Apesar da recente decisão do Governo Federal de editar uma Medida Provisória criando um imposto para todas as operações com criptomoedas na qual o usuário obtiver lucro, a regulação dos criptoativos deixou de ser um entrave e passou a ser vista como um motor para a adoção institucional.

É essa a leitura de Caio Motta, Senior Solutions Architect da Chainalysis, empresa referência mundial em análise de blockchain e prevenção de fraudes. Em entrevista exclusiva ao Cointelegraph Brasil, Motta destacou o papel do Brasil no cenário global, elogiou os avanços regulatórios recentes e alertou para os desafios com o uso de inteligência artificial em crimes financeiros.

Segundo o executivo, as mudanças promovidas por entidades como OCC, FDIC e o Fed nos EUA mostram que os bancos tradicionais estão mais próximos do setor cripto. No Brasil, ele vê com otimismo o caminho adotado pelo Banco Central e pelo Congresso.

“As consultas públicas e a comunicação com o mercado criam um ambiente regulatório que fomenta o desenvolvimento da indústria”, afirmou.

Motta observa que a integração entre o sistema financeiro tradicional e o mundo cripto tem impulsionado a busca por soluções de compliance, prevenção à lavagem de dinheiro (PLD) e proteção contra fraudes.

“Instituições querem garantir segurança para os clientes e suas operações. A Chainalysis apoia esse desenvolvimento com programas robustos de gestão de risco”, explica.

Essa demanda crescente é impulsionada por empresas que oferecem produtos cripto e desejam cumprir exigências regulatórias. O executivo reforça que esse movimento legitima o setor e ajuda a atrair grandes players.

A evolução da inteligência artificial, embora promissora, também representa uma ameaça crescente. A Chainalysis estima que 85% dos golpes em plataformas centralizadas envolvem contas verificadas, muitas vezes manipuladas com ajuda de IA. Para responder a isso, a empresa tem investido em soluções como o Chainalysis Alterya, que identifica padrões suspeitos e atua antes que os criminosos façam vítimas.

Confira a entrevista completa

Regulamentação

Cointelegraph Brasil (CTBR): Em 2025, observamos mudanças significativas na abordagem regulatória global. Como a Chainalysis avalia o impacto dessas transformações no ecossistema cripto? E como o Brasil está posicionado neste cenário?

Caio Motta (CM): Nós da Chainalysis avaliamos o impacto das mudanças na abordagem regulatória como algo positivo. A adoção institucional, que é fundamental para uma futura adoção em massa, depende de clareza regulatória.

Nos EUA recentemente, a OCC, FDIC e o FED publicaram algumas mudanças regulatórias que facilitam significativamente o acesso de bancos americanos ao mercado cripto e isso sem dúvida deve impulsionar a indústria.

Em relação ao Brasil, acredito que as consultas públicas e a comunicação direta com o mercado estimulam a criação de um ambiente regulatório que fomenta o desenvolvimento da indústria e isso posiciona o Brasil em destaque.

Evidentemente, ainda existem alguns pontos em discussão que precisam ser bem analisados como o papel das stablecoins, mas temos confiança que todas as discussões regulatórias no Brasil seguirão contando com a participação da indústria.

CTBR: Temos visto cada vez mais uma convergência entre criptomoedas e o mercado tradicional. Como isso impacta os negócios da Chainalysis? Empresas tradicionais vêm procurando vocês para obter serviços de compliance para cripto?

CM: Na minha visão, a adoção institucional das criptomoedas impacta toda a indústria de maneira positiva e isso não é diferente para a Chainalysis.

O mercado financeiro tradicional que busca oferecer produtos cripto para seus clientes possui uma grande preocupação em relação ao estabelecimento de políticas de PLD e prevenção a fraude e nós da Chainalysis apoiamos esse desenvolvimento garantindo que essas instituições possuam desenvolver programas de risco robustos e consigam proteger seus clientes e sua organização.

Inteligência Artificial

CTBR: Como a Chainalysis acredita que a IA pode ajudar a moldar um mundo onde será mais difícil distinguir o que é real e como isso pode impulsionar golpes com cripto, já que cripto permite uma movimentação de dinheiro 'sem fronteiras'?

CM: A utilização de IA nos crimes cibernéticos já é uma realidade. De acordo com estudos realizados pela Chainalysis, cerca de 85% dos golpes que ocorrem em plataformas centralizadas, envolvem contas verificadas o que  demonstra como a IA já está conseguindo burlar mecanismos de verificação.

Diante dessa nova realidade, a Chainalysis segue buscando inovar no aprimoramento de processos de detecção de fraude inclusive utilizando o Chainalysis Alterya que utiliza tecnologia de IA para identificar golpistas antes que eles encontrem suas vítimas.

CTBR: Como o Lazurus Group consegue converter cripto em fiat para financiar as atividades na Coreia do Norte?

CM: O grupo Lazarus é uma organização que executa ataques cibernéticos extremamente sofisticados. Essa elevada sofisticação também se aplica a utilização de diferentes métodos para lavar criptomoedas e eventualmente convertê-los em fiat. O grupo Lazarus utiliza principalmente mixers, bridges para cross-chain swaps e exchanges descentralizadas para tentar dificultar o rastreio.

A ausência de um marco regulatório global também permite que marketplaces como o Huione Pay sejam utilizadas para facilitar a lavagem de dinheiro e um outro ponto também é que o vácuo regulatório em algumas regiões faz com que algumas plataformas simplesmente se recusem a colaborar com autoridades policiais.

Papel do Brasil

CTBR: Qual é a visão da Chainalysis sobre o papel do Brasil no ecossistema cripto latino-americano e global?

CM: A Chainalysis enxerga o Brasil como um dos líderes globais da cripto economia. O Brasil ocupa a 10 posição no relatório de adoção cripto de 2024 e há alguns anos, vem se posicionando como um dos mercados mais maduros tanto em termos regulatórios quanto em adoção institucional.

CTBR: Qual é a posição da Chainalysis sobre iniciativas que buscam equilibrar segurança e privacidade no ambiente digital? Podemos confiar em uma empresa ou em carteiras digitais como MetaMask para compartilhar nossos dados?

CM: A Chainalysis reconhece a importância da privacidade no ecossistema de criptomoedas, equilibrando a transparência com a necessidade de proteger os dados dos usuários.

Existem diversas discussões sobre privacidade em todo o mundo e uma opção viável bastante mencionada vem sendo a zero knowledge proof que é um método criptográfico que permite que várias partes verifiquem a veracidade de uma declaração sem revelar informações além da própria declaração.

CTBR: Quais são as expectativas da Chainalysis para o mercado de criptomoedas nos próximos anos, considerando os avanços tecnológicos e as mudanças regulatórias?

CM: As melhores possíveis. Sem dúvidas existem diversos desafios do ponto de vista de segurança e prevenção às fraudes devido a evolução da IA, mas quando avaliamos a tendencia de crescimento do mercado impulsionado por uma adoção institucional e desenvolvimento regulatório, não há como pensar diferente.