Durante o Rio Innovation Week, a greentech BMV Global esteve presente para apresentar a Mumbuca Verde, plataforma focada na negociação de ativos de conservação ambiental. Ao Cointelegraph Brasil, representantes da greentech contaram como a iniciativa utiliza blockchain para garantir segurança e rastreabilidade, e como a preservação florestal pode fazer parte do portfólio dos investidores.

Blockchain resolve dores reais

Maria Tereza Umbelino Souza, presidente da BMV Global, conta que todo o ativo digital chamado de Mumbuca surgiu a partir de uma dor real, que é a conservação ambiental. 

“Nós precisávamos criar uma solução para remunerar quem tinha cuidado com o meio ambiente. A floresta em pé tem 27 serviços ecossistêmicos, então precisamos identificar quanto vale essa floresta preservada. Medimos tudo isso com metodologias consolidadas, usando modelos de valuation criados por professores da UCLA [Universidade da Califórnia em Los Angeles], para entender o valor desse espaço”, conta.

Todo o procedimento de aferição resultou em 115 diferentes documentos, envolvendo a validação do que foi avaliado. Em 2017, enquanto buscava soluções para propagar essas informações de forma segura, Maria Tereza conta que se deparou com a tecnologia blockchain. 

“Isso gerou uma hash que poderia ser facilmente transacionada de forma segura. E a solução encontrada foi tão segura que se tornou uma commodity. É como se as informações fossem uma carga de soja, mas guardada dentro de um armazém eletrônico”, acrescenta a presidente da BMV Global.

Nasce, então, a Unidade de Crédito de Sustentabilidade (UCS): um ativo digital baseado na preservação, de fato, de zonas florestais. Seu valor está atrelado aos 27 serviços ecossistêmicos mencionados por Maria Tereza, com cada UCS representando uma tonelada de carbono.

O desafio, porém, era apresentar o ativo digital para investidores como um veículo de investimento, e não como uma boa ação, salienta a presidente da BMV Global. 

“Nós não queríamos que grandes empresas comprassem o ativo como um indulto para o céu e esquecessem dele, queríamos que elas incorporassem o ativo como investimento”, explica Maria Tereza.

Apesar das semelhanças com créditos de carbono tokenizados, a UCS não se confunde com esses ativos, destaca Alessandra Umbelino Brandão, executiva de operações da BMV. Através do Mumbuca, o detentor do ativo está fomentando a agricultura de conservação em uma área real, em parceria com quem está na terra.

“Existe a materialidade do investimento. O crédito é do produtor rural, é de quem tá na terra, o dinheiro vai direto para a carteira dele após a compra do ativo”, explica Maria Tereza.

Quanto à recepção de novos conceitos pelos produtores rurais, como carteiras e ativos digitais, Alessandra garante que “foi a coisa mais fácil do mundo”. “Nós não criamos um problema para oferecer uma solução, nós oferecemos uma solução para uma dor que já existia”, completa a executiva de operações da BMV.

Ativo negociado na B3

Em 1º de outubro de 2021, foi publicado o Decreto nº 10.828/21, que trata da emissão das Cédulas de Produto Rural (CPR) Verde. Uma CPR é um título que representa uma promessa de entrega futura de um produto agropecuário, agindo como uma forma de antecipar o crédito rural e facilitar a produção no agro.

No caso da CPR Verde, há a permissão para captação de recursos que serão direcionados ao financiamento da conservação de florestas nativas e seus biomas. A redução de emissão de gases do efeito estufa, a conservação da biodiversidade e a manutenção ou aumento do estoque de carbono florestal são alguns exemplos de atividades de conservação.

A sinergia entre a CPR Verde e o trabalho organizado pela BMV Global na forma de Unidade de Crédito de Sustentabilidade é nítida, e culminou em um fato histórico: em 31 de março de 2022, a primeira Cédula de Produto Rural Verde foi registrada na B3, a bolsa de valores brasileira. 

Para esse título, a UCS foi utilizada como estrutura, servindo como um ativo subjacente à CPR Verde. As Cédulas de Produto Rural Verde negociadas na B3, portanto, guardam características tanto do mercado financeiro tradicional quanto da economia digital.

Além disso, Alessandra avalia que há espaço para uma possível tokenização das CPR Verdes. “A CPR Verde é utilizada como garantia, ela é utilizada para o financiamento de empresas. Pela primeira vez na história, a floresta está sendo lastro para a expansão econômica”, acrescenta.

Surgimento da Mumbuca Verde

Entre os dias 3 e 6 de outubro, foi realizado na capital do Rio de Janeiro o evento Rio Innovation Week, focado em abordar movimentos de inovação feitos em diferentes setores. Durante o evento, foi anunciada a Mumbuca Verde, uma plataforma criada para negociação de ativos verdes.

A iniciativa é uma parceria entre a BMV Global e a Companhia de Desenvolvimento de Maricá (Codemar). A cidade, situada no estado do Rio de Janeiro e com pouco mais de 197 mil, se tornou uma área de conservação que dá lastro a UCS. 

Através da Mumbuca Verde, será possível negociar as Unidades de Crédito de Sustentabilidade geradas em Maricá, envolvendo toda a população na transformação ecológica conduzida na cidade.

Preservação como insumo

No dia 1º de outubro, o Carbon Border Adjustment Mechanism entrou oficialmente em seu período de transição na União Europeia (UE). Trata-se de uma tarifa cobrada sobre produtos exportados para a região com alta emissão de carbono, com o objetivo de reduzir as emissões nos países que desejam negociar com a UE.

Inicialmente, poucos produtos serão afetados, mas a tendência é o aumento gradual dos bens importados pela UE sujeitos à tarifa.

Esse é um dos exemplos onde a utilidade da UCS se torna clara, aponta Alessandra Umbelino Brandão. “Já existe solução brasileira que traz rastreabilidade e preserva a biodiversidade, trazendo equilíbrio entre países em desenvolvimento e países desenvolvidos, que já destruíram suas florestas”, diz Alessandra.

Não se trata, contudo, de onerar empresas com a compra de UCS. A conservação ambiental, primeiramente, é a preservação de recursos dos quais muitas empresas dependem para produzir, destaca Maria Tereza Umbelino Souza.

Além disso, dada a crescente preocupação ao redor do mundo com a preservação ambiental, ativos como a UCS serão interpretados como insumo para produção, diz Alessandra. 

“É um insumo que a empresa utiliza para agregar valor ao seu produto ou serviço, e esse valor é repassado na cadeia produtiva. Não é custo, é um investimento que pode abrir portas e gerar novas fontes de receita”, conclui a executiva de operações da BMV. 

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