O sentimento do mercado de criptomoedas sofreu um brusco revés no início de 2025. A euforia que caracterizou o quarto trimestre de 2024, motivada pelo efeito Donald Trump sobre o mercado, agora se converteu em medo extremo, a ponto de muitos investidores e analistas postularem que a posse do presidente dos EUA pode ter marcado o topo do mercado de alta.

Samir Kerbage, CIO da gestora de ativos digitais Hashdex, afirma peremptoriamente que não, na mais recente edição do boletim “Notas do CIO":

“Não vemos sinais de que os eventos recentes estejam encerrando o mercado de alta e, embora a volatilidade de curto prazo possa ser preocupante, também serve como um lembrete de que as fases dos ciclos de cripto raramente seguem uma linha reta.”

Desde 20 de janeiro, data em que Trump assumiu o governo, o Bitcoin (BTC) corrigiu mais de 20% em relação à máxima histórica de US$ 109.300, enquanto Ethereum (ETH) e Solana (SOL) despencaram mais de 50% em relação aos seus topos recentes.

Segundo Kerbage, no entanto, “a situação atual faz parte do ciclo natural do mercado, em vez de uma reversão definitiva de tendência”:

“Os mercados de alta sempre incluíram períodos de volatilidade intensa e correções acentuadas. O rali de 2020–2021, por exemplo, teve várias quedas de 20% ou mais antes de o BTC alcançar novas máximas.”

Efeito Trump

Kerbage aponta que, da mesma forma que impulsionou a alta do mercado no fim do ano passado, o presidente dos EUA seria um dos principais culpados pela atual reversão. O lançamento do TRUMP, sua memecoin oficial, às vésperas da posse, drenou a liquidez do mercado, provocando um colapso no mercado de altcoins.

Embora o evento tenha resultado em novas máximas históricas para o Bitcoin e a Solana, o TRUMP teve efeitos colaterais duradouros sobre o mercado.

Iniciativas semelhantes como o token oficial da primeira dama Melania Trump e a LIBRA, criptomoeda endossada e posteriormente rejeitada pelo presidente da Argentina, Javier Milei, em um escândalo que quase lhe custou um processo de impeachment, provocaram a exaustão do mercado de memecoins, um dos principais vetores de alta do ciclo atual.

Prova disso é a desvalorização do SOL desde as máximas de US$ 293,31 registradas em 19 de janeiro, concomitante com o lançamento de TRUMP e MELANIA, uma vez que que a Solana é a rede que concentra a maior parte da liquidez do setor de memecoins.

Além disso, Kerbage destaca a lentidão do governo em avançar com suas promessas relativas à regulação e a adoção das criptomoedas. O anúncio da reserva estratégica de criptomoedas no domingo, 2 de março, representou antes um ruído do que propriamente um avanço concreto.

Além das críticas de grande parte da comunidade, inclusive de apoiadores de Trump, devido à inclusão arbitrária de altcoins como XRP, Cardano (ADA) e o próprio SOL, a aprovação da reserva depende da aprovação do Congresso. Portanto, não deve ocorrer tão cedo e está longe de ser um fato consumado.

No campo macroeconômico, os atos de Trump também não têm favorecido os ativos de risco, destaca Kerbage. A guerra comercial declarada tanto a aliados quanto a rivais ignora as pressões inflacionárias internas em um momento em que a economia do país dá sinais de desaceleração.

Em paralelo, a política externa do governo provocou o aumento das tensões na Europa e no Oriente Médio. No conjunto, as políticas de Trump contribuíram para um movimento de aversão ao risco nos mercados financeiros, segundo o CIO da Hashdex:

“Refúgios tradicionais, como ouro e títulos do Tesouro dos EUA, registraram entradas nesse período, reforçando a sensibilidade do mercado à incerteza macroeconômica.”

Por fim, o hack de US$ 1,4 bilhão da exchange de criptomoedas Bybit foi um fator adicional para aumentar a descrença momentânea dos investidores.

Atividades sinalizam continuação do mercado de alta

Para justificar sua crença de que o mercado de alta ainda não chegou ao fim, Kerbage afirma que a pressão vendedora recente se originou dos traders e investidores de “curtíssimo prazo":

“Se observarmos o Spent Volume Average Band do BTC, uma métrica que mostra por quanto tempo as moedas vendidas foram mantidas, fica evidente que a esmagadora maioria do BTC vendido recentemente veio de atividades de curto prazo. De fato, quase 90% das vendas registradas entre 21 e 26 de fevereiro foi de BTC mantido por menos de um mês.”

Segundo o CIO da Hashdex, os hodlers, investidores com foco no longo prazo, não sucumbiram aos eventos recentes. “Podemos ver a partir desses dados que o período médio de retenção dos investidores de BTC é de quase cinco anos”, afirma Kerbage, conforme o gráfico abaixo.

Gráfico mostra que o período de retenção do BTC por investidores de longo prazo aumenta ao longo do tempo. Fonte: Hashdex (Glassnode)

Com base na atividade no mercado de derivativos, Kerbage projeta que os US$ 80.000 possam atuar como um nível de suporte consistente no curto prazo.

À medida que a volatilidade do mercado tem sido uma resposta às incertezas provocadas pelo próprio Trump, notícias favoráveis tanto na economia quanto nas políticas para criptomoedas podem surgir inesperadamente, contribuindo para a consolidação do preço do Bitcoin em uma faixa superior.

“Acredito que poderemos ver o BTC recuperar a faixa de US$ 90.000 a US$ 105.000 nas próximas semanas. Em outras palavras, o mercado de alta continua totalmente em vigor, e o Bitcoin permanece alinhado com o desempenho de ciclos anteriores", conclui o CIO da Hashdex.

Em análise exclusiva para o Cointelegraph Brasil, Arthur Driessen, analista da Crypto Investidor, afirmou que o fundo da recente correção está consolidado e novas máximas históricas do Bitcoin podem ocorrer antes do que os investidores esperam.