“E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou…”: os versos do poema de Carlos Drummond de Andrade, publicado originalmente em 1942, parecem se encaixar como uma luva em relação à transformação do mercado de criptomoedas ao longo dos últimos dois anos, quando o setor deixou de surfar no hype do “dinheiro fácil” injetado nas economias pelos bancos centrais, mundo afora, para o mercado de baixa, marcado pela crise de liquidez decorrente da fuga de capital dos investimentos de risco, o que favoreceu a exposição de diversos projetos que entraram em colapso e trouxeram a reboque a desconfiança dos investidores. 

Aos remanescentes, restou um mercado cripto aparentemente mais amadurecido em 2023, porém é preciso ficar de olho com os desdobramentos de algumas mazelas vindas de 2022 e, principalmente, com as eventuais “reprises” ao longo do ano que se inicia. Pelo menos, é o que se pode concluiu a partir da avaliação de alguns analistas e executivos ouvidos pelo Valor Investe, em uma publicação desta quarta-feira (11).

Eles destacaram questões como a crise de liquidez que fez de 2022 um ano desafiador ante ao ano anterior, a importância da autocustódia de criptomoedas, a “quebra” da descentralização por parte de grandes empresas de criptomoedas e a regulamentação, classificada como um “processo irreversível.”

O analista da casa de análise de investimentos Nord Reserch Luiz Pedro Andrade chegou a dizer que 2022 foi a ano mais desafiador da trajetória das criptomoedas, enquanto a diretora de vendas institucionais da empresa de segurança em blockchain BitGo, Juliana Walenkamp, acrescentou que episódios caracterizados como fraudes financeiras e de gestão, como o colapso do ecossistema do antigo Terra (LUNA), da exchange FTX e das plataformas de empréstimo em criptomoedas Celsius e Genesis, levantaram a desconfiança na tecnologia por parte dos investidores, embora ela tenha ressaltado que o momento pode ser excelente para projetos confiáveis. 

O diretor de investimentos da fintech Nomad, Celso Pereira, observou que a elevação da taxa de juros nos EUA, União Europeia (UE) e Reino Unido cortou o “dinheiro barato” que alimentava o crescimento exorbitante do mercado de criptomoedas e alertou que o arrocho monetário deve continuar em 2023. Já o sócio-fundador da gestora Fuse Capital Dan Yamamura frisou que o principal aprendizado é que a alavancagem exagerada em um mercado volátil, como o de criptomoedas, pode representar a ruína do investidor.

Em relatório liderado pelo especialista em criptomoedas André Franco, a exchange brasileira Mercado Bitcoin (MB) avaliou que episódios como o da FTX reforçam a necessidade de segregação patrimonial e que trouxe à tona a discussão sobre a autocustódia de criptomoedas porque, o colpaso da FTX favoreceu o pensamento dedutivo dos investidores médios em relação a uma possível insolvência de outras exchanges. Avaliação semelhante à expressa pelo diretor de pesquisa e investimentos da Viden Ventures, João Kamradt, que ressaltou a importância de os investidores assumirem suas responsabilidades em relação à autocustódia. 

Por outro lado, o episódio envolvendo a FTX favoreceu a pressão sobre as exchanges centralizadas quanto à demonstração de prova de reserva, conforme observou o gestor de fundos privados em criptomoedas e fundador da Financial Move, Tasso Lago. Já o analista de criptoativos da Empiricus Vinicius Bazan criticou o excesso de centralização do mercado cripto, que, segundo ele, favorece a alavancagem desproporcional. Bazan disse ainda que a regulamentação é necessária e citou os esforços no ambiente das finanças descentralizadas (DeFi) para a remoção de intermediários.

Quem também saiu em defesa da regulamentação foi o sócio e diretor de tecnologia da gestora Hashdex, Samir Kerbage, que disse que a falta de regras deixou o mercado de crédito em cripto muito frágil. 

Considerado uma celebridade do mundo cripto, o programador Jimmy Song demonstra ser contra a regulamentação e a entrada de atores instinucionais no mercado. Para o defensor do Bitcoin, os tokens são uma farsa e as CBDCs, bancos e exchanges serão destruídos, conforme noticiou o Cointelegraph Brasil

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