A Transfero Swiss é uma daquelas empresas que tem levado o Brasil para o mundo, fazendo com que os projetos brasileiros tenham visibilidade no cenário internacional das criptomoedas. 

Dedicada ao gerenciamento, custódia e tokenização de ativos digitais, a empresa acaba de receber um aporte de R$ 40 milhões, de publicar a primeira auditoria das reservas de sua stablecoin em reais, a BRZ e de se unir a outras empresas internacionais para criar a Stablecoin Alliance

É com muito prazer que conduzo essa entrevista com o CEO da Transfero Swiss AG, Thiago César e o CFO da empresa, Carlos Russo. 

Rafaela: A Transfero Swiss acabou de receber um aporte de R$ 40 milhões, em meio a um cenário econômico mundial complexo. O que você espera do mercado cripto nos próximos 5 anos? 

Thiago César: É justamente por estarmos num contexto econômico mais complexo que o cenário crypto se encontra mais fortalecido. Os ativos tradicionais têm sido impactados pela insegurança política mundial, seja nos EUA, com as eleições, ou na Rússia, com uma eventual saída do presidente Vladimir Putin. Em meio a essas incertezas, o fato de os ativos digitais serem tradicionalmente não correlacionados, ou seja, se comportarem de maneira inversa a problemas e instabilidades globais, atrai a atenção dos investidores, como um hedge natural a essas incertezas. Nesse cenário, é natural que a Transfero tenha sido escolhida pela Alameda Ventures para um aporte dessa magnitude, pois fomos a primeira empresa brasileira de ativos digitais a se internacionalizar de forma consistente.

Além disso, o aporte representa um olhar da Alameda/FTX para o mercado brasileiro e, de forma mais ampla, para a América Latina, que tem casos de uso evidente de ativos digitais devido às questões ligadas ao controle de capitais e inflação, principalmente.  

Assim, a operação permitirá tanto que a Transfero expanda suas operações na região, em países como a Argentina e Uruguai, nas áreas de pagamento, stablecoins e gestão de ativos, quanto proporciona o acesso da FTX a esses países, dada a nossa experiência com o mercado local. É um ganha-ganha que vai aumentar as possibilidade de troca de dinheiro estatal por ativos digitais.

 

Rafaela: Apesar de ser uma empresa fundada por brasileiros, a Transfero Swiss tem sede na Suíça. Quais as dificuldades do empreendimento cripto no Brasil e qual a perspectiva de vocês para o mercado nacional?

Carlos Russo: O ambiente no Brasil e na América do Sul em geral tem muitas incertezas porque não há uma regulação quanto a potenciais marcos regulatórios restritivos para o mercado de criptoativos. Nós seguimos as normas locais vigentes, como a Instrução Normativa 1.888 — que obriga as empresas a reportarem as operações à Receita Federal —, mantendo as boas práticas. Existe ainda uma incerteza de como tratar criptoativos contabilmente. Tudo isso só será resolvido quando houver um marco regulatório.

Por isso, empreendemos na Suíça, porque era, à época, o principal mercado regulado — hoje, já existem outros. E com isso, pudemos aprender as boas práticas e obter insights também para nosso negócio, bem como contribuir com a regulação aqui no Brasil. 

Com relação às perspectivas para o mercado nacional, vemos cada vez mais empresas utilizando criptomoedas como um meio de pagamentos. E o brasileiro, cada vez mais, investindo em bitcoin e em moedas alternativas também como parte de um portfólio de investimentos. Ocupamos o espaço que os players tradicionais não podem ocupar, justamente pela falta de regulação local. Nesse contexto, temos experimentado um volume crescente de negócios ano a ano, tanto no atacado (OTC) quanto no varejo. 

 

Rafaela: Há pouco tempo, vocês lançaram o primeiro relatório de auditoria das reservas da BRZ, a stablecoin pareada em reais emitida por vocês, atestando uma reserva de R$ 47 milhões, equivalentes à R$ 45 milhões de BRZ. Quais as vantagens em relação ao real, a BRZ apresenta? 

Carlos Russo: O BRZ tem como sua principal vantagem a inclusão de mais pessoas no ecossistema de investimentos crypto, bastando que o investidor tenha celular para isso. Com ele, as pessoas podem manter posições em reais internacionalmente, o que não era possível até a criação da stablecoin, já que a moeda, o Real, está no grupo conhecido como non deliverable forwards, ou seja, que não pode ser negociada nem mantida por nenhum player no exterior. 

Além disso, brasileiros podem usar plataformas internacionais, como a Uniswap e a própria FTX, e terem acesso aos sistemas de DeFi (Decentralized Finance) e a ativos que não teriam acesso no mercado tradicional. Entre as possibilidades estão a compra de tokens sintéticos de ações de grandes empresas de tecnologia e a obtenção de empréstimos e rendimentos usando o BRZ como colateral.  

 

Rafaela: O real tem passado por grande dificuldade, mas a BRZ foi recentemente listada na BTSE, uma das maiores exchanges de derivativos cripto e o token já movimentou mais de R$ 675 milhões em BRZ na FTX. Como o mercado internacional vê uma stablecoin pareada no real?

Carlos Russo: Os players internacionais veem o BRZ como uma oportunidade de conquistar e fidelizar clientes no mercado brasileiro, já que o real não tem liquidez internacional.

Grandes plataformas, como a BTSE, FTX e Bittrex, listaram BRZ e viram o número de brasileiros crescer exponencialmente. Por exemplo, na FTX o volume de reais negociado na plataforma, que era zero, hoje está em US$ 1 milhão por dia.

Tudo isso, somado à facilidade que o BRZ proporciona de mover recursos de uma exchange para outra, faz com que o investidor brasileiro tenha muito mais possibilidades de estacionar o seu real em diferentes plataformas internacionais. E esse modelo seria, sem dúvida, replicável em outros países sul-americanos

 

Rafaela: No final de outubro, a Stablecoin Alliance foi formada por representantes de cinco países. O Brasil está sendo representado pelo BRZ. Qual o objetivo de uma aliança entre stablecoins de diferentes países?

Thiago César: O BRZ é um dos idealizadores e fundadores da Stablecoin Alliance e o objetivo é tanto fomentar o uso das stablecoins, quanto promover o debate em conjunto sobre questões relacionadas às stablecoins, além de incentivar a adoção de boas práticas de compliance, transparência e segurança de forma compartilhada entre múltiplos projetos. Já estamos sendo, inclusive, procurados por outras stablecoins que querem ingressar na aliança.

 

Rafaela: A Transfero Swiss já é um ecossistema que oferece OTC, tokenização de ativos, fundos para pessoas físicas de alto patrimônio líquido (HNWI) e máquina PDV para comerciantes. Quais os próximos passos?

Thiago Cesar: A Transfero está focada principalmente nas áreas de stablecoins e pagamentos. Também atuamos, mas de forma separada, na gestão de investimentos. As máquinas de PDV foram uma solução que oferecemos no início da empresa, quando ainda éramos a Bit.One, mas esse projeto não é prioritário no momento. A ideia agora é expandir geograficamente as praças onde já atuamos. Neste momento não podemos revelar muitos detalhes, pois se tratam de informações estratégicas da companhia, mas nossos clientes e o mercado verão novos produtos e serviços da Transfero nos próximos anos.

 

Rafaela: Qual projeto cripto fora dos top 50 do coinmarketcap chama sua atenção? 

Carlos Russo: O Serum, que tem uma moeda de governança chamada SRM, é um projeto interessante porque replica um ambiente de exchange de forma totalmente descentralizada e, por isso, está imune a qualquer interferência regulatória e governamental. Além disso, ela roda na blockchain da Solana, com custo mais baixo que a Ethereum e capaz de transacionar milhares de operações por segundo e opera com derivativos. Se bem utilizada, é uma plataforma que permitirá diversas experimentações com tokens lastreados nos mais diversos ativos.

Thiago Cesar: Eu destaco o projeto da Parsiq, que recebeu um investimento da Binance recentemente. É uma tecnologia de monitoramento de fluxo e tráfego na blockchain, ainda inédita no nível de protocolo. Eles conseguem monitorar qualquer blockchain e perceber grandes movimentações, enviar push notifications, entre outras funcionalidades. Dentro do top 50, cito a blockchain Algorand, principalmente no que se refere à importância para as stablecoins.

 

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