Nesta quarta, 20, durante uma audiência na Câmara dos Deputados, marcada para debater a criação de uma reserva estratégica de Bitcoin para o Brasil, Luis Guilherme Siciliano, Chefe do Departamento de Reservas Internacionais, ‘reprovou’ a proposta.
Segundo ele, os Bancos Centrais são conservadores e devem utilizar ativos de reserva que não enfrentam alta volatilidade.
“Respondendo à sua pergunta: os bancos centrais são naturalmente orientados pelo conservadorismo. Isso significa que as reservas internacionais precisam ser constituídas por ativos de baixa volatilidade. Em períodos de estresse ou crises extremas, inclusive crises geopolíticas, os mercados locais sofrem fortes picos de volatilidade. Por isso, os ativos de reserva devem cumprir a função oposta: oferecer estabilidade, servindo como proteção para que o banco central possa utilizá-los nesses momentos críticos.
Desse modo, segundo Siciliano, ativos como o Bitcoin e outras criptomoedas não se enquadram nesse perfil, justamente pela sua natureza altamente volátil.
Quando um país precisa recorrer às reservas, é essencial que os ativos sejam sólidos e seguros. Mesmo que uma fração das reservas fosse aplicada em ativos reconhecidamente voláteis, isso comprometeria a credibilidade da autoridade monetária. Afinal, a função das reservas é justamente garantir estabilidade e confiança. Dessa forma, incluir criptomoedas nas reservas poderia gerar riscos reputacionais e fragilizar a percepção de solidez da política monetária.
Além disso, segundo ele, existe a questão regulatória e ainda há ausência de previsão clara que permita considerar o Bitcoin e outras criptomoedas como ativos elegíveis para compor oficialmente a carteira de um banco central.
Ministério da Fazenda é ‘pró’- bitcoin, mas diz que ainda é cedo
Participando do debate, Daniel Leal, representando o Ministério da Fazenda, apontou que o governo não é contrário ao Bitcoin, no entanto, ele disse que ainda é cedo para isso.
“Quero deixar claro que não tenho nenhum viés negativo em relação ao Bitcoin em si. Reconheço que ele tem ganhado relevância e valor, como foi mostrado nos gráficos apresentados. Mas é importante diferenciar os propósitos. No caso das reservas internacionais, como já foi explicado, a finalidade está muito mais ligada à estabilidade financeira do país, administrada pelo Banco Central. Por outro lado, um fundo soberano, sim, poderia ser gerido pelo Tesouro. E aí a lógica muda: caberia ao governo decidir quando e em qual nível constituir esse fundo. Mas, para isso, seria necessário abrir espaço orçamentário”, disse.
Deste modo, segundo ele, qualquer aquisição de ativos para a constituição de um fundo desse tipo exigiria um esforço fiscal do país e portanto, seria preciso avaliar emissões de dívida, superávit fiscal ou outras medidas.
“Vale ressaltar também que, considerando a volatilidade, um fundo soberano desse tipo não poderia ser constituído apenas por Bitcoin. Se, por exemplo, o Tesouro destinasse 5% do fundo para Bitcoin, os outros 95% precisariam estar em ativos diferentes e mais estáveis. Isso significa que o esforço fiscal para sustentar esse fundo seria muitas vezes maior do que o montante aplicado em criptoativos. Portanto, essa discussão exigiria um diálogo profundo entre Tesouro e Ministério da Fazenda, avaliando o momento adequado, os riscos e os objetivos de política econômica. Diferente das reservas internacionais, que têm função clara de estabilidade, um fundo soberano com criptoativos teria outro propósito, ligado mais à estratégia de investimento de longo prazo.
Para o CEO da Mannah, Pedro Xavier, o significado dessa pauta é mais simbólico do que prático, já que a discussão ainda está no âmbito legislativo, mas quanto mais o Bitcoin for debatido e reconhecido como ativo estratégico, maior será o conhecimento das autoridades e consequentemente maior aceitação da população.
Segundo ele, em um cenário em que o Brasil enfrenta sanções em setores importantes e o presidente sinaliza alternativas ao dólar, esse movimento pode acelerar a necessidade de o governo compreender melhor o mercado cripto.
Ter Bitcoin em reserva é estratégico a longo prazo e traria descorrelação parcial com ativos tradicionais, funcionando como hedge em cenários de inflação global, impressão monetária ou tensões geopolíticas. O Bitcoin é considerado o “ouro digital” e já faz parte das reservas de países como Estados Unidos, Reino Unido e até mesmo a China. Todos os principais países em desenvolvimento caminham pra isso. Eu particularmente sou um pouco pessimista, se tratando de Brasil, disso caminhar rapidamente. De qualquer maneira talvez as sançoes americanas ajudem nesse sentido", explica Xavier.