Principais pontos
Gustavo Franco critica gastos públicos e alerta para risco fiscal crescente.
Dívida bruta brasileira já alcança R$ 8 trilhões, segundo o economista.
“Só existe a tecla G de gastar em Brasília”, disse.
Nesta segunda, o economista e ex-presidente do Banco Central do Brasil, Gustavo Franco, durante o DAC Insiders, evento promovido pelo Mercado Bitcoin, declarou que o Governo Federal precisa reduzir os gastos públicos para equilibrar o cenário econômico.
“Parece que só existe a tecla ‘G’ em Brasília, que é Gastar”. disse
Segundo ele, cada anúncio de gasto público gera menos confiança e mais descrença nos agentes econômicos.
Franco lembrou que a dívida bruta do Brasil já alcança R$ 8 trilhões, valor que precisa ser financiado por um Produto Interno Bruto em torno de R$ 12 trilhões. A conta, segundo ele, não fecha.
“Todos sabem fazer conta. Quando se anuncia mais programas, todos percebem que a fatura vai cair sobre a próxima geração”, afirmou.
O ex-presidente do Banco Central destacou um fenômeno pouco discutido, mas cada vez mais visível: a dominância fiscal. Em teoria, gastos públicos extras deveriam aquecer a economia. Mas, no Brasil, ocorre o contrário. O aumento da percepção de risco contrai investimentos, eleva juros e limita a ação da política monetária.
Para Franco, esse processo já começou. O efeito de cada novo programa deixa de ser expansivo e passa a gerar dúvidas.
“A pergunta que fica é: de onde virá o dinheiro? Sem caixa, sobra dívida. E a bola de neve aumenta”, disse. A consequência é simples: quem, de fato, fixa a taxa de juros não é mais o Comitê de Política Monetária, mas o próprio Tesouro, nos leilões da dívida.
Ele fez ainda uma analogia empresarial. Se o Brasil fosse uma companhia, estaria altamente endividada, com fluxo de caixa insuficiente e alavancagem insustentável. “Qualquer gestor olharia e diria: empresa ruim em solvência”, resumiu.
Ativos digitais como proteção a inflação
Questionado sobre a possibilidade do uso de Bitcoin e ativos digitais como uma forma de proteção a inflação, Franco não defendeu nem criticou o uso.
Segundo ele, ouro e criptomoedas estão acomodando o interesse, se não diretamente como opções para o que vai acontecer.
“É sempre bom, no momento de incerteza, ter opções, às vezes totalmente fora do dinheiro. Mas algumas dessas opções vão virar bilhetes de loteria. Vou fazer uma analogia com uma piada velha sobre quando o Fernando Henrique assumiu como o quarto ministro da economia que falaram que era como o oitavo casamento da Elizabeth Taylor….. mas, como no caso do Fernando Henrique, as vezes isso pode funcionar”, afirmou.
A comparação com o cenário internacional
Além da crítica à política fiscal brasileira, Franco analisou o cenário global. Ele mencionou o aumento de tarifas nos Estados Unidos como reação à concorrência da China. Para ele, essa medida é popular, pois atinge diretamente grupos prejudicados pela globalização, mas dificilmente se sustenta no longo prazo.
A transferência de indústrias para a Ásia incorporou mais de um bilhão de pessoas à economia global, lembrou o economista. Embora isso tenha gerado prosperidade na região, também causou frustração em trabalhadores americanos que perderam espaço.
“São eles que apoiam medidas protecionistas, mas é improvável que essa estratégia dure para sempre”, afirmou.
Franco observou que já ocorreu um ajuste cambial natural de cerca de 15% desde o chamado Liberation Day. Assim, tarifas adicionais parecem exageradas. Ele destacou que as negociações bilaterais entre Estados Unidos e China podem corrigir distorções e trazer estabilidade.
Para o Brasil, segundo Franco, a desvalorização do dólar pode até trazer algum fôlego ao Banco Central no combate à inflação. Porém, o verdadeiro problema está na política fiscal desorganizada. A percepção de gastos desenfreados alimenta incerteza e aumenta o risco-país.
Ele chamou atenção para a necessidade de repensar o sistema orçamentário. Hoje, o orçamento é escrito de forma fragmentada, com brechas que favorecem o aumento de despesas sem contrapartida.
“É preciso estruturar de outra forma. Do contrário, seguiremos nessa trajetória insustentável”, alertou.
Ao mencionar CAPEX e OPEX, o ex-presidente foi direto. Os investimentos públicos são praticamente inviáveis, já que as despesas correntes consomem quase toda a capacidade financeira. O resultado é um Estado sem margem para crescer ou investir em áreas estratégicas.
O impacto político
Franco também destacou que o efeito fiscal atual altera até a lógica eleitoral. Antes, eleições eram vistas como períodos de estímulo, com aumento de gastos e sensação de bonança. Agora, cada anúncio eleitoral pode significar o oposto: mais incerteza.
“Chegamos ao limite. O problema não é só técnico, é político. Como o mundo político vai se organizar para lidar com isso?”, questionou. Segundo ele, a resposta exigirá responsabilidade institucional e mudança cultural em relação ao uso do orçamento.
A tecla “G”
O ponto central de sua fala, contudo, foi a crítica direta ao que chamou de “tecla G de gastar”. Para Franco, Brasília age como se só existisse esse comando, ignorando a necessidade de freio e planejamento. O resultado, segundo ele, é um país preso a uma dívida crescente e a uma política econômica que gera mais medo do que confiança.
Ao encerrar sua fala, o ex-presidente do Banco Central deixou claro que o dilema fiscal não é apenas técnico, mas geracional. A dívida acumulada será paga pelos jovens de hoje, que herdarão um país mais caro de financiar e menos preparado para crescer.
Com isso, a mensagem de Gustavo Franco ecoa como alerta: o Brasil precisa parar de apenas “apertar a tecla G” e começar a pensar em como reorganizar seu futuro.