O Bitcoin (BTC) sempre foi considerado pelos seus adeptos e entusiastas como um ativo de segurança capaz de limitar as perdas dos investidores em momentos de crise macroeconômica ou instabilidade geopolítica. No entanto, uma análise do comportamento da maior criptomoeda do mercado de 2020 para cá aponta que em momentos de estresse global o Bitcoin tem mantido correlação direta com o mercado de ações. Mais especificamente, com os ativos de mais alto risco do mercado acionário.

Foi assim em março de 2020, quando ficou evidente que o coronavíruas desencadearia uma pandemia global, e no início deste ano, diante da manutenção da escalada da inflação e dos sinais cada vez mais evidentes de que o Banco Central dos EUA (FED) deve alterar o curso de sua política monetária expansiva, dando início a uma série de aumentos na taxa de juros.

Segundo afirmou em sua coluna desta quinta-feira no portal E-investidor o investidor e especialista em finanças brasileiro, Fabrizio Gueratto, os tempos em que o Bitcoin manteve-se descorrelacionado do mercado tradicional ficaram para trás.

A partir do momento em que os investidores institucionais aderiram ao mercado de criptomoedas, a correlação tornou-se inevitável. Para estas entidades, o Bitcoin é um ativo de maior risco do que as ações, então e natural que em momentos de tensões econômicas e geopolíticas como agora as criptomoedas sejam a primeira classe de ativos a ser abandonada em busca de portos mais seguros para seus fundos, escreve Gueratto:

"Se olharmos o passado recente, com a crise do coronavírus, em que muitos afirmavam que o Bitcoin era uma proteção contra crises mundiais, não foi o que aconteceu na prática. A criptomoeda desabou, assim como o mercado de ações. Isso quer dizer que, todos os investimentos de renda variável, exceto o ouro e dólar, que são reservas de valor, caminham juntos e quando o caos se aproxima, os grandes investidores se livram destes ativos o mais rápido que podem e, consequentemente, a cotação deles desaba."

A opinião é compartilhada por Yuya Hasegawa, analista de criptomoedas da exchange japonesa Bitbank. Em reportagem da CNBC publicada na terça-feira, ele afirmou:

“O Bitcoin é rotulado por alguns como uma moeda não estatal e apolítica e, de fato, teve um bom desempenho no passado em outros momentos de tensões geopolíticas. Então podemos esperar alguma demanda como um ativo de proteção. No entanto, a mudança no cenário macroeconômico tornou o Bitcoin frágil à volatilidade do mercado de ações dos EUA. Assim, os investidores de Bitcoin não deverão se sentir à vontade até que a situação na fronteira Rússia-Ucrânia comece a se acalmar."

Embora as últimas notícias do front deem conta do arrefecimento das tensões e as chances de uma guerra iminente pareçam distantes nesse momento, a simples ameaça de um conflito armado envolvendo as principais nações mundiais pode ter empurrado o Bitcoin e as criptomoedas para um ciclo de baixa.

Nesse caso, os cripto investidores devem estar preparados para um inverno prolongado, disse Chris King, CEO e fundador da Eaglebrook Advisors, à reportagem da CNBC:

"Se estivermos em um mercado em baixa, veremos mais oito ou nove meses de movimento lateral para baixo, o que é uma oportunidade para os turistas deixarem o mercado e os players realmente comprometidos continuarem trabalhando no desenvolvimento dessa tecnologia”.

Gueratto completa o raciocínio explicitando de forma clara e objetiva quais devem ser os efeitos imediatos de um inverno cripto para o mercado de criptomoedas, mas reafirma que os fundamentos tecnológicos e econômicos do Bitcoin não serão abalados:

"Na prática, se as bolsas globais desabam o Bitcoin tende a acompanhar estas quedas, porém, com uma diferença. Ele cai com muito mais força e velocidade e sobe na mesma proporção. Se ocorresse uma guerra, eu compraria mais criptomoeda. Acredito na tese do BTC para a minha carteira e um evento pontual, como uma guerra ou uma pandemia podem destruir o valor momentaneamente, mas não são fatores determinantes para destruir os fundamentos deste ativo."

O próximo verão

Investidores experientes da comunidade cripto costumam dizer que os períodos de baixa são um momento para a indústria limpar o joio do trigo, eliminando do jogo projetos e investidores que não têm comprometimento com a construção e o fortalecimento do ecossistema.

Em outras palavras, o sumiço dos aproveitadores e dos especuladores favorece a evolução da indústria. Nos ciclos de baixa o foco tende a estar voltado fundamentalmente ao desenvolvimento da infraestrutura e de aplicativos que serão responsáveis por um novo estágio de prosperidade técnica e econômica, o qual atrairá novos usuários e criadores em um ciclo constante de retroalimentação.

DeFi (finanças descentralizadas), NFTs (tokens não fungíveis), games play-to-earn, DAOs (organizações autônomas descentralizadas) e o metaverso não surgiram magicamente no ano passado devido à euforia do mercado. Estavam sendo gestados nos duros anos 2018 e 2019, enquanto um mercado dado por morto por muitos de seus detratores andava de lado e sobrevivia às custas da determinação dos verdadeiros adeptos da tecnologia blockchain.

Estas inovações foram fundamentais para atrair uma nova onda de usuários, muitos dos quais ignoram os aspectos mais técnicos e filosóficos que movem os desenevolvedores dos projetos. E isso é bom, afirmam os analistas, pois em última instância o crescimento da indústria depende fundamentalmente do crescimento da adoção em níveis globais. Em uma comparação com aplicativos populares da Web 2.0, como Uber, Instagram e AirBNB, Chris King declarou à CNBC:

"A coisa mais importante que rastreamos e analisamos sob uma perspectiva de curto e longo prazo é a adoção. Isso é realmente o que importa. O hype em torno desses ativos e o aumento dos preços levam mais usuários a ingressar na rede, que é, em última análise, o que nos importa”.

Na manhã desta quinta-feira, o Bitcoin registra uma baixa intradiária de 3,4% e está cotado a US$ 42.171, muito próximo a um nível de suporte importante para manter as esperanças de que o inverno cripto ainda possa ser evitado. Conforme noticiou o Cointelegraph Brasil recentemente, US$ 42.000 é a linha na areia que não pode ser quebrada para que os touros possam mirar em alvos de preço mais elevados.

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