O Ministério Público Federal (MPF) divulgou nesta semana uma recomendação para que sejam suspensas todas as operações, os contratos e as tratativas em andamento no tema crédito de carbono e no modelo de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD+), que incidem nos territórios indígenas e tradicionais, com ou sem regularização fundiária definitiva, no estado do Amazonas.
A iniciativa do MPF também atinge vários projetos de Tokens RWA no Brasil que estão vinculados a projetos no estado do Amazonas.
A recomendação foi enviada ao governador do estado; ao secretário de estado de Meio Ambiente do Amazonas e às demais secretarias estaduais; aos prefeitos e secretários municipais das prefeituras; aos representantes das empresas, das instituições, das organizações não-governamentais, das certificadoras; e a todos os atores públicos ou privados que atuam no mercado de crédito de carbono/REDD+.
O documento recomenda que a comercialização de créditos carbono, no Brasil ou no exterior, seja ela na forma de tokens ou não, seja suspensa imediatamente.
Tal informação deve ser encaminhada para todos os atores envolvidos nas tratativas e negociações em andamento, já iniciadas ou finalizadas – desde comunitários, lideranças, empresas e instituições nacionais ou internacionais –, para ciência e adoção das medidas recomendadas.
A recomendação solicita ainda que seja dada ampla publicidade ao documento em todas as mídias sociais, páginas da internet e grupos de aplicativos pertencentes aos referidos órgãos e empresas ou nos quais participam.
MPF 'cai' em cima de empresas que oferecem crédito de carbono
Condições - As tratativas, os contratos e a comercialização devem ser suspensos enquanto todos os requisitos definidos na recomendação não forem cumpridos:
- Comprovação de eficácia concreta da redução dos impactos climáticos via compensação de créditos carbono/REDD+, por meio de estudos científicos idôneos e internacionalmente reconhecidos;
- Demonstração de não violação dos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais no estado do Amazonas, bem como de seus territórios tradicionais, decorrentes das tratativas e da aplicação de tais projetos;
- Realização de consulta prévia, livre, informada e de boa-fé com os povos indígenas e comunidades tradicionais potencialmente afetados pelos projetos, nos termos da Convenção 169 da OIT;
- Regulamentação do tema, com respeito aos três itens acima, de modo gerar segurança jurídica, aos povos e garantir a aplicação adequada dos princípios da prevenção e precaução;
"O não atendimento das providências apontadas resultará em responsabilização dos destinatários e dirigentes recomendados, por sua conduta comissiva ou omissiva, sujeitando-os às consequentes medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis', disse o MPF.
Em junho, o MPF realizou evento on-line para discutir o tema com lideranças de povos indígenas e comunidades tradicionais, órgãos públicos, pesquisadores e especialistas do Brasil e de outros países. O webinário estimulou discussões sobre o impacto do modelo REDD+ em comunidades indígenas e tradicionais no Brasil e no mundo, os riscos e problemas jurídicos envolvidos, além da sua eficácia no combate à crise climática mundial.
Em nota divulgada em abril deste ano, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) manifestou preocupações e dúvidas acerca do potencial lesivo dos contratos de crédito de carbono ao patrimônio e direitos indígenas garantidos pela Constituição, bem como sobre a qualidade e lisura dos processos de consulta realizados junto às comunidades indígenas interessadas, além da falta de amadurecimento do arcabouço normativo nacional sobre o tema.
A Funai também recomendou que os povos indígenas não participem de tratativas nem celebrem contratos em seus territórios. O assunto também foi analisado em nota técnica do MPF e do Ministério Público do Pará, que, no ano passado, já apontava riscos de conflitos relacionados à falta de consulta prévia e à repartição desigual de benefícios.
No Amazonas, o MPF possui inquéritos civis em andamento que apuram temas de crédito carbono sobre territórios indígenas/tradicionais. Em contato com várias lideranças tradicionais das unidades de conservação estaduais, que são territórios tradicionais destes povos, foi informado ao MPF que não houve consulta ou contato, que eles não conhecem a proposta e nem mesmo o modelo de funcionamento de contratos de crédito carbono ou REDD+ trazidos pela Secretaria de Meio Ambiente do Amazonas Sema).
Confira o documento na íntegra