as marcas no Twitter eram operados por robôs.

O secretário de comunicação do governo, Fabio Wajngarten, disse publicamente que iria "contornar a situação" para ajudar os "veículos independentes" depois do Banco do Brasil restringir anúncios, gerando polêmica quanto à ingerência do governo e financiamento estatal de fake news.

Havia propagandas do governo Bolsonaro até em sites de conteúdo pornográfico, como noticiou a Folha. O TCU recomendou que o governo suspendesse o contrato com o Google.

O Google informou ao El País que removeu entre abril e junho de 2020 mais de 600.000 páginas e 16.000 domínios por violarem suas políticas.

Outros trunfos conquistados pelo Sleeping Giants foram também a derrubada do financiamento do grupo extremista 300 do Brasil, da mesma Sara Giromini, que segundo o Ministério Público atuava como milícia armada, além do canal Xbox Mil Grau, que reunia gamers famosos por falas racistas, sexistas e homofóbicas.

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