As transações entre fronteiras com criptoativos já conquistaram relevância e tiveram impacto considerável sobre a economia doméstica de alguns países. Por exemplo, no mês passado, o Banco Central do Brasil (BACEN) revisou a Balança Comercial Brasileira para ativos cripto com novas classificações, seguindo diretrizes do FMI.
Na Geórgia, por exemplo, que reúne 15% da mineração mundial de Bitcoin (BTC), as empresas recebem uma estimativa de US$ 700 milhões da mineração de Bitcoin anualmente. Isso representa cerca de 5% do Produto Interno Bruto (PIB), ou 10% dos bens e serviços exportados pelo país.
Criptoativos e diretrizes internacional
O fato é que o aumento repentino de ativos cripto pode representar um desafio para os bancos centrais, além de competir com as moedas fiduciárias oficiais e afetar a política monetária em muitos níveis. Nesse estágio, as autoridades monetárias de todo o mundo querem acompanhar de perto o avanço dos criptoativos. Porém, esse acompanhamento enfrentou dificuldades por dois motivos.
O primeiro é que ainda não existiam criptoativos quando a revisão mais recente dos manuais de estatísticas macroeconômicas ocorreu - publicada, por exemplo, pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, pela Divisão de Estatística das Nações Unidas, pela Divisão de Estatística e Pesquisa Econômica da Organização Mundial do Comércio etc. Não há diretrizes internacionais disponíveis, exceto por uma referência no Manual e Guia de Compilação de Estatísticas Monetárias e Financeiras, emitida pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
A segunda razão é porque a classificação dos criptoativos e sua regulamentação varia muito de país para país, em alguns casos ainda não foi definida ou está ainda sendo desenvolvida em vários países.
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Assim, embora esteja ciente da dificuldade em qualificar essencialmente as criptomoedas e monitorar um mercado ainda em desenvolvimento, o FMI decidiu fornecer orientações sobre categorias de criptoativos e recomendar tratamento estatístico específico, seguindo padrões atuais. Para isso, o FMI publicou o "Tratamento de ativos criptográficos nas estatísticas macroeconômicas", com a ressalva de que essas diretrizes podem precisar de revisão caso as condições mudem substancialmente no futuro.
Este documento fornece recomendações sobre o registro estatístico de transações transfronteiriças associadas a criptoativos semelhantes ao Bitcoin (BLCAs), diferencia tokens digitais e BLCAs, explica o processo de mineração e fornece orientações sobre como medir a produção de atividades de mineração, entre outros.
Regulação de criptoativos no Brasil
As iniciativas recentes do Banco Central do Brasil mostram uma mudança de posição que, até então, não via riscos em transações de moedas digitais para o sistema financeiro nacional, já que o volume de trasações ainda é muito baixo.
Depois de citar a recomendação do FMI de classificar a compra e venda de criptoativos (especialmente aqueles para os quais não há emissor) como ativos não financeiros produzidos, o Banco Central do Brasil agora diz que considerará a compra e venda de ativos cripto na balança comercial do país.
Observe que o BACEN não definiu ativos cripto, mas simplesmente disse que seguirá a recomendação do FMI para a preparação de estatísticas macroeconômicas, considerando as transações com ativos de criptografia como ativos não financeiros produzidos para o cálculo da balança comercial brasileira.
Tipos de criptoativos
É importante ressaltar que as diretrizes do FMI adotam o termo "ativos cripto" (segundo uma recomendação do G-20), e categoriza os criptoativos em dois tipos básicos:
- BLCAs, que são criptoativos baseados em blockchain desenvolvidos para funcionar como instrumento de negociação, como Bitcoin, Ether, EOS, Stellar e Litecoin.
- Criptoativos que não são BLCAs (por exemplo, digital tokens).
Embora o BACEN tenha mostrado em outras oportunidade que reconhece a diferença entre tokens, criptomoedas e moedas digitais, ele não fala da distinção do FMI entre as categorias de ativos cripto para fins de estatísticas macroeconômicas.
No entanto, sem esclarecer como os tokens digitais aparecerão nas estatísticas macroeconômicas, o BACEN pode ter dificuldade em monitorar o impacto real dos criptoativos no Brasil. Isso ocorre porque a classificação de tokens digitais nas estatísticas macroeconômicas depende da categoria de tokens (tokens de pagamento, utility tokens, tokens de ativos e tokens híbridos).
Por outro lado, o BACEN anunciou que a atividade de mineração agora é tratada como um processo de produção, conforme estabelecido nas diretrizes do FMI. Como conseqüência, as taxas de transação podem ser vistas como um pagamento pelos serviços de verificação de transação. Se o pagador da taxa de transação não for residente, o mineirador estará exportando serviços de verificação de transação para um não residente.
É importante observar que a produção de mineração, de acordo com o FMI, pode ser medida como a soma da taxa de transação e dos BLCAs recém-extraídos.
Assim, a segunda parte da mineração (por exemplo, BLCAs recém-extraídos) pode ser considerada um ativo produzido resultante da mineração.
Além disso, a autoridade monetária do Brasil declarou que, por serem digitais, os criptoativos não têm registro alfandegário, mas as compras e vendas dos residentes no Brasil implicam a realização de contratos de câmbio.
A obrigação de observar regras de câmbio em transações com ativos cripto e outros instrumentos relacionados, no entanto, já havia sido expressamente enfatizada pelo BACEN em 2017.
Além disso, o comunicado do Banco Central do Brasil conclui que as estatísticas de exportação e importação de mercadorias agora também incluem compras e vendas de ativos cripto. Isso se justifica porque o Brasil é um importador líquido de criptoativos, o que contribui para a redução do superávit comercial na balança do pagamento de bens.
O BACEN decidiu incluir criptoativos nas estatísticas macroeconômicas do país devido ao aumento no volume de compra e venda de ativos de criptografia no varejo e ao crescente interesse demonstrado pelo mercado financeiro tradicional?
Independentemente da resposta, é necessária uma avaliação honesta do impacto dos ativos de criptografia, identificando as novas oportunidades, competitividade, crescimento e integração social oferecidas por essa inovação.
As visões, pensamentos e opiniões expressas aqui são apenas do autor e não refletem nem representam necessariamente as visões e opiniões da Cointelegraph.
Tatiana Revoredo é diretora de estratégia da Global Strategy, especialista em estratégias de blockchain pela Universidade de Oxford, especialista em aplicativos de negócios de blockchain pelo MIT e professora de blockchain na Academia Insper e Nextlaw. Ela também é autora do livro "Criptomoedas no cenário internacional: qual é a posição dos bancos centrais, governos e autoridades sobre criptomoedas?"