*Por Christian Gazzetta e Thiago Moreira
Nos últimos meses, as finanças descentralizadas (DeFi) ganharam destaque no mercado cripto. O nicho começou a florescer no chamado DeFi Summer, no meio de 2020, quando os protocolos DeFi atingiram escala suficiente para demonstrar seu potencial na mitigação dos problemas de liquidez, eficiência e segurança do ecossistema.
Nesse contexto, a plataforma Ethereum esbarrou em limitações de escalabilidade para suportar o crescimento explosivo do setor. Com a rede congestionada, a taxa média por transação passou da ordem de centavos de dólar, até o segundo trimestre de 2020, para atingir um pico de mais de US$68 em meados de maio de 2021.
Para superar tais limitações, os usuários e os protocolos DeFi encontraram duas saídas: plataformas sobre a infraestrutura do Ethereum, como Polygon; ou redes mais escaláveis, como Binance Smart Chain (BSC) e Solana - ambas com vantagem de custo e latência, se diferenciando, respectivamente, pela descentralização e pela já grande base de usuários.
Na rede Solana, alguns protocolos DeFi mais beneficiados por essa tendência foram Raydium, Serum, Saber e SolFarm (dados do DeFiLlama).
O que é Serum
Serum é um Central Limit Order Book (CLOB), mecanismo de mercado semelhante ao das bolsas tradicionais: os usuários postam ordens de compra e venda, aos preços desejados, e esperam contrapartes interessadas para assumir a outra ponta da transação.
Apesar de esse ser o esquema mais comum no mundo das finanças, sua aplicação em cripto era muito restrita pelas limitações técnicas que a rede Ethereum impõe à liquidez desses mercados. Mas, aproveitando a escalabilidade da rede Solana e funcionando como base para diversas soluções financeiras, o protocolo Serum já foi adotado por interfaces de negociação como Bonfida e Raydium.
Para incentivar a compra dos tokens da plataforma como investimento de longo prazo, os detentores de SRM têm desconto de até 60% nas taxas de transação da plataforma; além disso, os stakers recebem aproximadamente 10% das taxas pagas; os outros 68% são destruídos para gerar escassez.
Inflação
As políticas acima são formas de gerar valor para os hodlers de SRM, mas esses incentivos podem não ser suficientes para compensar eventuais pressões vendedoras com a distribuição dos tokens: com apenas 0,5% da oferta total (50M Serum) circulando até o fim de julho, a rede começou a liberar os tokens no último dia 11 de agosto.
Segundo o site, os tokens seriam distribuídos de forma linear pelos próximos 6 anos, ou seja, liberados à mesma quantidade todos os dias até agosto de 2027.
Contudo, ainda no fim de 2020, a comunidade começou a demonstrar insatisfação com o ritmo de distribuição: liberando aproximadamente 4 milhões de tokens por dia, a rede teria inflação diária de 9,1% nos primeiros dias após 11 de agosto.
A equipe, então, reforçou seu compromisso de longo prazo com o projeto, divulgando a decisão de travar todos os tokens do time em um pool a ser governado coletivamente pelos integrantes - assim, nenhum poderá vender seus SRM sem o consentimento dos demais, o que provavelmente irá evitar grandes liquidações.
Essa medida ajuda a controlar eventuais pressões vendedoras pela própria equipe, é verdade, mas ainda é preciso contar que a maior parte dos tokens de parceiros, colaboradores e investidores seja mantida fora do mercado por tempo suficiente para que o preço não colapse ante vendas massivas de SRM.
Mesmo nesse caso, seria preocupante a grande concentração dos tokens e, portanto, da governança da rede, nas mãos desses grupos: caso a equipe não venda nenhum SRM, ao fim de seis anos, apenas o fundo do time constituiria 2 bilhões de tokens, ou 40 vezes o circulating supply.
Isso sem contar o mecanismo de concentração das taxas: além de remunerar diretamente os stakers, a cada transação, os usuários destroem parte da oferta circulante - aumentando a participação dos outros hodlers.
Conclusão
Uma análise de fundamentos do projeto aponta as grandes vantagens técnicas, além da excelência do time, dos parceiros e conselheiros. No entanto, um olhar criterioso sobre o modelo econômico da plataforma encontra riscos que, mal administrados, podem levar ao colapso do token e do ecossistema.
Para demonstrar uma boa postura frente à distribuição dos tokens, é de se esperar que a equipe e os investidores usem seus tokens para: investimentos diretos na rede e seu ecossistema (comprando tokens de interfaces construídas sobre o Serum, como RAY, ou financiando outros projetos que gerem valor o ecossistema); gastos com multiplicador alto (aqueles em que dinheiro circula no ecossistema com alta velocidade, por exemplo consumindo de projetos sobre a infraestrutura Serum).
Uma outra possibilidade, mais extrema, porém potencialmente decisiva para a confiança do mercado no projeto e no token, seria a destruição de boa parte dessa oferta nas mãos da equipe e de investidores.
Enquanto não se toma uma medida deste tipo, o risco é crescente: com a liberação dos tokens, a concentração de SRM nos fundos da equipe, dos parceiros e investidores só aumenta - e a precificação desse risco pode ameaçar a evolução de preço.
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