A história acontece muito lentamente e, de repente, toda de uma vez. Em momentos como o atual, as coisas evoluem tão rapidamente que ideias que passaram anos (ou décadas) sendo discutidas com pouca ou nenhuma evolução são adotadas com um senso de urgência que só existe nas grandes crises.

Uma pandemia global é a enxurrada que faz transbordar a crise de um modelo econômico claramente insustentável e que vem ruindo há pelo menos 12 anos. A crise parece ser o tempo que chegou para ideias que pareciam distantes há algumas semanas.

Por um lado somos confrontados com conceitos que nunca fizeram lá muito sentido, mas estão no cerne do modo como operamos por décadas como o valor intrínseco do dólar, por outro, temos que lidar imediatamente com elucubrações que pareciam reservadas para um futuro distante como o que fazer quando não existirem mais empregos.  

Dinheiro é só uma coisa que se imprime, e o governo não tem a chave da impressora.

A resposta padrão de governos ao redor do mundo à crise econômica causada pelo Covid-19 tem vindo na forma de pacotes trilionários de sustentação da economia durante a pandemia.

Não é preciso muita imaginação para prever que teremos pacotes trilionários de estímulo quando a vida voltar ao normal já que milhões de negócios terão quebrados ou estarão em vias de. E isso nem é novidade, a política de "Quantitative Easing" começou na crise de 2008 e não parou mais. 

Mas agora é diferente, o problema tem sido fazer essa ajuda ter impacto na vida real. No Brasil, mais de 60% dos pedidos de crédito de pequenas e médias empresas foi negado por bancos que distribuem as linhas de crédito disponibilizadas pelo BNDES ou se beneficiam da liberação de compulsório do Banco Central.

Obviamente está muito mais arriscado emprestar para empresas no Brasil, isso tende a elevar as exigências para concessão de crédito e aumentar os juros, a falta de crédito e os juros mais altos reduzem as chances de uma empresa sobreviver à crise tornando a profecia dos analistas de risco auto-realizável. 

Renda básica universal e outros caminhos para a abundância

Considerando essa ineficiência de se reativar a economia pelos meios tradicionais, o único jeito de recuperar uma demanda devastada é jogar dinheiro de helicóptero, numa metáfora bastante real para o que está acontecendo nesse momento no Brasil, por exemplo.

Grande parte dos países está analisando algum tipo de renda básica a ser distribuída para a população afetada pela paralisação da economia na quarentena.

Não é preciso muito esforço para imaginar que qualquer governante vai ter bastante dificuldade de extinguir esse tipo de programa, principalmente considerando que a emergência econômica tende a durar muito mais tempo do que políticos gostariam de admitir, inclusive com as potenciais mudanças no padrão de consumo.

A alternativa é o caos social causado por milhões de pessoas sem dinheiro para comida nos principais centros urbanos do mundo, e todas as formas de revolta que isso pode trazer. Podemos estar assistindo ao começo de uma nova era de relações econômicas.

Cadê o emprego que estava aqui? 

Neste momento, qualquer CEO está pensando em como aproveitar a crise de duas formas, criando modelos de negócios que aproveitem essa nova realidade para gerar receita, e em como enxugar custos ao máximo para ter fôlego suficiente para atravessar o que deve ser a crise mais profunda de nossas vidas.

Não é como se todos os empregos que serão dizimados nessa crise fossem necessários em primeiro lugar. Essa crise tem a característica de acelerar a adoção de ferramentas de tecnologia que substituem o contato humano.

Streaming, apps de entrega e comércio eletrônico devem ser alguns dos grandes vencedores, enquanto turismo, entretenimento ao vivo e shoppings tem grandes chances de serem os principais perdedores.  

A Revolução Industrial, e a maior parte da mecanização até os anos 2000 transformava empregos. O tear elétrico aumentou em 40 vezes a produtividade de um trabalhador, mas existia demanda para muito mais do que 40 vezes a produção de tecido da época, e um operador continuava sendo necessário.

Com a Inteligência Artificial o que acontece é que deixa de fazer sentido falar de produtividade uma vez que nenhuma pessoa é necessária para operar uma "fábrica escura", cada vez mais comum mundo afora já que robôs não precisam de luz.

A revolução atual empurrou os empregos para os setores de comércio e serviços, no Brasil são 75% do PIB, na China 46%, em ambos os países é o maior setor da economia.

A quarentena acerta em cheio esses empregos, que serão substituídos por opções muito mais escaláveis usando tecnologia. Isso vai afetar bancos, supermercados, restaurantes, lojas em geral, bares, cinemas, teatro, turismo e muitos outros, acelerando a substituição de empregos por apps. Temos formas de lidar com essa realidade.

Uma delas é com a Renda Básica Universal, mas definitivamente vamos desenvolver um novo tipo de relação econômica e social com o trabalho, começando pela realidade do trabalho remoto, mas passando para novas formas de ocupação que sequer imaginamos hoje em dia, com cada vez mais trabalho em rede e empreendedorismo. 

O Bitcoin está morto, viva o Bitcoin!

Mais uma vez o Bitcoin passou por uma experiência de quase morte perdendo 50% do valor em dólar em algumas horas. Isso aconteceu no mesmo dia que o mercado derreteu 14% no Brasil.

A diferença é que o bitcoin ameaça a todo momento recuperar o valor pré crise, já subiu 60% da baixa, e ensaia ser um ativo de boa diversificação em momentos de crise. O risco é grande mas aparentemente bastante assimétrico, principalmente considerando a quantidade de impressão de dinheiro que vem por ai.

Criptomoedas, especialmente as de escassez definida como é o caso do Bitcoin tendem a se beneficiar do entendimento de que dólar e outras moedas fiduciárias valem tanto quanto a credibilidade cada vez menor das instituições que as emitem.