Resumo da notícia

  • FG Nexus vende ETH e expõe fragilidade das cripto-tesourarias.

  • Modelo inspirado na Strategy enfrenta sua primeira grande ruptura.

  • Pressão do mNAV força empresas a rever estratégias digitais.

Com a queda do Bitcoin para US$ 84 mil a tensão no mercado de tesourarias corporativas de criptomoedas aumentou e colocou novamente em dúvida se esta estratégia é capaz de sobreviver ao mercado de baixa.

Embora companhias como Strategy tenham inspirado dezenas de empresas a adotar modelos de “cripto-tesouraria” baseados em acumular Bitcoin (ou outras criptomoedas) como estratégia de valorização, o cenário mudou com o mercado em queda.

Agora, o modelo começa a dar sinais de desgaste, e surge o primeiro grande caso de uma corporação que precisou se desfazer de parte relevante de seu tesouro digital para tentar sobreviver ao aperto financeiro.

A protagonista desse movimento é a FG Nexus, uma empresa que seguia a mesma lógica da Strategy, mas focada em Ether. Entretanto, em vez de reforçar sua posição durante a queda do mercado, a companhia tomou uma direção oposta.

No dia 23 de outubro, ela vendeu 10.922 ETH para levantar liquidez e sustentar um agressivo programa de recompra de ações. A venda marcou um momento decisivo, já que o valor obtido serviu para tentar conter o derretimento de seus papéis no Nasdaq, que já operavam em mínimas históricas.

Além de vender parte de suas reservas, a FG Nexus ainda tomou US$ 10 milhões emprestados, combinando as duas fontes para adquirir 3,4 milhões de ações a um preço médio de US$ 3,45. Apesar do esforço, o mercado continuou reagindo com cautela, e os gráficos diários mostraram uma sequência prolongada de quedas (mais de 30% no último mês) que empurrou as ações para patamares desconhecidos desde sua estreia na bolsa.

Reserva de criptomoedas acende alerta

Mesmo após as vendas, a empresa ainda mantém 40.005 ETH, além de US$ 37 milhões em caixa e USDC. Entretanto, carrega uma dívida total de US$ 11,9 milhões, e seu valor líquido por ação caiu para US$ 2,60, abaixo do valor contábil registrado em setembro.

A companhia tenta se reposicionar por meio de uma estratégia focada na tokenização de ativos, apoiada por uma arrecadação de US$ 200 milhões e uma parceria com a Securitize, mas o mercado continua avaliando com ceticismo seu futuro.

Esse caso acende alertas importantes sobre o modelo das Digital Asset Treasuries (DATs), empresas que captam recursos emitindo ações e os alocam em criptoativos, replicando o estilo de acumulação da Strategy que também vem sendo questionada sobre sua solidez caso o Bitcoin não volte a subir.

O formato depende fortemente do mNAV, índice que compara o valor de mercado da empresa com o valor dos ativos que ela detém. Quando o mNAV cai abaixo de 1, as DATs perdem a capacidade de emitir ações com ágio, o que destrói seu principal motor de crescimento.

E esse é justamente o cenário atual. Diversas DATs enfrentam compressões severas no mNAV. A maior detentora corporativa de Ether do mundo, a BitMine Immersion Technologies, agora tem um prejuízo não realizado de cerca de US$ 1.000 por ETH adquirido, acumulando aproximadamente US$ 3,7 bilhões em perdas não realizadas.

Analistas descrevem esse momento como um “Hotel California corporativo”, no qual os acionistas não conseguem sair sem perdas significativas.

A ameaça cresce ainda mais com o avanço da BlackRock, que prepara um ETF de Ether com staking e custos muito menores que os embutidos nas estruturas das DATs. Com taxas previstas próximas de 0,25%, o produto tende a atrair investidores que buscam rendimento sem as camadas de taxas opacas e a complexidade operacional das tesourarias corporativas.

Além disso, novas gestoras como REX-Osprey e Grayscale já começaram a lançar ETFs de ETH com staking, ampliando a competitividade. Quanto mais alternativas surgem, mais difícil fica para empresas como FG Nexus, BitMine, Strategy, Sharplink ou Metaplanet manterem seus múltiplos e levantarem capital.

Ser um ‘cofre’ de Bitcoin não basta

O mercado também vê uma mudança mais profunda: as tesourarias corporativas devem evoluir dos “cofres estáticos” para modelos que integrem staking, restaking, tokenização e instrumentos com rendimento real, como stablecoins corporativas, títulos tokenizados e fundos monetários on-chain. Executivos do setor acreditam que a sobrevivência passa por transformar o balanço em um ativo produtivo on-chain, e não em um estoque especulativo de tokens.

Um levantamento da Jinse Finance mostra que o mNAV de todas as grandes DATs, tanto de BTC quanto de ETH, caiu abaixo de 1. A Strategy possui mNAV de 0,962, a MARA Holdings de 0,873 e a Metaplanet de 0,915. No universo do Ether, a BitMine opera com mNAV de 0,93, enquanto a Sharplink registra 0,85, níveis que dificultam a captação e minam a confiança.

Além disso, estas DATs, que hoje são as maiores do mercado, se apoiaram fortemente no discurso de reserva de valor e que Bitcoin (e outras criptos) não são para vender, com Michael Saylor inclusive aconselhando investidores a literalmente morrerem com seu Bitcoin (e não deixar como herança), para diminuir a oferta circulante.

Isso significa que, caso qualquer uma destas grandes DATs siga o exemplo da FG Nexus o mercado certamente vai reagir negativamente, colocando ainda mais dúvidas em um modelo de negócio puramente especulativo e alavancado, justamente o ponto crítico que Satoshi Nakamoto apontou na criação do Bitcoin em 2018 e citado no bloco genesis….