Resumo da notícia
Novo PL cria o RERAV, regime que aplica 5% de imposto sobre criptoativos não declarados.
Programa busca regularizar ativos mantidos em exchanges estrangeiras e carteiras próprias.
Especialistas apontam dúvidas sobre alcance do benefício e impacto em quem já declarou corretamente.
Após o Governo Federal ser derrotado na MP 1303, que previa a aplicação de uma série de novos impostos para diversas atividades no Brasil, incluindo a negociação de criptomoedas, uma nova proposta surge agora com foco nos ativos digitais não declarados pelos usuários para a Receita Federal.
A proposta, apresentada pela deputada federal Júlia Zanatta (PL-SC), cria o Regime Especial de Regularização de Ativos Virtuais (RERAV), que permitirá aos brasileiros regularizar criptomoedas mantidas no Brasil ou no exterior mediante o pagamento de uma alíquota única de 5% sobre o valor de mercado dos ativos.
Segundo o Projeto de Lei 5.701/2025, o RERAV tem como objetivo corrigir distorções e oferecer segurança jurídica para quem detém criptomoedas fora da base fiscal. O programa pretende incentivar a regularização voluntária desses ativos, sem punição retroativa, mas garantindo que o Estado tenha controle sobre o patrimônio digital dos cidadãos.
O texto determina que devem ser declarados até mesmo as criptomoedas mantidas em carteiras de autocustódia. No entanto, as regras não valem para todos, e políticos eleitos, diretores públicos e familiares até o segundo grau, além de pessoas condenadas com trânsito em julgado, não poderão participar da iniciativa.
Como funcionará o imposto sobre criptomoedas
Os contribuintes que aderirem ao programa deverão pagar 5% de Imposto de Renda sobre o valor de mercado dos ativos na data da regularização. A base de cálculo será a cotação média das principais exchanges, tanto nacionais quanto internacionais, conforme o preço do dia da declaração.
Na prática, a medida cria um novo modelo de tributação para criptomoedas, semelhante aos programas de repatriação de recursos no exterior já aplicados no país em anos anteriores. Com isso, o governo busca trazer para o sistema formal parte das fortunas digitais que circulam sem controle fiscal.
Na justificativa do projeto, Júlia Zanatta destacou que a proposta não representa um perdão geral, mas um “instrumento de correção normativa e ajuste regulatório”. Segundo ela, o RERAV pretende reparar a defasagem entre a velocidade da inovação e a lentidão do Estado em acompanhar o avanço tecnológico.
A parlamentar também afirmou que a medida “não busca punir o passado, mas construir o futuro”. O modelo, segundo Zanatta, reconhece a importância de uma transição ordenada e definitiva para o retorno dos ativos virtuais ao sistema fiscal brasileiro, garantindo sigilo e presunção de licitude.
O PL 5701/2025 ainda precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado, e depois sancionado pelo Presidente da República. Somente após virar lei, a Receita Federal terá 90 dias para regulamentar o programa, definindo o modelo da DURAV e os procedimentos de adesão.
Enquanto isso, a Câmara já aprovou o PL 458/2021, que cria o REARP, um regime mais amplo de regularização patrimonial (também incluindo criptoativos), mas com custo bem maior: 15% de imposto + 100% de multa, totalizando 30% sobre o valor do ativo em 31/12/2024. Esse projeto ainda depende do Senado e da sanção presidencial.
Quem será impactado caso o projeto se torne lei?
De acordo com a contadora especialista em criptoativos, Ana Paulo Rabello, fundadora do portal Declarando Bitcoin, o programa é voltado exclusivamente à regularização e correção de informações, ou seja, o novo RERAV não prevê atualização de valores já declarados corretamente, pelo menos por enquanto, já que o texto ainda pode ser alterado durante a tramitação no Congresso.
Muitos investidores ainda têm dúvidas sobre como e em quais situações o RERAV se aplica. A principal delas é entender quem realmente pode se beneficiar do programa e em que casos ele faz sentido aderir”, disse.
De acordo com a contadora, investidores que possuem criptoativos em corretoras estrangeiras, como a Binance por exemplo, e nunca os declararam, estão dentro do público-alvo do programa.
Ela explica que nestes casos, o RERAV permite regularizar esses ativos, pagando 5% sobre o valor de mercado no momento da adesão. Esse pagamento extingue eventuais tributos e penalidades relacionados a ganhos passados, desde que os ativos tenham origem lícita e que o contribuinte cumpra todos os requisitos que ainda serão estabelecidos pela Receita Federal. Depois da adesão, esses ativos passam a estar totalmente regularizados perante o Fisco.
Quem sempre declarou corretamente seus criptoativos, informando saldos, ganhos, custódia e origem dos recursos, não precisa fazer nada. O RERAV, nessa versão, não é um programa de atualização patrimonial, mas de regularização. Ele não altera o valor de aquisição nem serve para ajustar preços de mercado, apenas corrige omissões e erros de declarações anteriores.
Ela também afirma que para quem declarou os criptoativos, mas nunca pagou o imposto devido sobre ganhos de capital, o alcance do RERAV ainda gera certa dúvida.
O artigo 3º do projeto estabelece que o pagamento de 5% extingue o crédito tributário sobre fatos geradores ocorridos até a data da adesão, o que pode incluir lucros realizados que deveriam ter sido tributados, mas não foram. No entanto, o texto não deixa totalmente claro se essa hipótese abrange também os casos em que o contribuinte já declarou os ativos, mas omitiu apenas os ganhos. Assim, por enquanto, essa interpretação permanece nebulosa e depende da regulamentação que será editada pela Receita Federal.
Nunca vendi meu Bitcoin, ainda tenho que pagar?
Rabello explica que os holders, ou seja, os investidores que não vendem suas criptomoedas não devem se preocupar, pois quem nunca vendeu e apenas mantém os criptoativos em hold, sem realizar operações de alienação, não tem imposto devido, já que o simples fato de manter o ativo não gera ganho de capital.
Ainda assim, nesse caso de hold, se esses criptoativos nunca foram declarados, o contribuinte está em situação irregular e precisa regularizar a posse. O RERAV pode ser utilizado para isso, garantindo a presunção de licitude e o sigilo fiscal sobre o patrimônio mediante o pagamento dos 5% previstos. Entretanto, como nesse contexto não existe lucro a ser tributado, geralmente não vale a pena aderir a esse tipo de programa, sendo mais indicado retificar as declarações anteriores e incluir os saldos normalmente, sem necessidade de pagar imposto, desde que o investidor realmente nunca tenha vendido, trocado ou realizado qualquer alienação, tendo apenas efetuado compras.
Segundo Rabello, em todos os casos, o programa oferece um caminho para zerar pendências com a Receita Federal, inclusive sobre lucros não tributados, desde que os ativos sejam de origem lícita e que a adesão seja feita dentro das regras que ainda serão definidas pela futura regulamentação.
É importante destacar que, para quem mantém criptoativos não declarados, a regularização é obrigatória, já que a omissão pode caracterizar ocultação de bens ou até mesmo sonegação fiscal, quando houver ganhos não informados. Ainda assim, essa regularização não precisa ser feita necessariamente por meio do RERAV, o contribuinte deve avaliar qual alternativa é mais vantajosa, considerando custos e riscos envolvidos.