A Convex é uma empresa de análise financeira especializada em mercados voláteis e estratégias para exposição aos mercados globais, de criptomoedas a commodities. Para entender sobre estratégias antifrágeis e análise de criptomoedas na construção de portfólios robustos, conversamos com o Richard Rytenband, CEO da Convex e uma das pessoas mais influentes do mercado de criptomoedas.
Rafaela Romano: A capitalização total do mercado de criptomoedas acabou de atingir os US$ 1 trilhão. E apesar da queda recente, o Bitcoin tem tido um desempenho excelente nos últimos meses. O que você espera para 2021?
Richard Rytenband: O ano de 2020 foi o ano da entrada forte dos institucionais e do encerramento dos estágios iniciais do atual grande mercado de alta do Bitcoin que está em curso.
Neste ano, entramos em uma etapa intermediária do grande ciclo, com um mercado mais maduro e ainda com grande potencial de valorização. Com o amadurecimento do mercado, a aprovação do tão“sonhado” ETF de Bitcoin, parece uma mera questão de tempo.
Rafaela Romano: A Convex cobre diversos mercados, então gostaria de saber, qual a grande inovação e benefício que as criptomoedas trouxeram aos investidores para você?
Richard Rytenband: Ao longo de 2019, uma das nossas bandeiras foi justamente defender que todo investidor deveria ter uma parte do portfólio exposta ao Bitcoin.
Uma parte do racional disso era a etapa do ciclo da economia global na época, o chamado “late stage”, momento em que após um longo período de expansão, a economia começa a desacelerar e entrar em transição para um processo recessivo (esses sinais já estavam presentes antes da pandemia, que somente agravou e muito a situação).
E nesta etapa é recomendado alocar parte do portfólio no que chamamos de “gaveta de reserva de valor”, ativos com essas características e que não podem ser deflacionados e performam bem em cenários de incertezas.
A alternativa clássica é o Ouro, reserva de valor que já se provou no tempo e naquele momento tínhamos uma outra alternativa com essas características, o Bitcoin, o Ouro digital.
É importante destacar que uma reserva de valor tem características específicas: escassez, pode ser armazenada e transportada e tem outra aplicação, além do papel de reserva de valor.
A outra parte do racional era justamente a dinâmica dos fundamentos do próprio ecossistema das criptomoedas, com destaque para o Bitcoin, que em 2020 passaria por um processo que o tornaria ainda mais escasso, o chamado halving.
Em resumo, o Bitcoin passa a atuar como alternativa de reserva de valor e o portfólio de criptomoedas se tornou uma “gaveta” fixa, dentro do nosso portfólio global, agregando ainda mais equilíbrio e consistência à nossa performance. Os investidores que ignoraram esse ciclo de alta das criptomoedas além do retorno desperdiçado, ainda perderam uma alternativa importante para lidar com o próprio risco Brasil.
Rafaela Romano: A volatilidade das criptomoedas é vista por algumas pessoas como um empecilho ao desenvolvimento do mercado e uso do ativo como reserva de valor. Como um especialista de mercados voláteis analisa esse argumento?
Richard Rytenband: É realmente verdadeira a afirmação que as criptomoedas são a classe de ativos mais volátil do planeta, mas precisamos entender o funcionamento das camadas do ecossistema e o que está em curso no momento. O ecossistema é dividido basicamente em duas camadas, a primeira, em que se encontra isoladamente o Bitcoin, a gênese de tudo e a segunda camada, a dos experimentos, em que se encontram as altcoins.
O Bitcoin tem uma vantagem natural de longo prazo pela sua posição no ecossistema, ele se dá o luxo de apenas observar os frutos dos erros e acertos da camada de experimentos, e de forma lenta e conservadora, incorpora esse aprendizado ao seu protocolo.
Já a segunda camada, a de experimentos, muita coisa dará errado (e muitas altcoins vão sumir do mapa) e outras darão certo.
O ponto é que com o amadurecimento do mercado, o papel do Bitcoin em relação ao seu ecossistema e mesmo em relação a outras classes de ativos ficou muito similar ao do Ouro.
E se analisarmos sua volatilidade ao longo dos últimos anos, veremos uma queda consistente e que acredito que no próximo halving deverá se aproximar e se consolidar de forma similar à do Ouro. Agora, em relação a volatilidade da segunda camada, das altcoins, esta tende a continuar elevada, já que estamos lidando com experimentos e muitos sujeitos ao risco de ruína.
Rafaela Romano: Tendo a teoria da antifragilidade e da convexidade de Nassim Taleb um papel fundamental na filosofia econômica da Convex, você pode explicar como a incerteza pode ajudar o mercado de criptomoedas? Principalmente em um cenário complexo como o da pandemia?
Richard Rytenband: O ecossistema das criptomoedas se aproxima muito do funcionamento de um sistema natural, com o funcionamento de suas camadas e partes mais frágeis que se “sacrificam” para obter conhecimento que torne o todo melhor, mais aprimorado. O que é frágil não pode atuar desta forma, já que a desordem, a volatilidade, incerteza ou qualquer membro da família da desordem podem em algum momento levar a ruína ou um dano severo.
No arranjo com traços de antifragilidade, ataques e erros são bem-vindos, já que pela estrutura, eles não são capazes de causar a ruína ou um dano mais severo.
A estrutura além de sobreviver, obtém conhecimento através desta interação com o ambiente que a tornará ainda melhor, mais forte e evoluída.
Portanto, cenários de incerteza e desordem são mais do que benéficos para o Bitcoin e o ecossistema das criptomoedas. Um exemplo foi a própria pandemia atual, ou antes, governos tentando coibir as criptomoedas, ou ataques à periferia da rede, como problemas com hackers em exchanges. Quando pensar no Bitcoin, saiba que o caos e a desordem jogam a seu favor e não contra.
Rafaela Romano: Você desenvolveu uma estratégia de diversificação baseada na análise da fragilidade das criptomoedas com uso da inteligência artificial Hydra e ela tem tido uma performance histórica excelente. Você pode contar um pouco sobre como o seu sistema funciona?
Richard Rytenband: Antes de explicar o funcionamento do modelo é importante entendermos alguns conceitos que regem o mundo (incluindo os investimentos).
No mundo real temos duas classes de distribuição de probabilidade de eventos, uma que os eventos são comportados e próximos à média (mediocristão) e outra em que as pequenas probabilidades são associadas a grandes eventos (extremistão) e a amostra é sempre insuficiente para determinarmos até mesmo sua média.
Enquanto no domínio do mediocristão, o dano vem do efeito coletivo de muitos eventos, sendo que nenhum evento sozinho pode ser forte o suficiente para afetar o agregado, nas distribuições do extremistão, o dano vem de grandes eventos isolados, sendo justamente o caso das criptomoedas, em que variações diárias significativas fazem parte da rotina. No domínio do extremistão, as propriedades estatísticas não estão na amostra, mas fora dela, portanto é incompatível com uma inferência estatística rigorosa utilizar séries temporais para previsões, já que o passado é altamente insuficiente.
Diante deste dilema, resta atuar da mesma forma como a natureza, ou seja, analisando o estado atual do sistema, através de modelos de fragilidade.
Já que matematicamente não temos como computar corretamente riscos, mas a fragilidade sim.
O modelo de fragilidade é a ferramenta adequada para lidar com o extremistão já que não depende de séries históricas. Para mensurar a fragilidade e se preparar para eventos raros e aleatórios não precisamos saber o histórico, mas sim conhecer o estado atual do sistema, isto é o seu nível atual de fragilidade.
O Crypto Fragility Model (CFM)® é gerenciado pela nossa inteligência artificial Hydra que coleta milhares de informações relevantes ao ecossistema da criptomoeda, tais como volume, hash rate, custo de transação, spread entre exchanges, número de carteiras ativas, transações não confirmadas, google trends entre outras centenas de inputs e calcula em tempo real o nível de fragilidade. A fragilidade pode ser definida como uma sensibilidade acelerada a choques, já o seu antônimo não é o robusto, mas o Antifrágil, algo que se beneficia com o choque e não apenas resiste a ele.
Quando o nível de fragilidade é elevado, a situação é de concavidade, isto é uma pequena piora no ecossistema produzirá uma grande repercussão negativa nos preços, da mesma forma que o inverso é verdadeiro, um nível de fragilidade negativa (antifragilidade) produzirá uma situação de convexidade, em que uma pequena melhora no ecossistema, produzirá um aumento significativo nos preços.
Os níveis de fragilidade são calculados em diferentes escalas de tempo: médio prazo, curto prazo e curtíssimo prazo. E a partir disso, o modelo já calcula com a exposição deve ser feita com base naqueles sinais, fornecendo quais criptomoedas e qual percentual meta devemos alocar especificamente.
E conforme os sinais dos níveis de fragilidade vão se alterando, as exposições e percentuais meta também vão, de forma a mantermos sempre uma exposição convexa nos mercados.
Rafaela Romano: Países com grandes problemas inflacionários, como o Brasil, têm tido um ponto de refúgio no mercado Bitcoin. Como tem sido o desenvolvimento do mercado brasileiro em termos de tecnologia? Quais são os grandes gargalos do mercado na sua opinião?
Richard Rytenband: O Brasil tem um potencial incrível, muitas pessoas capacitadas, mas o nosso ambiente de negócios ainda é muito hostil e infelizmente temos visto uma fuga de cérebros e empresas nos últimos anos, principalmente as relacionadas a criptomoedas. O país para avançar em tecnologia precisa melhorar o ambiente de negócios como um todo, desde a parte de burocracias, segurança jurídica, tributação, enfim tudo que vá na direção de ao menos não atrapalhar a ação do empreendedor e pelo contrário, servir como estímulo já que inovações tecnológicas exigem um ambiente em que se possa testar, errar e tentar novamente.
Rafaela Romano: Qual projeto cripto fora dos top 50 do coinmarketcap mais chama sua atenção?
Richard Rytenband: Para uma nova criptomoeda fazer parte das recomendações do CFM ela passa por uma série de filtros específicos, no momento já estamos analisando algumas opções que devem entrar para essa galeria de opções, mas ainda não posso adiantar, já que esse processo (testes e análises) ainda levará algum tempo.
Rafaela Romano: Para terminar, qual será o preço do Bitcoin em janeiro de 2022?
Richard Rytenband: O lema da Convex é sempre sermos humildes perante a incerteza e reconhecermos as limitações humanas em relação a previsões. Basta ver os erros grosseiros cometidos ao longo dos anos em relação a isso.
O que eu posso dizer é que enquanto o Bitcoin permanecer convexo, manteremos a exposição.
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