O aumento do preço de produtos e serviços para o consumidor final é a consequência visível da inflação, mas a lógica e as engrenagens do sistema que promove a desvalorização das moedas fiduciárias, minando o poder de compra dos cidadãos, são ocultadas pela política monetária dos bancos centrais.
Um relatório publicado pela exchange de criptomoedas Bipa detalha os efeitos dessa dinâmica sobre o valor do real e do dólar nos últimos anos, revelando por que o Bitcoin (BTC), uma moeda digital de suprimento limitado com uma política monetária previsível, está consolidado como um ativo de proteção e preservação de patrimônio.
O relatório assinado por Caio Leta, head de Conteúdo da Bipa, aponta que o M2 Brasil — um indicador-chave da quantidade de dinheiro em circulação na economia — registrou um crescimento de 6.700% desde 1995, ano de início do Plano Real, e como essa expansão monetária impacta diretamente a desvalorização da moeda brasileira e a diluição do poder de compra da população.
O M2 é um indicador utilizado para medir a quantidade de dinheiro em circulação – a liquidez – dentro de uma economia em um determinado período. É composto por três componentes principais: as cédulas e moedas em circulação (o dinheiro físico), os depósitos à vista (os saldos em conta-corrente que podem ser usados a qualquer momento) e os investimentos em poupança e outras aplicações de fácil resgate e liquidação.
Bancos centrais e a “impressão de dinheiro”
O relatório destaca que a expansão da base monetária — por meio de cortes nas taxas de juros, compras de títulos públicos ou impressão de moeda — é uma prática comum nas políticas monetárias de bancos centrais ao redor do mundo, especialmente em momentos de crise e retração da atividade econômica.
Em economias desenvolvidas, os bancos centrais utilizam esses instrumentos de política monetária para controlar a liquidez e, em última instância, a inflação. Contudo, em países emergentes como o Brasil, que dependem de estímulos governamentais para sustentar a atividade econômica, a condução da política monetária é diferente.
É o caso do Banco Central brasileiro, que “mesmo em períodos de relativa normalidade, continua expandindo sua base monetária de forma praticamente constante", segundo o relatório.
Em comum, países emergentes possuem menor credibilidade fiscal e capacidade limitada de captar recursos a juros baixos. “Imprimir dinheiro é o caminho mais rápido e fácil, mesmo se isso gerar inflação depois", diz o relatório.
Consequentemente, esses países contraem dívidas superiores à arrecadação. Para lidar com esses déficits e pagar as contas, o recurso mais comum é tomar "empréstimos invisíveis" sob a forma de emissão de moeda.
Diferentemente de moedas fortes como o dólar e o euro, que são utilizadas como reservas de valor global, há pouca demanda externa pelo real. Isso explica a depreciação contínua do real em relação ao dólar, segundo o relatório:
“É simples: quanto mais uma moeda é inflada, menor é o seu poder de compra frente a moedas mais estáveis. Por isso, ao longo dos anos, o real perdeu valor de forma sistemática frente ao dólar, o que deve seguir acontecendo enquanto essa lógica de expansão desenfreada persistir.”
A análise do comportamento do M2 no Brasil revela uma trajetória de expansão consistente e significativa. Desde o início do Plano Real, em 1995, a base monetária brasileira, medida pelo M2, registrou um crescimento superior a 6.700%.
O relatório destaca que, ao longo das últimas décadas, essa expansão monetária tem sido uma ferramenta recorrente não só da política monetária como também da política econômica do país, independentemente do governante ou do partido no poder:
"O que fica evidente é que, independentemente de quem está no poder, a expansão monetária é uma ferramenta usada repetidamente para contornar crises. Esse padrão foi observado em diferentes períodos políticos, atravessando os governos de Fernando Henrique Cardoso [PSDB], os mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva [PT], os governos de Dilma Rousseff [PT], Michel Temer [MDB] e Jair Bolsonaro [PL], incluindo a crise financeira de 2008 e a pandemia de COVID-19, além do atual ciclo.”
Bitcoin: via de fuga das moedas fiduciárias para preservação de patrimônio
A expansão monetária se converte em inflação quando "a quantidade de bens e serviços não aumenta na mesma proporção," resultando na diluição do valor de cada unidade de moeda e no aumento dos preços. “Tudo fica mais caro, porque cada real, dólar ou peso compra menos coisas do que antes."
Essa lógica é ainda mais perversa porque a expansão monetária não afeta a todos da mesma forma, aponta o relatório:
“Quem tem acesso a bons ativos ou sabe investir, geralmente consegue se proteger. Mas a grande maioria da população não tem essa alternativa: o salário fica para trás, enquanto o custo de vida dispara.”
Investimentos populares entre os brasileiros, como a poupança, cujo rendimento é inferior à taxa de inflação, resultam em perdas patrimoniais e diminuição do poder de compra no longo prazo.
Com sua política monetária estável e previsível e um suprimento limitado a 21 milhões, o Bitcoin se consolidou como um instrumento de “proteção contra a diluição monetária, uma espécie de ‘cofre digital’ que nenhum governo pode arrombar para imprimir mais notas,” conclui o relatório.
Dados de uma pesquisa conduzida pela especialista em macroeconomia Lyn Alden revelam que a valorização do Bitcoin está diretamente relacionada à expansão da liquidez global por meio da base monetária M2, conforme noticiado pelo Cointelegraph Brasil.
“Ao analisar os dados disponíveis entre maio de 2013 e julho de 2024, fica clara a forte sensibilidade do Bitcoin à liquidez global," afirma Alden. "Durante esse período, o preço do Bitcoin apresentou uma correlação de 0,94 com o M2, refletindo uma correlação positiva muito forte."