Parlamentares em Washington estão se preparando para aprovar três projetos de lei voltados à indústria da blockchain em um evento que foi apelidado de “semana cripto”.

O Congresso dos EUA vem trabalhando em propostas que, segundo o lobby do setor de criptomoedas, trarão mais clareza para a indústria e ajudarão em seu crescimento, principalmente por meio de duas leis: uma que regula stablecoins e outra que estabelece uma estrutura para o mercado cripto. O Congresso também analisa um projeto que visa impedir a criação de uma moeda digital do banco central (CBDC).

As criptomoedas têm recebido apoio de ambos os lados do espectro político, com parlamentares democratas e republicanos apresentando diversas emendas aos projetos em discussão. Grandes exchanges que operam nos Estados Unidos, como a Coinbase, intensificaram suas campanhas a favor das propostas.

Com o Congresso prestes a votar três projetos cruciais durante a Semana Cripto, veja quais são os textos em análise e o que eles significam para o setor de criptomoedas.

Os três projetos esperados para a Semana Cripto. Fonte: Comitê de Serviços Financeiros da Câmara dos EUA

Semana Cripto visa transformar três projetos em lei

O Comitê de Serviços Financeiros da Câmara anunciou que a Semana Cripto começará em 14 de julho. Três projetos devem ser analisados:

Digital Asset Market Clarity Act (CLARITY Act)

O deputado republicano French Hill apresentou o CLARITY Act apenas no fim de junho. O projeto busca estabelecer uma estrutura para a indústria de ativos digitais, incluindo a definição dos papéis da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) e da Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC).

A indústria de criptomoedas há muito tempo considera que o teste de Howey, conforme descrito na Lei de Valores Mobiliários de 1933 e na Lei da Bolsa de Valores de 1934, está desatualizado, e que a SEC não deveria aplicá-lo nem exercer jurisdição sobre os ativos digitais.

O CLARITY Act concederia “uma isenção ao requisito de registro da Lei de Valores Mobiliários de 1933 para ofertas de contratos de investimento envolvendo commodities digitais em blockchains maduras que atendam a certos critérios”.

A proposta também define blockchains “maduras” como redes cuja commodity digital seja “substancialmente derivada do uso e funcionamento da própria blockchain”. Essas redes não podem impor restrições aos usuários e devem limitar a participação de certos detentores a menos de 20% de propriedade.

De acordo com o projeto, a CFTC teria “jurisdição regulatória exclusiva” sobre as transações com criptoativos. Exchanges e corretoras de criptomoedas seriam obrigadas a se registrar junto à comissão e estariam sujeitas a requisitos de registro, relatórios, regras antitruste e outros regulamentos.

Guiding and Establishing National Innovation for US Stablecoins Act (GENIUS Act)

Talvez o mais conhecido dos três projetos em análise durante a Semana Cripto seja o GENIUS Act, a aguardada estrutura regulatória para stablecoins.

O projeto foi apresentado em fevereiro, pouco mais de uma semana após a posse do presidente Donald Trump, por um grupo bipartidário de parlamentares. Ele agora está em tramitação na Câmara, após ter sido aprovado no Senado em 17 de junho com apoio bipartidário.

O projeto define que tipo de entidades podem emitir stablecoins e estabelece que “os emissores devem manter reservas que lastreiem a stablecoin em uma proporção de um para um, usando moeda dos EUA ou outros ativos igualmente líquidos, conforme especificado.”

A proposta também submete os emissores à Lei de Sigilo Bancário (Bank Secrecy Act) e estabelece disposições para casos de insolvência de um emissor de stablecoin.

Anti-CBDC Surveillance State Act

O deputado republicano Tom Emmer apresentou o projeto Anti-CBDC Surveillance State Act em 6 de março, com o objetivo de impedir o Federal Reserve, o banco central dos EUA, de emitir uma moeda digital do banco central (CBDC).

Sob a justificativa de preocupação com a privacidade dos cidadãos, o projeto proibiria o Fed de emitir uma CBDC, seja diretamente ou por meio de terceiros, impediria o uso da CBDC para influenciar a política monetária e daria ao Congresso autoridade exclusiva para emitir um dólar digital.

Segundo comunicado do Comitê de Serviços Financeiros da Câmara, entre as organizações que apoiam o projeto estão a Blockchain Association, a Digital Chamber of Commerce e diversos grupos de lobby do setor bancário.

Os projetos cripto realmente podem ser aprovados?

Dado o ritmo lento do processo legislativo em Washington, uma semana é pouco tempo para aprovar três leis, especialmente considerando a complexidade e as implicações econômicas desses três projetos.

Grandes empresas do setor cripto, como a Coinbase, têm feito forte lobby. Em 7 de julho, a Stand With Crypto, organização de lobby de base criada pela Coinbase, enviou uma carta ao Congresso assinada por 65 executivos de diversas empresas cripto, pedindo a aprovação do CLARITY Act.

Em 9 de julho, o CEO da Coinbase, Brian Armstrong, publicou uma mensagem em apoio à medida, afirmando que “os Estados Unidos estão prontos para as criptomoedas”.

No entanto, o sentimento não se reflete no Polymarket. Participantes do mercado de previsão “CLARITY Act será sancionado em 2025?” atribuem ao projeto 52% de chance de aprovação até o momento da publicação.

O sucesso do CLARITY Act divide opiniões. Fonte: Polymarket

O CLARITY Act tem sido criticado por parlamentares e por organizações de defesa do consumidor, que o classificam como uma “oportunidade aproveitada após o crash cripto” e como uma forma de empresas evitarem a regulamentação da SEC.

A organização Americans for Financial Reform (AFR) chamou o projeto de “uma proposta extremamente desregulatória, impulsionada por uma enxurrada de doações de campanha e pressão de lobby de empresas de capital de risco ultrarricas e bilionários do setor cripto. O projeto irá enriquecê-los às custas dos consumidores, das comunidades e da estabilidade financeira”.

A AFR também expressou preocupação com os interesses pessoais de Trump no setor cripto e observou que o projeto não contém nenhuma cláusula relacionada a corrupção ou questões éticas.

A senadora Elizabeth Warren, conhecida crítica das criptomoedas, também se opôs ao projeto, afirmando que ele permite que grandes empresas contornem a regulamentação da SEC.

“Pelo projeto da Câmara, uma empresa de capital aberto como a Meta ou a Tesla poderia simplesmente colocar suas ações na blockchain e, puff! — escaparia de toda a regulamentação da SEC”, disse Warren.

Senadora Elizabeth Warren em audiência no Senado em 9 de julho. Fonte: Comitê Bancário do Senado

O GENIUS Act, por outro lado, passou por mais debates e revisões nas duas casas do Congresso. Segundo a senadora Cynthia Lummis, uma das autoras do projeto, o Senado trabalhou significativamente para incluir disposições que atendam às preocupações dos democratas com financiamento ao terrorismo e lavagem de dinheiro.

Quando o projeto foi aprovado no Senado em meados de junho, a senadora democrata Kirsten Gillibrand afirmou que ele “combate o financiamento ilícito, impõe limitações às big techs, estabelece salvaguardas éticas e fortalece a segurança nacional”.

Ainda existem preocupações, como o possível impacto do projeto sobre a dominância do dólar e os mercados de títulos do Tesouro. Mesmo assim, os mercados de apostas estão otimistas. Participantes do Polymarket atribuem 92% de chance de aprovação do projeto ainda este ano.

O projeto contra a CBDC ainda está em discussão. Em 9 de julho, o Comitê de Meios e Recursos da Câmara e o Subcomitê de Fiscalização anunciaram uma audiência para 16 de julho sobre “medidas necessárias para estabelecer uma estrutura de política tributária para ativos digitais”.

A audiência deve abordar aspectos relacionados ao projeto anti-CBDC de Emmer.

A possibilidade de que parlamentares pró-cripto consigam aprovar três leis em uma semana parece uma meta difícil de alcançar, mas mesmo que não consigam, o foco deles no futuro próximo está claramente nas criptomoedas.