Como CEO da Liqi, tenho observado atentamente os desafios enfrentados pela tokenização de ativos. Embora esse movimento tenha o potencial de revolucionar os mercados financeiros, ainda há obstáculos significativos a superar.
Recentemente, a Deloitte divulgou um relatório tratando do cenário atual da tokenização, suas vantagens e os principais desafios que devem ser superados, especialmente nos Estados Unidos
Decidi abordar os cinco desafios e discutir brevemente, como eles se aplicam ao contexto brasileiro, de que maneira estamos atuando sobre eles e em que pontos precisamos ir além.
Interoperabilidade e Mercado Secundário
Nosso primeiro desafio é a interoperabilidade e o desenvolvimento de um mercado secundário robusto para os tokens.
Até agora, as instituições têm operado em ambientes controlados, limitando-se a suas próprias plataformas.
No entanto, para desbloquear o potencial máximo, precisamos cultivar mercados secundários vibrantes. Isso requer padrões técnicos compartilhados para interoperabilidade.
Esse é um ponto que vejo como crucial há anos. Inclusive, no Encontro LIFT: Real Digital em 2022, cheguei a falar sobre como os tokens podem conversar entre si, mesmo sendo emitidos por empresas distintas, desde que estejam conectados à Blockchain onde foram emitidos.
No Brasil, estamos avançando nessa área com o Drex, que visa tornar os tokens negociáveis em diversas plataformas, permitindo que eles circulem livremente.
Isso é fundamental para impulsionar a liquidez e o crescimento do mercado de ativos tokenizados.
Regulamentação e Gerenciamento de Riscos
Outro desafio importante é a conformidade regulatória. Como o Relatório da Deloitte coloca: “Os riscos associados à conformidade regulamentar são provavelmente o maior obstáculo à adoção da tokenização de ativos por instituições financeiras regulamentadas”.
Atualmente, a conformidade regulatória na tokenização enfrenta desafios devido à complexidade causada pelo envolvimento de vários órgãos reguladores.
Muitas jurisdições ainda carecem de clareza regulatória, já que as regras para títulos tokenizados em bolsas de ativos e redes interbancárias ainda não foram estabelecidas.
Isso aumenta o risco regulatório para as instituições, que podem ter que trabalhar de forma fragmentada em diferentes casos de uso para atender às exigências regulatórias e demonstrar sua capacidade de implementar os controles necessários para proteger as transações e os usuários.
No entanto, o Brasil está progredindo nesse aspecto, com reguladores que estão ativamente se movimentando para compreender o mercado de ativos digitais e desenvolver, junto às empresas, novas regulações ou adaptar regulações antigas em prol da inovação do setor.
A Liqi, por exemplo, como diversas empresas, está trabalhando em estreita colaboração com os reguladores para garantir que as operações estejam alinhadas com as diretrizes emergentes.
Privacidade
Essa questão é crucial para o sucesso da tokenização já que os registros distribuídos (redes blockchain e DLTs) enfrentam um dilema entre transparência e privacidade.
Enquanto proporcionam transparência aos mercados financeiros, isso pode comprometer a privacidade dos usuários. Instituições que buscam a tokenização precisam fazer escolhas sobre quais informações compartilhar e como.
Garantir privacidade é essencial para incentivar a adoção de ativos tokenizados pelos investidores, que desejam proteger certas informações de partes interessadas, incluindo concorrentes.
No Brasil, o Banco Central está comprometido em encontrar um equilíbrio entre transparência e privacidade, especialmente com o Drex, desenvolvendo sistemas que protegem as informações dos usuários enquanto garantem a integridade e a segurança das transações.
Atualização de Sistemas Legados
A tokenização promete eficiência na negociação de ativos e redução de custos operacionais, mas a integração com sistemas legados é um desafio significativo.
As instituições financeiras enfrentam a complexidade de conectar tecnologias de livros-razão distribuídos com seus sistemas antigos enquanto constroem contratos inteligentes para automatizar processos.
Essa transição exigirá criatividade e uma estratégia de longo prazo, já que muitas organizações ainda estão anos distantes de abandonar seus sistemas legados em favor da tokenização completa.
Acredito que esse ainda seja um dos principais desafios do qual não estamos falando tanto no Brasil. Por um lado, temos o Drex que também proporcionará maneiras mais fáceis de integração. Por outro, exigirá uma atuação presente das diversas empresas envolvidas no setor.
Para dar o exemplo da Liqi mais uma vez, já começamos a explorar maneiras de modernizar nossos sistemas para facilitar a transição para a tokenização de ativos que está conectada em redes permissionadas e que mantém íntegros os contratos inteligentes das operações.
Impostos e Contabilidade
Por fim, a tokenização levanta questões complexas de contabilidade e tributação.
No Brasil, estamos trabalhando com especialistas em impostos e contabilidade para garantir que nossas operações estejam em conformidade com as regulamentações fiscais.
Acredito que reconhecemos a importância de abordar essas questões desde o início para evitar complicações futuras. Isso se dá, inclusive, por movimentação dos próprios órgãos reguladores, que não estão ficando para trás nestas inovações.
Em suma, embora os desafios sejam significativos, acreditamos que a tokenização tem o potencial de transformar os mercados financeiros.
Por isso, é cada vez mais importante que estejamos comprometidos no Brasil em superar esses obstáculos e construir um futuro mais inclusivo e eficiente para todos os participantes do mercado.
As informações contidas neste texto são de responsabilidade do autor e não necessariamente refletem as posições do Cointelegraph Brasil.