Ao pesquisar sobre criptomoedas em um dos maiores repositórios de dissertações e teses do Brasil, o da Universidade de São Paulo, com seus quase 100 mil trabalhos, percebi que são poucos  os resultados apresentados que dialogam e exploram  sobre as criptomoedas. 

Há obviamente o caráter do dinamismo de setor,  que dificultam trabalhos com as variantes tradicionais das análises quantitativas e qualificativas da academia, Mas é no mínimo exótico (para não usar outro termo) que uma tecnologia que demanda tanta curiosidade e que impacta inúmeros setores sociais, econômicos e culturais, como por exemplo em transparências de uso, disposição de valores e dados públicos, transferências de grandes quantidades de moeda,  não se tenha um estímulo de pesquisa. 

E aí recaem reflexões de que a  academia brasileira compreende bulhufas dos impactos das criptomoedas, e tampouco se provoca a ter humildade de entender aqueles que construíram mudanças e alterações a partir de ambientes exógenos aos das salas de aula, como apenas, a título ilustrativo o de Vitalik Buterin, co-fundador do Ethereum 

Estas análises referem-se a todas as áreas, mas principalmente as mais carentes, vinculadas a  grupos de pesquisas não atreladas essenciamente aos da ciência da computação, da estatística, ou da matemática. Mas incorporados aos da economia (neste há uma maior proficuidade de trabalhos, mas ainda em pouco número), do direito, da sociologia, antropologia, filosofia e todas que compõem  o leque das ciências sociais aplicadas e das ciências humanas. Visto que são nestas áreas que teremos, no bojo do seu mitiér, as compreensões de comportamentos sociais, dentro de suas inúmeras nuances.

Uma questão que recai é a se existe necessidade da academia, no bojo da educação formal se importar em realizar estes estudos? E se tem algum sentido.  Perguntas que tem no seu perfil político e ideológico de visão e entendimento, respostas. A partir de gradações e tonalidades, que compõem  própria filosofia cypherpunk.

Mesmo seduzido pelas linhas argumentativas libertárias, percebo muito sentido em se construir aprendizados também a partir dos órgãos tradicionalmente vistos como “sólidos”, ou seja, aqueles que trazem seguranças aos agentes externos (mesmo que fictos), e as instituições coercitivas (Estado).  Basicamente há àqueles que estudam nas áreas, academicamente, um tratamento de análise dos espectros dos comportamentos humanos e das suas aplicabilidades. Por isso, há a inevitabilidade em dimensionar (a importância) do tema, também nas Universidades, mesmo que para isso se aceitem novas metodologias, e se aceitem, com respeito a técnica, experimentalismos.

Ao cabo que, o que é estudado, é (mais um) dos diâmetros de comportamentos primordiais sociais, já que parto da premissa que o diálogo sobre criptomoedas compõe um dos elementos essenciais da liberdade, enquanto ferramenta. O da liberdade de interação econômica.

Este é meu primeiro texto neste espaço, e não será nele que adentrarei em grandes polêmicas. Guardarei quando tratar - aí já dentro de meu escopo de atuação - sobre desregulamentação, standarts, criminalizações,  controles, ou descontroles estatais. São apenas provocações sobre o espaço a ser preenchido na construção dos conhecimentos, dentro e fora  perante a academia brasileira.

Pois sim serão, querendo ou não, cada vez mais, empregados estudos relacionados às criptomoedas em cursos de ciências sociais aplicadas e humanas. O melhor é que estes ambientes fomentem, dialoguem e provoquem nos seus alunos, desde a graduação, conhecimentos necessários, com alguma técnica de conhecimento. O que menos precisamos é de estudantes erroneamente aplicando conceitos e os problematizando em verborragias acadêmicas evaidas de preconceitos ou sem mínimas compreensões de seus efeitos. 

Existem inovações curriculares importantes já na graduação, como por exemplonos cursos de direito da Insper, da Unisinos ou da Fundação Getúlio Vargas. Mas há certa carência principalmente dentro dos rigorismos das instituições públicas, ficando muitas vezes aos cargos individualizados de um ou outro professor, quando não somente dos discentes. Fora do Brasil existem exemplos de Universidades Públicas que provocam estes estudos, como os da Universidade de Hong Kong, Universidad de Salamanca e na Universidade do Chile.

E estas instigações partem do próprio artigo de Satoshi Nakamoto, “bitcoin: a peer-to-peer eletronic cash system” e em toda sua escolha de ser um anônimo.  O texto, além de  ser a exaltação quase perfeita e apaixonada da criptografia e da técnica de computação, perpassa de aspectos sociológicos, macroeconômicos e, com certeza (passível de críticas) de teoria política.

É natural que agentes destas áreas, também dentro da academia, realizem pesquisas. Mesmo que tenha no seu interím a marginalidade. Algo não muito distante da célebre frase de Hélio Oticia, em toda sua simbologia “seja herói, seja marginal”.  

É que mesmo na academia, põe (ou deveria pôr-se-á) a estudar, e aprender, com os marginais. Inúmeras vezes são estes que mudam os rumos do mundo.