Na terça-feira (17), a Uniswap Labs implementou a taxa de 0,15% em transações envolvendo onze criptoativos. Hayden Adams, criador da exchange descentralizada (DEX) Uniswap, afirmou que a medida foi tomada para fomentar o crescimento do ecossistema do protocolo. A inclusão da taxa, porém, reacendeu discussões na comunidade de criptomoedas sobre a relação entre tokens de governança e participações de uma empresa.
A Uniswap Labs é a principal empresa desenvolvendo sobre a estrutura da DEX, e é também a responsável pela interface mais popular para interagir com os pools de liquidez. A taxa de 0,15%, então, foi aplicada somente às transações feitas através da interface, e pode ser evitada com o uso de agregadores.
Apesar da justificativa apresentada por Adams, a comunidade de criptomoedas no X (antigo Twitter) acusou o criador da Uniswap de atuar sob os interesses dos fundos que investiram no projeto. Além de oferecer tokens da DEX, o UNI, a Uniswap Labs também ofereceu partes da empresa aos fundos. Por isso, um novo modelo que gera receita é diretamente benéfico para esses investidores.
Enquanto isso, a real utilidade do token UNI (UNI) foi questionada por usuários. O único propósito do criptoativo, atualmente, é participar da governança da Uniswap. Ou seja: ter poder de voto nas decisões sobre os rumos do projeto. A decisão tomada pela Uniswap Labs não resulta em rendimentos para os detentores de UNI.
Embora o mecanismo de ‘fee switch’ possibilite a criação de um sistema onde os tokens UNI distribuam parte do valor obtido através das taxas cobradas, nunca foi aprovada uma proposta com essa previsão no mecanismo de governança.
O principal argumento utilizado aponta que a distribuição de rendimentos pode fazer com que a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês) considere o token como valor mobiliário.
A decisão da Uniswap Labs, então, fez com que a discussão sobre tokens de governança não representarem participações de um protocolo voltasse à tona.
Participações ou não?
A discussão sobre tokens de governança não se enquadrarem como participações de uma empresa ganhou tração em uma série de publicações feitas no X, no dia 16 de outubro, pelo usuário que se identifica como _gabrielShapir0.
O usuário compartilha publicações que fez entre 2020 e o último trimestre de 2022, onde ele argumenta que a Uniswap Labs não tem interesse em dar utilidade ao token UNI.
“Eles [Uniswap Labs] não querem colocar valor no UNI, é uma vulnerabilidade regulatória e eles têm um plano para monetizar as participações da empresa. Eles têm um percentual muito maior da empresa do que do token”, disse _gabrielShapir0 em outubro de 2022, distinguindo o token UNI do que são, de fato, fatias da Uniswap Labs.
Para Guiriba, como se apresenta o pesquisador da Paradigma Education, os tokens de governança apenas dão direito de voto nas organizações em “99% das vezes”.
“Caso o valuation da Uniswap seja de US$ 1 bilhão, então isso não significa, necessariamente, que os detentores do token UNI têm direito a uma parte desse dinheiro”, explica o pesquisador. “Quem consegue lucrar com o sucesso de um protocolo, na maioria das vezes, são fundos de investimento, que compram tokens por valores muito mais baratos do que o preço oferecido ao varejo, e investem diretamente nas empresas que apoiam as organizações por trás do protocolo, como as ‘labs’ e fundações”, completa.
As taxas cobradas pela Uniswap Labs em sua interface também levantaram discussões sobre a validade do poder de voto do token UNI e seu papel no sistema de governança da Uniswap.
“O fee switch do UNI é ‘votado pela governança’, mas o que Hayden e a tropa do unicórnio brilhante falham em mencionar é que todos os detentores de UNI são seus amigos e fundos de capital de risco, possuindo controle do suprimento e, portanto, dos poderes de voto e tomada de decisões”, comentou o usuário que se identifica como Autism Capital, através do X, no dia 16 de outubro.
Sobre o acúmulo de tokens de governança ser uma prática de investimento viável, Guiriba comenta que a viabilidade depende do modelo de consenso aplicado à comunidade.
“Em uma DAO [organização autônoma descentralizada] com US$ 1 bilhão no tesouro, se são necessários US$ 50 milhões em votos para aprovar uma proposta, há restrição de poder em poucos players com grana suficiente para aproveitar a influência lá dentro”, avalia.
Nos modelos de ‘veNomics’, no entanto, até mesmo usuários com pouco capital podem auferir ganhos, salienta Guiriba. Esse modelo, em suma, consiste na alocação dos tokens de governança em um contrato por um determinado período, gerando poder de voto para influenciar nos rumos de uma aplicação descentralizada, através do que são conhecidos como “veTokens”.
Diferente do caso do token UNI, os veTokens permitem a interação em diferentes aspectos de um protocolo, e a mais comum é a capacidade de decidir quais pools de liquidez serão mais rentáveis. Além disso, usuários recebem um aumento nos rendimentos ao fornecer liquidez proporcional à sua quantidade de veTokens.
“Além disso, é possível que o usuário consiga lucrar comprando tokens de governança para vender seus votos àqueles interessados em aumentar sua influência em uma comunidade.
Portanto, acumular tokens de governança para direcionar um protocolo/organização é para poucos, mas ganhar dinheiro com este jogo de influências, pode ser possível para todos em determinados casos”, aponta o pesquisador da Paradigma Education.
Não é para qualquer um
Apesar das oportunidades de lucro envolvidas com tokens de governança apontadas por Guiriba, nem todos os investidores do mercado de criptomoedas querem participar ativamente de uma comunidade.
Para os investidores que planejam escolher um criptoativo e guardá-lo na carteira até uma possível valorização, Felipe Escudero, analista de criptomoedas do canal BitNada, avalia que os tokens de governança não são a melhor escolha.
“Os tokens de governança, no geral, são uma forma de dar liquidez para os times de desenvolvimento e compensar investidores de risco que apoiam o projeto no início”, diz Escudero. “A ideia por trás dos tokens de governança, num primeiro momento, parece boa: permitir que os investidores votem em melhorias no projeto. Mas se os desenvolvedores e os investidores de risco detém a maior parte desses ativos, o usuário comum não tem, de fato, poder de voto decisivo”, completa.
Além disso, os tokens de governança também são utilizados para remunerar os primeiros usuários que interagiram com uma aplicação descentralizada na forma de airdrop. A tendência, diz o analista, é que esses tokens sejam rapidamente vendidos e o preço despenque.
“Em um período de baixa acentuada como o atual, entendo que os tokens de governança são um péssimo investimento”, conclui Escudero.
Leia mais: