O principal órgão executivo da União Europeia adotou uma postura mais branda em relação às stablecoins, em contraste com o Banco Central Europeu (BCE), o que gerou otimismo no setor.

Em resposta às preocupações do BCE sobre possíveis riscos de corridas bancárias decorrentes da emissão múltipla de stablecoins na Europa e em países terceiros, a Comissão Europeia (CE) afirmou que tais riscos são “altamente improváveis”.

Um porta-voz da Comissão disse ao Cointelegraph: “Mesmo no caso altamente improvável de uma corrida a um token emitido conjuntamente, os resgates por detentores estrangeiros ocorreriam principalmente em jurisdições como os Estados Unidos, onde circula a maior parte dos tokens e estão concentradas as reservas”.

A posição da Comissão sobre a emissão múltipla de stablecoins na UE e em outros lugares tem implicações significativas para o setor, sendo considerada uma grande vitória, segundo observadores da indústria local.

BCE alertou sobre riscos de corrida bancária em abril

A abordagem mais flexível de Bruxelas em relação às stablecoins estrangeiras contrasta com os alertas anteriores do BCE, que publicou um documento informal em abril sobre a emissão múltipla de stablecoins entre a UE e países terceiros.

“Um esquema de emissão múltipla de stablecoins entre a UE e países terceiros enfraqueceria significativamente o regime prudencial da UE para emissores de tokens de moeda eletrônica (EMTs), ao aumentar a probabilidade de uma corrida, já que emissores da UE podem não ter reservas suficientes sob supervisão das autoridades europeias para atender aos pedidos de resgate de detentores de tokens da UE e de fora da UE”, escreveu o BCE.

Um exemplo genérico de emissão múltipla de stablecoins entre a UE e países terceiros aplicado à UE e aos EUA. Fonte: BCE

O BCE também alertou que a emissão conjunta de stablecoins com países terceiros pode comprometer a estabilidade financeira ao enfraquecer as proteções aos consumidores da UE e contornar salvaguardas fundamentais do Regulamento de Mercados em Criptoativos (MiCA).

Segundo o documento informal, isso também pode permitir que emissores estrangeiros aleguem falsamente conformidade com as normas da UE, transfiram a responsabilidade regulatória para as autoridades europeias sem a devida supervisão e abram caminho para que empresas de fora da UE acessem o mercado único sem atender aos padrões exigidos.

Bruxelas afirma que os riscos são gerenciáveis

Após abordar os alertas do BCE, a Comissão publicou em junho uma análise aprofundada sobre as implicações da emissão conjunta de stablecoins com países terceiros, em um relatório intitulado “Stablecoins e euro digital: aliados ou inimigos da política monetária europeia?”

“Concluímos que existem barreiras institucionais e regulatórias significativas à adoção mais ampla de stablecoins estrangeiras na área do euro”, afirmou a Comissão em seu estudo, acrescentando que o regulamento MiCA “desestimulou emissores estrangeiros de grande porte de se registrarem na Europa”.

A Comissão mencionou especificamente a Tether, emissora da USDt (USDT), a maior stablecoin do mundo por valor de mercado, que se recusou a cumprir o MiCA por motivos como a exigência de manter ao menos 60% de suas reservas em bancos europeus.

De acordo com a Comissão, os riscos da emissão conjunta de stablecoins com países terceiros são gerenciáveis com as políticas existentes, já que os emissores podem ser obrigados a adotar um mecanismo de reequilíbrio para garantir que as reservas mantidas na UE correspondam aos tokens emitidos e detidos na região.

“Notícia muito positiva e até um alívio”

Segundo Juan Ignacio Ibañez, secretário-geral da MiCA Crypto Alliance, a abordagem da Comissão à emissão conjunta de stablecoins com outros países significa que a autoridade não exigirá que emissores como a Circle façam distinções funcionais entre USDC-US e USDC-EU.

“Esses participantes são entidades globais que emitem stablecoins tanto na UE quanto fora dela”, disse Ibañez ao Cointelegraph, acrescentando que a Comissão está, na prática, defendendo o tratamento fungível das moedas emitidas local e internacionalmente, permitindo que uma entidade assegure a conversibilidade dos tokens emitidos pela outra.

“Isso é uma notícia muito positiva e até um alívio”, afirmou Ibañez. “Um componente essencial do valor de uma stablecoin está em sua usabilidade transfronteiriça, algo herdado da própria tecnologia blockchain. Impor barreiras jurisdicionais minaria essa característica fundamental e prejudicaria a experiência do usuário dentro da UE”, completou.