No dia 30 de julho, o Ethereum (ETH) completou oito anos de existência. O ‘computador da internet’ se mantém firme e vibrante, mesmo após o surgimento de diferentes ‘Ethereum Killers’ durante sua existência. É possível que, ao completar oito anos, o Ethereum tenha garantido sua existência até 2031? Fontes ouvidas pelo Cointelegraph Brasil comentam a aplicação do Efeito Lindy à segunda maior criptomoeda em valor de mercado.

Período de existência aplicado ao futuro

O Efeito Lindy surgiu em um artigo publicado pelo biógrafo Albert Goldman em 1964. Intitulado “Lei de Lindy”, o artigo avalia a duração da carreira dos comediantes nos Estados Unidos. A conclusão de Goldman no artigo é: se o estoque de piadas engraçadas de um comediante é finito, então a duração de sua carreira é proporcional ao seu tempo de exibição na televisão.

Ou seja, se um comediante já se apresenta para um grande público por três anos, sua carreira durará por mais três anos. O nome Lindy foi retirado do restaurante localizado em Nova York onde os comediantes comumente se reuniam em 1964.

O conceito publicado por Albert Goldman foi aproveitado por matemáticos e estatísticos, ganhando o nome de Efeito Lindy. Nassim Nicholas Taleb, tornou a teoria popular em seu livro “Antifrágil: coisas que se beneficiam com o caos”, onde usou o Efeito Lindy como base para definir o tempo de existência de algo não-perecível. 

“Para os perecíveis, todo dia adicional de vida se traduz em uma expectativa de vida reduzida. Para os não-perecíveis, cada dia adicional de vida pode implicar em uma expectativa de vida maior”, escreveu Taleb. São passíveis da aplicação do Efeito Lindy as ideias, as tecnologias e os ativos.

Em um mercado dinâmico e novo como o setor de criptomoedas, porém, é possível aplicar o Efeito Lindy?

Efeito Lindy e o mercado de criptomoedas

Para Henrique Paiva, analista CNPI do Cripto Select, é natural que a aplicação do Efeito Lindy ao mercado financeiro inclua também o mercado de criptoativos. Paiva afirma que, por ser um mercado em constante transformação, o setor de moedas digitais cria a tentação de ser um ‘usuário pioneiro’ de diferentes protocolos, ideias e aplicações descentralizadas. 

“Acontece que tudo precisa de um tempo para maturar, se consolidar no mercado e se tornar realmente confiável”, ressalta o analista. “Apenas o crivo do tempo é capaz de filtrar se a tecnologia vai realmente sofrer adoção do mercado e se mostrará segura”, completa.

A rápida movimentação de tecnologias e ideias cria um cenário dominado pela ansiedade e o medo de “perder o bonde” por parte dos investidores. É natural, desta forma, que usuários mergulhem de cabeça em projetos embrionários que, muitas vezes, acarretam em prejuízos no curto prazo, avalia Paiva.

“O Efeito Lindy nos dirá para darmos mais atenção àquilo que está consolidado e que, portanto, oferece uma segurança maior, pois o tempo está fortemente ligado à robustez de um projeto ou uma nova tecnologia. Alguns até mesmo preferem associar mais o efeito do tempo à antifragilidade do que à robustez.”

Ruslan Lienkha, chefe de mercados da YouHodler, concorda com a visão de Paiva. Ele considera que o mercado cripto não é uma exceção do Efeito Lindy, sendo apenas um ecossistema onde as coisas evoluem de forma mais rápida.

“Um exemplo é que alguns bancos comerciais podem existir por anos com buracos em suas finanças, e até mesmo os reguladores podem falham em identificar o problema devido aos relatórios financeiros complicados. Esse cenário é quase impossível em empresas de criptomoedas, já que a blockchain é transparente, e você pode checar todos os ativos de empresas baseadas em blockchain”, diz Lienkha.

E o Ethereum?

Se o Efeito Lindy pode ser aplicado ao mercado de criptomoedas, é possível definir que o Ethereum terá mais oito anos de vida, durando até 2031? Para Henrique Paiva, essa possibilidade existe.

“Dentro do contexto de tempo no mercado de cripto, podemos dizer que o Ethereum juntou-se ao Bitcoin nesse hall de ativos consolidados. Não só pelos fortes fundamentos, que foram se solidificando ao longo do tempo, mas também por ter passado pelo crivo da adoção e usabilidade. O mercado acolheu e deu boas vindas ao Ethereum”, avalia.

Além de ser o principal ecossistema de finanças descentralizadas (DeFi), em termos de valor total alocado e atividade na rede, o analista do Cripto Select destaca como outro ponto forte do Ethereum a adoção e disponibilização de contratos futuros negociados pela CME.

“Isso tem uma importância grandiosa dentro do mercado tradicional. A Chicago Mercantile Exchange [CME] possui raízes seculares, e esse é um clássico exemplo do Efeito Lindy.”

Ruslan Lienkha, da YouHodler, também acredita que o Ethereum já se tornou ‘um clássico’, e esse status vai além do seu grande valor de mercado.

“Muitos projetos são baseados na blockchain do Ethereum, indo desde de DeFi, jogos, e até projetos que oferecem blockchain como serviço. A partir dessa perspectiva, podemos comparar o Ethereum com grandes companhias de tecnologia. Há uma demanda clara pela tecnologia do Ethereum, e não apenas nas finanças, mas em muitas outras indústrias”, avalia Lienkha.

‘Ethereum Killers’ ainda são ameaça?

A dinamicidade do mercado de criptomoedas torna o segmento altamente competitivo. Dentro de um ano, um projeto promissor corre o risco de se tornar obsoleto. Nesse cenário predatório, é possível que o Ethereum siga mais oito anos resistindo aos avanços dos ‘Ethereum Killers’?

Ethereum Killers são projetos que se propõe a fazer o mesmo que a blockchain da segunda maior criptomoeda em valor de mercado faz, mas de forma mais eficiente. Até hoje, contudo, nenhum projeto conseguiu cumprir tal fim.

Rony Szuster, analista de criptoativos do MB Research, destaca a postura dominante do Ethereum atualmente no mercado de ativos digitais. “O Ethereum tem quase 60% do TVL [valor total alocado, na sigla em inglês] de DeFi e NFTs. Ele é um player quase monopolizante”, avalia Szuster.

Além disso, o analista do MB Research menciona o padrão criado pela Ethereum Virtual Machine (EVM), que é o computador virtual usado para criar contratos inteligentes no Ethereum. Ele destaca que os projetos surgidos como alternativa ao Ethereum são compatíveis com a EVM, fazendo deles parte integrante do ecossistema, e não concorrentes.

“Por exemplo, a Avalanche é uma rede que é compatível com EVM, compatível com Ethereum. Então, nesse caso, ela não se enquadra como Ethereum Killer, e mais como parte do ecossistema Ethereum. Junto com isso, coloco todas as layer 2 [soluções de segunda camada], como Optimism, Base, Polygon, que também fazem parte desse ecossistema”, diz Szuster.

Considerando as blockchains que são compatíveis com EVM, elas representam mais de 90% do TVL de DeFi quando somadas ao Ethereum, destaca o analista. Esse cenário torna a tarefa de um novo Ethereum Killer muito desafiadora, mas ainda existem outros obstáculos para tomar a coroa do Ethereum no mercado de DeFi.

“Esse mercado não é só baseado em tecnologia. Vimos o lançamento da Solana, que tem uma tecnologia diferenciada do Ethereum, e talvez seja possível fazer um juízo de valor e dizer que ela é melhor que o Ethereum. Mas só isso não é suficiente para ter uma blockchain de sucesso. É preciso ter uma comunidade forte, é preciso ter desenvolvedores, é preciso ter gente criando aplicações.”

Szuster acrescenta que, em todas essas métricas, o ecossistema Ethereum já se mostra muito grande. Para surgir algo novo com capacidade para desbancar esse ecossistema, então, é necessário que seja uma tecnologia muito disruptiva. 

“É impossível? Não. Pode surgir uma nova blockchain que consiga fazer o que o Ethereum faz, mas muito melhor, e consiga roubar parte de sua comunidade. Mas isso é muito pouco provável”, pondera Szuster.

O analista vê um futuro para a indústria blockchain composto por diversas blockchains principais. O centro desse ecossistema é o Ethereum, com a Solana orbitando em torno dele, com casos de uso específicos.

“O que eu acho é que o Ethereum será um computador geral base, que a maioria das aplicações usará, mas terão casos de uso para outras redes paralelas. Eu não acho que essas outras redes, contudo, substituirão o Ethereum como é hoje em dia”, conclui o analista do MB Research.

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