A ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) apresentou na sexta-feira, 24 de outubro, o Projeto Piloto de Tokenização, uma iniciativa para testar o uso da tecnologia blockchain na emissão, negociação e gestão de ativos digitais no mercado de capitais brasileiro.

O projeto tem o objetivo de produzir experiências práticas sobre governança, padronização, interoperabilidade e regulação do mercado de tokenização de ativos reais (RWA), visando o desenvolvimento de uma nova infraestrutura financeira, como destacou o presidente da Anbima, Carlos André, durante o evento de anúncio oficial do projeto:

“O ‘Projeto Piloto de Tokenização’ é um passo importante no nosso entendimento rumo ao futuro do mercado de capitais brasileiro e que confirma e atesta que a inovação faz parte do DNA da ANBIMA também.”

Tokenização no Brasil: o desafio da fragmentação e a busca por interoperabilidade

Segundo a Anbima, trata-se do primeiro projeto integrado de tokenização do mercado de capitais brasileiro. Embora a tokenização de ativos reais esteja se desenvolvendo em diversas frentes por meio de iniciativas de empresas privadas, o modelo atual resulta em um ecossistema fragmentado, com limitações de liquidez e conformidade regulatória.

A ausência de padrões comuns restringe a interoperabilidade entre diferentes plataformas e o pleno desenvolvimento do mercado, afirmou Eric Altafim, diretor da ANBIMA:

“A forma como estavam sendo feitos esses processos de tokenização, o modelo de negócio, a tecnologia utilizada, estavam muito divergentes entre si. Quando a gente olha para um mercado organizado, imagina que as coisas podem se complicar."

Altafim destacou a autoridade da ANBIMA para conduzir esse processo por ser uma entidade neutra e com ampla representatividade no mercado de capitais brasileiro:

“Quando eu converso com meus pares em bancos no exterior, a conclusão é de que dificilmente esses avanços acontecem sem ter um agente que atue de uma forma agnóstica para acelerar o desenvolvimento desse mercado. Esse é o papel da ANBIMA.”

Objetivos Estratégicos e Escopo Técnico do piloto

Os objetivos estratégicos do piloto delineados pela ANBIMA são:

  • Testar a viabilidade técnica e operacional da tokenização, demonstrando na prática que a emissão e negociação de ativos digitais pode operar de forma segura, eficiente e compatível com o ambiente regulado.

  • Definir um modelo de governança e interoperabilidade que permita a comunicação fluida entre as diferentes instituições participantes de uma rede setorial.

  • Estabelecer padrões técnicos e normas para a emissão e transação de ativos, criando um framework comum para todo o mercado brasileiro.

  • Gerar clareza sobre os papéis e responsabilidades dos diversos agentes de mercado no novo ecossistema tokenizado, entendendo como as funções atuais se adaptam à nova tecnologia.

  • Gerar conhecimento e diretrizes que sirvam de base para futuros projetos, discussões regulatórias e políticas públicas de tokenização.

O piloto vai testar a tokenização “ponta a ponta” de debêntures e fundos de investimento. Tecnicamente, os testes ocorrerão em uma rede DLT privada e permissionada, onde será simulado o ciclo completo de um ativo financeiro tokenizado.

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Ciclo de vida de um ativo tokenizado. Fonte: ANBIMA

Altafim enfatizou que o piloto pretende testar iniciativas 100% on-chain, indo além da mera transposição de ativos do mercado tradicional para o ambiente descentralizado da blockchain:

“A ideia não é substituir participantes que existem hoje no mercado tradicional, mas testar o advento da tecnologia. Nós não vamos pegar uma debênture no mundo tradicional e tokenizar essa debênture como um espelho. Vamos fazer um piloto com uma operação fictícia de uma debênture tokenizada para avaliar quais são os ganhos que ela tem.”

Governança, Parceiros e cronograma de execução

Para garantir a eficiência do piloto e seu alinhamento com os interesses de todo o setor, a estrutura de governança incorpora, além da própria ANBIMA, entidades públicas e privadas em um modelo colaborativo.

O Grupo de Trabalho é aberto a especialistas do mercado que acompanharão a execução do projeto e estabelecerão diretrizes práticas. As decisões serão tomadas pelo Comitê Técnico e de Negócios, formado por associados com reconhecida experiência em tokenização, que consolidará os aprendizados e definirá as diretrizes.

Para garantir o alinhamento institucional com os órgãos reguladores, o Comitê de Acompanhamento estará em contato com o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários, que foram convidados a participar do piloto como observadores.

A execução do projeto contará com diversos parceiros estratégicos: a Fenasbac oferecerá suporte à execução e consultoria em inovação; a RTM, uma empresa da B3, será responsável pela infraestrutura tecnológica; a BBChain desenvolverá e integrará as soluções para os testes; e a IPMF Global proverá consultoria em governança de dados e padrões internacionais.

O projeto será conduzido em três grandes fases, ao longo de 2025 e 2026. Conforme o cronograma, até fevereiro do ano que vem, empresas e entidades do setor poderão apresentar propostas de casos de uso a serem testados.

A fase de testes propriamente dita se estenderá até setembro de 2026. Os resultados serão consolidados em um relatório final previsto para ser divulgado até o final do mesmo ano.

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Cronograma do Projeto Piloto de Tokenização. Fonte: ANBIMA

Em paralelo, a ANBIMA lançará a Jornada de Tokenização, uma frente educacional aberta a todo o mercado que começará no primeiro trimestre de 2026, com o objetivo de disseminar o conhecimento gerado e atrair novos profissionais para o mercado.

Conforme noticiado recentemente pelo Cointelegraph Brasil, o mercado de tokenização de ativos reais no Brasilmovimenta cerca de US$ 1 bilhão.