Dados on-chain revelam que há pouca disposição das entidades do mercado para se desfazerem de seus Bitcoins a preços que varia entre US$ 16.000 e US$ 18.000, faixa em que a maior criptomoeda do mercado foi negociada na maior parte do tempo desde o colapso da FTX.

Tal comportamento explica por que a falência da exchange de Sam Bankman-Fried não teve um impacto significativo sobre o preço do Bitcoin (BTC) no mercado à vista e também que muito provavelmente o fundo do atual ciclo de baixa foi consolidado nos US$ 15.500 registrados em 21 de novembro.

A opinião acima é de Felipe Vella, analista de valores mobiliários e criptomoedas da Ativa Investimentos e foi compartilhada durante uma entrevista exclusiva para o Cointelegraph Brasil

Perspectivas para o Bitcoin

Há poucos vendedores dispostos a negociar seus Bitcoins na faixa de preço atual. "Essa é uma métrica muito interessante, que geralmente indica a formação de um fundo. Quando o mercado está desesperado, os investidores aceitam vender seus ativos a qualquer preço", mas este não é o caso agora, afirma:

"Em todos os bear markets a gente vê um movimento de acumulação do que a gente chama de baleias: esses grandes investidores que já possuem muito Bitcoin aproveitam para acumular mais Bitcoins nestes momentos de baixa. Esse é um movimento análogo ao do mercado tradicional, pois o investidor institucional costuma comprar barato e vender caro. Enquanto o investidor do varejo costuma comprar caro e vender barato. Não é diferente no mercado de criptoativos. Isso aconteceu em 2018 e 2019, e está acontecendo agora de novo. A gente vê muitas carteiras de baleias acumulando Bitcoins perto de US$ 16.500-US$ 17.000 e uma diminuição do volume de vendas. Esse é um sinal positivo, pois historicamente indica o início de novos ciclos de alta."

No entanto, pondera Vella, a reversão de um mercado de baixa para um novo ciclo de alta do mercado não é algo automático ou instantâneo. Em geral, trata-se de um movimento discernível sob uma perspectiva temporal mais expandida, e que se segue após um longo período de marasmo e lateralização que pode durar um ano ou mais, afirma:

"Isso não quer dizer que o Bitcoin vai entrar num novo super ciclo de alta e que em breve vai voltar a testar regiões acima de US$ 30.000 ou US$ 40.000. Não, isso só quer dizer que possivelmente a gente vai conseguir acumular muito Bitcoin dentro dessa região entre US$ 15.000 e US$ 18.000. Talvez por um longo período de tempo antes que, aí sim, a gente possa destravar um novo cenário de alta."

As condições atuais do mercado são ainda mais desafiadoras no ciclo de baixa de 2022 para que se possa apostar em uma recuperação no curto e médio prazos, diz o analista. O cenário macroeconômico desfavorável, com aperto monetário e inflação em alta, é inédito na história do Bitcoin, destaca Vella:

"A principal diferença desse bear market é o cenário macroeconômico. Durante o bear market de 2018 e 2019, a política monetária ainda apresentava uma dinâmica muito mais expansionista. Muitos países com taxas de juros próximas de zero, com dinheiro barato no mercado em uma conjuntura bastante favorável para fomentar os mercados dos ativos de risco. Dessa vez, o cenário é um pouco diferente. Por mais que a gente esteja chegando em um fim de ciclo aqui no Brasil e nos EUA o Fed esteja começando a tirar um pouco o pé do acelerador, a gente vê os bancos centrais do mundo todo em um movimento muito mais contracionista."

Para o analista, o mercado de criptomoedas está enfrentando a sua "maior prova de fogo":

"Nessas circunstâncias, o mercado trabalha com menos apetite para o risco. Por isso, eu acho que essa vai ser uma nova prova de fogo para os criptoativos. A primeira prova de fogo dizia respeito aos casos de uso, que é algo que ainda não está totalmente resolvido. Essa é uma prova de fogo maior ainda. Se os criptoativos conseguirem sobreviver a este ciclo de juros em alta pelo mundo afora, aí sim essa classe de ativos terá, enfim, tudo para se tornar algo capaz de sobreviver à prova do tempo."

Vella prevê um longo período de lateralização no preço do Bitcoin até que as condições internas do próprio mercado de criptomoedas, após uma série reveses e do recrudescimento do cerco regulatório, em conjunção com o cenário macroeconômico possam desencadear um novo ciclo de alta:

"Quando a gente finalizar o ciclo de alta de juros global ou até mesmo iniciar um novo ciclo expansionista, aí sim a gente teria mais espaço para ativos de renda variável crescerem. Aí os criptoativos podem brilhar mais uma vez."

Para alguns traders, períodos assim podem ser considerados entediantes, enquanto para outras entidades, especialmente os investidores institucionais, são entendidos como oportunidades únicas de acumulação:

"O melhor momento para comprar um ativo é no inverno cripto. Essa é uma dinâmica que tem se repetido nos últimos ciclos do Bitcoin. Ele se mantém consolidado e explode em um determinado momento, multiplicando algumas vezes o patrimônio dos investidores. E esse é o ponto. Possivelmente, a gente esteja vivendo essa consolidação de fundo e este é o melhor momento para investir no Bitcoin. Não adianta a gente querer se posicionar no ativo depois que ele cresceu mais de 200%, 300%."

Tempo de construir e acumular

Seguindo o clássico mandamento do mercado de criptomoedas que diz que ciclos de baixa oferecem o melhor momento para construir novos serviços e soluções, a Ativa acaba de lançar a sua própria plataforma de negociação de criptomoedas, a Needo.

Seguindo uma tendência que tem se mostrado comum no mercado brasileiro, vide os casos do Nubank, da XP Investimentos e do BTG Pactual, o objetivo da Ativa é permitir que os clientes possam concentrar seus investimentos em uma única plataforma. 

No lançamento, a Needo oferece aos clientes da Ativa opções de investimento em Bitcoin, Ether (ETH), Solana (SOL), Avalanche (AVAX) e as stablecoins USDT e USDC.

Inicialmente voltada para os clientes da gestora, a plataforma quer estimular a compreensão dos riscos e oportunidades que o mercado de criptomoedas oferecem aos investidores através de iniciativas educacionais, uma vez que os clientes da gestora têm um perfil mais conservador, diz Vella:

"O timing de mercado para o lançamento da Needo é muito interessante porque a gente sabe que o bear market é um momento de consolidação. Os investidores deveriam usar o bear market para estudar e entender a dinâmica daqueles ativos em si e inclusive acumular patrimônio."

A meta da corretora é que até o final de 2023 pelo menos 40% de uma base de clientes que atualmente soma 117.000 usuários ativos utilizem a Needo investir em criptomoedas.

Em um primeiro momento, os usuários da Needo não terão a opção de fazer a autocustódia de seus criptoativos. A custódia dos ativos negociados através da plataforma da Ativa ficará a cargo de empresas parceiras cujos nomes não foram divulgados. No entanto, o lançamento de um serviço de carteira não custodial está sendo avaliado pela corretora e poderá ser anunciado no futuro.

Tal opção condiz com o perfil menos arrojado dos clientes da Ativa. Embora soluções de autocustódia estejam em alta após a falência da FTX, Vella aponta que o marco regulatório das criptomoedas recém aprovado na Câmara dos Deputados chega para oferecer maior segurança aos investidores.

Regulação

Nesse sentido, a recente aprovação do marco regulatório das criptomoedas no Congresso é um fator adicional positivo a ser explorado pela Ativa Investimentos através da Needo, afirma Vella.

O fato de o colapso retumbante da FTX ter praticamente coincidido com o lançamento do novo serviço da Ativa Investimentos não é visto como algo necessariamente ruim pelo analista. Segundo Vella, a regulação tal qual foi aprovada no Brasil oferece garantias que podem contribuir para atrair novos investidores para o espaço, uma vez que as empresas terão que se submeter às leis do sistema financeiro nacional e à fiscalização dos órgãos competentes:

"A Regulação é interessante porque, por exemplo, previne que casos como o da FTX aconteçam. Aqui no Brasil há um ambiente regulatório muito saudável, no qual os reguladores atuam em parceria com as empresas locais. Instituições como o Banco Central e a B3 trabalham próximos dos players. Além disso, esse é um mercado que já existe no Brasil. Talvez ainda seja incipiente, mas claramente tem demanda, e por isso carece de regulação. A gente encara a regulação com bons olhos, acredita que vai fomentar o mercado local e até dar mais tranquilidade aos investidores."

Vella cita o perfil dos investidores brasileiros para reforçar a importância da regulação: 

"O investidor brasileiro é mais conservador, sendo que a maior parte dos brasileiros nem investe e aqueles que investem, a maior parte ainda está na poupança. Então, imagina se esses brasileiros se sentiriam confortáveis em investir em ativos que sequer são regulados. Então, a gente visualiza uma grande destrava de mercado com a regulação em si."

Assista a íntegra da entrevista com Felipe Vella no canal do Cointelegraph Brasil no Youtube.

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