No domingo (17), a casa de análises Nansen publicou seu relatório com previsões sobre o mercado de criptomoedas para 2024. As previsões envolvem quatro cenários de “alta convicção” que, como o nome sugere, são casos que a equipe de analistas acredita que têm alta probabilidade de acontecer no ano que vem.

Além dos quatro cenários, o relatório também inclui uma rápida análise de cenários macroeconômicos que podem se desenrolar no próximo ano. O primeiro cenário macro envolve a estabilização da economia estadunidense, com um corte de 0,75% na taxa básica de juros. Isso pode causar uma valorização de 20% a 50% no Bitcoin (BTC) no ano que vem, usando como base a cotação de US$ 42 mil.

Existe, contudo, a possibilidade de uma reaceleração da inflação no ano que vem. Não é o cenário esperado pelos analistas, mas há uma chance de 10% a 20% de que ele se concretize. Esse é considerado o pior cenário pela Nansen, que pode causar uma queda de 10% a 60% no preço do BTC a partir da cotação de US$ 42 mil.

O cenário de recessão, terceiro possível rumo da economia estadunidense para 2024 aos olhos da Nansen, tem chance de 20% a 40% de acontecer. Nesse cenário, o BTC pode estagnar na zona dos US$ 42 mil, ou mostrar um eventual crescimento de 20%.

Por fim, o cenário de ‘hard landing’ é caracterizado por um agravamento da situação econômica dos Estados Unidos. Embora a estimativa dos analistas da Nansen é que esse cenário tenha apenas 10% de se materializar, ele traz uma desvalorização de 60% ao Bitcoin em 2024.

Inteligência artificial e cripto

Partindo para os prováveis cenários dentro do mercado de criptomoedas, a primeira narrativa com grande probabilidade de vir à tona no ano que vem é a interseção entre inteligência artificial (IA) e criptomoedas.

A tecnologia IA, na visão da Nansen, pode melhorar a performance e os casos de uso da blockchain. Partindo da aplicação em bots determinísticos, os agentes de IA podem ajudar a processar informações e negociar valores entre usuários. 

“Conseguimos ver um futuro onde agentes de IA se tornam uma categoria primária para os usuários de blockchain”, dizem os analistas da Nansen.

Na via oposta, a tecnologia blockchain também pode aprimorar funcionalidades em IA. Um exemplo mencionado no relatório é o modelo de identificação através de criptografia, que será “crucial para distinguir humanos de IA”.

Esse processo de autenticação pode utilizar assinaturas digitais criptografadas, IPFS, e Árvores de Merkle. Uma das limitações, porém, é a possibilidade de agentes de inteligência artificial serem treinados o suficiente para burlar tecnologias como provas de conhecimento zero (zk proofs, no termo em inglês).

A junção entre blockchain e IA pode gerar outro catalisador em 2024: recompensas baseadas em tokens. Para que modelos baseados em IA funcionem de forma autônoma, é necessário utilizar incentivos com tokens.

“Na parte cripto nativa, é provável que tokens e projetos como Bittensor (TAO), Autonolas (OLAS) e outros projetos associados com IA continuem em destaque. A forte performance de tokens ligados a projetos de IA durante o ciclo de baixa (desde o início de 2023) mostrou que há crença e impulso suficientes nas interações iniciais entre IA e blockchain”, apontam os analistas. Outros exemplos mencionados no relatório são FET e AGIX.

Além disso, a Nansen antecipa uma mudança nas aplicações que utilizam IA e blockchain, com um foco maior em consumidores. O desafio, destacam os analistas, não está apenas na infraestrutura, mas na identificação dos beneficiários e usuários finais das aplicações.

Melhorias na experiência do usuário

O segundo possível cenário para 2024, apontado no relatório da Nansen, é a melhoria da experiência do usuário (UX, na sigla em inglês) dentro do mercado de criptomoedas. Os analistas dão ênfase nos conceitos de account abstraction e intents.

Os intents são formas de automatizar a interação com aplicações criadas sobre blockchain, onde o usuário insere apenas o resultado esperado, sem precisar se envolver no processo.

Players como Anoma e Flashbots são citados no relatório como agentes por trás de inovações capazes de levar o recurso de intents a propósitos gerais. A Nansen salienta, contudo, que isso não deve ser possível no curto prazo.

Já o modelo de account abstraction permite que usuários deleguem suas ações a contratos inteligentes, mas sem perder a custódia de seus ativos. O ERC-4337 é apontado como padrão para realizar transações iniciadas por ‘contas inteligentes’, e essas transações “catalisarão a evolução da infraestrutura das carteiras”.

Em 2024, na área de account abstraction, o foco será em criar suporte nativo para esses recursos, a fim de habilitar casos de uso específicos, destacam os analistas.

Ano das DEX

A Nansen acredita que 2024 será o ano das exchanges descentralizadas (DEX). As negociações descentralizadas de contratos perpétuos mostraram uma boa rececepção pelo mercado de criptomoedas, com designs inovadores surgindo ao longo de 2023, diz o relatório.

Com um modelo lucrativo e amplo espaço para inovações, a Nansen acredita que as exchanges descentralizadas para negociação de contratos perpétuos podem crescer ainda mais em 2024.

Como fatores que podem impulsionar esse cenário, o relatório aponta que: um mercado mais ativo pode impulsionar os volumes; a liquidez seguirá os incentivos; incentivos monetários dos protocolos continuarão a crescer através de recompensas e sistemas de pontos; e escalabilidade, UX e taxas ficarão melhores.

Além disso, a Nansen aponta como catalisadores por trás do crescimento das DEX em 2024:

  • DEX podem oferecer mercados para uma variedade maior de ativos, que possuem nichos específicos e baixa liquidez;
  • DEX podem expandir, de forma simples, para outras classes de ativos, como derivativos de ações, FX, commodities e mercados de previsão;
  • Os designs estão em expansão, e podem oferecer funcionalidades únicas,;
  • Melhor captura de valor; 
  • Tokens de DEX de contratos perpétuos refletem mais o valor da demanda por um token;
  • Distribuição de renda pode ser compartilhada com provedores de liquidez e detentores do token nativo de uma DEX.

A partir desses catalisadores e dos fatores anteriormente mencionados, a Nansen prevê dois cenários envolvendo as DEX para 2024 e 2025. O primeiro consiste na perda de participação no mercado de exchanges para Binance e outras grandes exchanges. Enquanto isso, exchanges com um grau maior de regulamentação, como a Coinbase, continuarão ganhando espaço.

O segundo cenário é um crescimento em participação no mercado de derivativos de criptomoedas para as DEX. Atualmente, as movimentações em plataformas descentralizadas representam entre 2% e 10% do total negociado. A expectativa da Nansen é que esse volume varie entre 10% a 20% entre o final de 2024 e o início de 2025.

Bitcoin como camada base

O surgimento das Inscrições, que permitem a inclusão de dados diretamente na blockchain do Bitcoin, passou a viabilizar o uso da rede por trás da maior criptomoeda em valor de mercado como uma ‘camada de dados’. Projetos como a New Bitcoin City, que desenvolve aplicações e registra as movimentações no Bitcoin, são um exemplo dessa nova tendência.

Para a Nansen, esse setor pode guardar os projetos que mais valorizarão durante o próximo ciclo de alta. A atenção recebida pelo Bitcoin através das discussões sobre a aprovação do primeiro ETF ligado ao preço à vista do BTC não fortalece apenas a segurança em torno do criptoativo.

Na visão dos analistas, a continuidade tecnológica e atividade da rede também são destacadas. “Embora seja a primeira e maior criptomoeda, a blockchain do BTC nunca parou, nunca recebeu um ataque bem-sucedido de 51% ou foi desligada. Combinada com seguidores que parecem religiosos e sua liderança em valor de mercado, tudo isso torna o Bitcoin o criptoativo mais seguro para muitos”, destaca a Nansen.

O relatório, então, indaga sobre a possibilidade de utilizar a segurança e confiança na rede para propósitos além de “guardar BTC” e realizar transações. “Acreditamos que o Bitcoin está em uma ótima posição para se tornar um dos componentes primários do futuro da infraestrutura das finanças.”

A ideia de construir em cima do Bitcoin, entretanto, não é nova. Lightning Network, Liquid, Stacks e Rootstock são exemplos mencionados pela Nansen que falharam em ganhar tração. Na avaliação dos analistas, o fracasso está ligado a uma experiência do usuário pouco atrativa e a herança das limitações de escalabilidade do Bitcoin.

“Além disso, algumas partes da comunidade do Bitcoin levantaram preocupações sobre o uso do Bitcoin para outras atividades além de transações, uma vez que isso pode causar problemas de centralização, congestionamento da rede ou pedir mais atualizações do que o necessário, o que pode, inevitavelmente, introduzir riscos adicionais”, descrevem os analistas.

Mesmo assim, os Ordinals surgiram e ganharam tração, possibilitando a criação de NFTs e tokens fungíveis, como os BRC-20, aponta a Nansen. Embora não guardem tanta utilidade quanto as versões do Ethereum, os US$ 84 bilhões em volume negociado de tokens BRC-20 apontam que há “fome” por uma infraestrutura criada sobre o Bitcoin.

“E os esforços inovadores para aplacar essa fome e expandir a ideia são evidentes, e os projetos de infraestrutura para BRC-20 como TRAC ou MUBI são exemplos, com performances excepcionalmente boas nas últimas semanas.”

Além do surgimento dos Ordinals, a Nansen apontam que o surgimento de mais soluções de segunda camada sobre o Bitcoin são interessantes, incluindo até mesmo estruturas modulares. 

“A resposta para esta questão parece ainda estar aberta para debate, mas utilizar a maior e mais confiável criptomoeda para assegurar outros casos de uso do que transações simples parece inevitável para nós, no médio e longo prazo. Então, fique de olho em qualquer coisa relacionada ao Bitcoin além do próprio BTC, provavelmente valerá o seu tempo em 2024”, conclui o relatório.